O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

528

II SÉRIE-A — NÚMERO 27

ções um regime sancionatório severo poderia coarctar a actividade médica e produzir efeitos perversos para os bens jurídicos protegidos.

Quanto aos maus tratos (artigo 152.°), introduz-se uma modificação relativa à natureza processual do crime praticado contra o cônjuge (ou contra quem conviva com o agente em condições análogas) e criminaliza-se a violação de regras de segurança no trabalho. No primeiro caso, embora, como regra, o procedimento dependa de queixa, permite-se ao Ministério Público que inicie o processo quando o interesse da vítima o exigir. Pretende-se, assim, assegurar uma defesa efecdva de pessoas sujeitas a ofensas reiteradas no âmbito da instituição familiar. A exigência de queixa .do ofendido pode, nestas situações, assegurar a impunidade do agente do crime, mediante o constrangimento da vítima. No segundo caso, pretende defender-se quem preste serviço a um empregador da criação de perigos para a. vida ou para a integridade física — ao nível da ofensa grave prevista no artigo 144."—, tutelando-se direito à segurança no trabalho [artigo 59.°, n.° 1, alínea c), da Constituição].

No âmbito dos crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexual, as alterações introduzidas visam reforçar a tutela do bem jurídico, correctamente identificado como liberdade sexual.

Deste modo, alarga-se o conceito de violação (artigo 164.°), que passa a abranger, para além da cópula e do coito anal, o coito oral, seguindo-se a orientação consagrada no Código Penal francês de 1994. Estas formas de penetração sexual constituem, de acordo com os estudos da psicologia e da psiquiatria, violações da liberdade da vítima identicamente intensas e estigmatizantes. De resto, a defesa da liberdade de procriação, que só é afectada por uma violação que envolva a cópula, é assegurada, autonomamente, pela agravação especial decretada no artigo 177", n.° 3.

São introduzidos novos crimes contra a liberdade sexual, concebidos como modalidades menos graves de coacção sexual (quando estão em causa actos sexuais de relevo) ou de violação (quando se trata de penetração sexual). As novas incriminações abrangem apenas a extorsão de favores sexuais através de ameaças ou ordens provenientes de quem detenha uma posição de autoridade laboral ou funcional relativamente à vítima. Em tal situação pode não existir ainda a ameaça grave requerido na coacção sexual (artigo 163.°) e na violação (artigo 164.°), ameaça que, pela sua equiparação à violência, à colocação em estado de inconsciência e à impossibilidade de resistir, pressupõe o perigo de um sacrifício tido como insuportável de bens jurídicos pessoais da vítima ou de terceiro. Todavia, aquela situação representa já uma afectação séria da liberdade da vítima e reclama a intervenção penal.

Nos crimes de tráfico de pessoas (artigo 169.°) e de lenocínio (artigo 170.°, n.° 1) retira-se das descrições típicas a exigência de exploração de situações de abandono ou de necessidade. Na verdade, basta o constrangimento à prostituição ou à actividade sexual de relevo em país

estrangeiro (através de violência, ameaça grave, ardil ou manobra fraudulenta) ou a exploração sexual de outra pessoa (desenvolvida profissionalmente ou com intenção lucrativa) para que as condutas possuam a indispensável relevância éüco-penal.

Para reforçar a protecção das crianças e adolescentes vítimas de crimes sexuais e acolhendo orientações preconizadas no congresso contra a exploração sexual de crianças, realizado em Estocolmo em 1996, criminaliza-se o tráfico de menores de 16 anos destinado à exploração sexual, independentemente do meio utilizado e da situação de abandono ou necessidade da vítima (artigo 176.°, n.° 2). O combate ao lenocínio e tráfico de menores e ao tráfico de pessoas é igualmente intensificado através da criminalização do branqueamento dos lucros dele advenientes, mediante a alteração do artigo 2.° do Decre-to-Lei n.° 325/95, de 24 de Dezembro. Deste modo, acolhe-se a Recomendação R (91) 11, adoptada pelo Comité de Ministros do Conselho da Europa" em 9 de Setembro de 1991.

No abuso sexual de crianças (artigo 172.°) acrescenta--se às condutas presentemente previstas, que já envolvem a utilização de menor de 14 anos em fotografia, filme ou gravação pornográfica, a exibição ou cedência destes materiais (nomeadamente a sua venda, que pode gerar a agravação de responsabilidade, nos termos do n.° 4). Reforça--se, assim, a luta contra a pedofilia, dando-se cumprimento à acção comum adoptada, quanto a esta matéria, pela União Europeia.

Também no artigo 173.°, em sede de abuso sexual de adolescentes e dependentes, se alarga o âmbito da incriminação (n.° 1), reforçando-se a protecção da vítima. Assim, se o menor tiver entre 14 e 16 anos, a prática de abuso sexual será sempre puiyvel, independentemente de o agente do crime ser responsável pela sua educação ou estar obrigado a assisti-lo. Na hipótese de o menor ter entre 16 e 18 anos, exige-se já que o agente possua aquela função, mas não se exige autonomamente que abuse de tal função.

Restringe-se tipicamente o estupro (artigo 174.°), exi-gindo-se que o agente do crime seja maior de 18 anos. Não faz sentido conceber como agente deste crime um jovem com 16 ou 17 anos—já imputável, nos termos do artigo 19.° do Código Pena) — que mantenha relações com outro jovem com 15 anos. E a referência ao aproveitamento da inexperiência da vítima não parece suficientemente precisa para excluir, liminarmente, uma tal hipótese. Por outro lado, para harmonizar as incriminações do estupro e dos actos homossexuais com menores, exige-se também, neste último crime (artigo 175.°), que haja abuso da inexperiência da vítima.

- Nas disposições comuns respeitantes à agravação de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, altera-se a norma que contempla, entre outras, uma agravação pelo resultado mediante a transmissão do vírus do síndroma de imunodeficiência adquirida (artigo 177.°, n.° 3). A esta hipótese equipara-se a propagação de formas de hepatite que criem perigo para a vida, atendetvdo à analogia material dos dois casos.

Sendo, em regra, semipúblicos, os crimes sexuais podem ser perseguidos, independentemente de queixa, por iniciativa do Ministério Público, quando «especiais razões de interesse público o impuserem» e a vítima for menor

de 12 anos (artigo 178.°, n.° 2). Esta fórmula é ambígua e sugere mesmo que o menor pode ser utilizado cornómeio de prevenção de futuros crimes. Por isso, ela é substituída por uma expressa referência ao interesse da vítima, que é, afinal, o único a ponderar, legitimamente, pelo Minis-