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II SÉRIE-A — NÚMERO 34

jecto de lei n.° 265/V poderá ser ou não considerada como susceptível de violar o princípio da igualdade, fixado no n.° 2 do artigo 13.°, nos seguintes termos:

Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social.

Dir-se-á, desde já, que a resposta é manifestamente negativa. Ou seja, a adopção de iniciativas legislativas tais como a que deu origem a este parecer não colide com a proibição de discriminações constante do n.° 2 do artigo 13.° da Constituição.

Com efeito, como escrevem Gomes Canotilho e Vital Moreira, «a proibição de discriminações (n.° 2) não significa uma exigência de igualdade absoluta em todas as situações, nem proibe diferenciações de tratamento. O que se exige é que as medidas de diferenciação sejam materialmente fundadas sob o ponto de vista da segurança jurídica, da praticabilidade, da justiça e da solidariedade e não se baseiem em qualquer motivo constitucionalmente impróprio. As diferenciações de tratamento podem ser legítimas quando: (a) se baseiem numa distinção objectiva de situações; (b) não se fundamentem em qualquer dos motivos indicados no n.° 2; (c) tenham um fim legítimo segundo o ordenamento constitucional positivo; (d) se revelem necessárias, adequadas e proporcionadas a satisfação do seu objectivo. Aliás, a Constituição prevê, ela mesma, discriminações positivas, legitimadoras de tratamento diferenciado (artigos 56.°-6, 60.°-2, 69.°-2, 70.°-l, 76.°)» (M).

4.2 — Valerá a pena introduzir um parêntises muito breve para referir um certo tipo de medidas especiais em favor das mulheres, destinadas a atingir uma igualdade de facto entre estas e os homens, e que, quando adoptadas, o são normalmente apenas por um certo período de tempo (25).

Refectindo sobre a questão de saber se a constitucionalidade de tais medidas não poderia ser posta em causa em face do n.° 2 do artigo 13.° da Constituição, Leonor Beleza chama à colação o princípio, também constitucionalmente tutelado, da igualdade efectiva ou substancial (e não meramente formal), que encontrava expressão nas alíneas a) e c) do artigo 81.° da Constituição (na sua primitiva redacção), concluindo que «aquelas medidas destinadas a obtê-la, apesar de gerarem momentaneamente um desequilíbrio, não criam um privilégio em função do sexo, e entendemos que a Constituição não as proíbe» (2fi).

4.3 — O certo, porém, é que, no concernente à maternidade e às medidas especiais que visem protegê-la, não devem as mesmas ser consideradas como actos discriminatórios. Isso mesmo é expressamente reconhecido no n.° 2 do artigo 4.° da Convenção das Nações Unidas, analisada supra, no ponto 3.3.2, princípio que tem tradução em diversos textos legais de direito interno (cf. artigo 68.°, n.° 3, da Constituição da República Portuguesa, artigo 17.° da Lei n.° 4/84, artigo 8.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 392/79, e 4.°, n.° 2, in fine, do Decreto-Lei n.° 426/88).

Revela-se, portanto, neste contexto, e para este fim, sem relevância a alteração introduzida pela revisão constitucional de 1982 no artigo 68.° do texto fundamental.

Esta disposição deixou de ter especificamente por objecto (e como epígrafe) a maternidade, para, como corolário lógico do princípio da igualdade de direitos e deveres dos cônjuges quanto à capacidade civil e à manutenção e educação dos filhos (artigo 36.°, n.° 3, da Constituição), passar a referir-se, em termos perfeitamente equivalentes, à paternidade e à maternidade. Procedamos à sua transcrição, na redacção que actualmente lhe corresponde:

1 — Os pais e as mães têm direito à protecção da sociedade e do Estado na realização da sua insubstituível acção em relação aos filhos, nomeadamente quanto à sua educação, com garantia de realização profissional e de participação na vida cívica do País.

2 — A maternidade e a paternidade constituem valores sociais eminentes.

3 — As mulheres trabalhadoras têm direito a um período de dispensa do trabalho, antes e depois do parto, sem perda da retribuição e de quaisquer regalias (27) e (27A).

4.4 — Justificar-se-á, nesta abordagem, necessariamente sumária, ao regime constitucional, aludir ao artigo 36.° que, sob a epígrafe «Família, casamento e filiação», consagra, como se disse, o princípio da igualdade dos cônjuges (n.° 3) e o princípio da não discriminação entre filhos, independentemente de os progenitores estarem ou não casados (n.° 4), fixando ainda o direito e dever dos pais de educação dos filhos (n.° 5).

4.4.1—O princípio da igualdade dos cônjuges abrange, obviamente, «não só as esferas extrafamilia-res — direitos civis e políticos —, mas também a esfera familiar (e não apenas a educação dos filhos), interditando qualquer discriminação jurídica entre eles.

A explícita garantia de igualdade dos cônjuges pela CRP implicou directamente profundas alterações na lei civil pré-constitucional — que assentava no princípio da supremacia conjugal e familiar do marido ('chefe de família') — e na restante ordem jurídica que estabelecia severas discriminações contra a mulher casada em domínios extrafamiliares (direito comercial, direito do trabalho, etc). Foi certamente um dos princípios constitucionais que, só por si, mais normas do direito anterior fez caducar (cf. artigo 293.°). A adaptação legislativa exigida por esta norma constitucional exigiu, não apenas a adaptação dos grandes códigos, mas também a correcção de numerosa legislação avulsa» (28).

4.4.2 — Segundo os constitucionalistas Gomes Canotilho e Vital Moreira «o princípio da não discriminação entre filhos, independentemente de os progenitores estarem ou não casados foi outra das grandes transformações provocadas pela CRP na ordem jurídica precedente, fazendo caducar ou revogar numerosas normas que em múltiplos domínios jurídicos afirmavam a distinção entre os filhos 'legítimos' e os 'ilegítimos', e que com base nela estaleciam múltiplas discriminações, desde a constituição da relação de filiação até aos direitos sucessórios» (29) e (3^.

4.5 — Tendo presente o princípio da igualdade dos cônjuges e o correspondente tratamento, em paridade, da paternidade e da maternidade (artigo 68.° da Constituição a República e artigos 1.° e 2.° da Lei n.° 4/84), o juízo sobre a constitucionalidade de medidas legislativas que sejam tomadas exclusivamente em relação à