29 DE JANEIRO DE 1998
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tério Público. Além disso, eleva-se para 16 anos a idade da vítima do crime cuja perseguição pode ser promovida, nestes termos, pelo Ministério Público, abrangendo-se crianças e adolescentes, de forma harmónica com o regime de punição dos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual.
Igualmente em defesa do interesse de menores, bem
como de interditos e inabilitados que sejam vítimas de crimes sexuais, aumenta-se o período máximo de inibição do poder paternal da tutela ou da curatela de 5 para 10 anos (artigo 179.°). Esta medida é concebida como pena acessória não automática e delimitada temporalmente, em obediência ao disposto no artigo 30.°, n.os 4 e 1, respectivamente, da Constituição. Porém, embora a cessação da inibição não implique, necessariamente, a atribuição do poder paternal, da tutela ou da curatela ao condenado pela prática do crime sexual, o aumento da sua duração máxima justifica-se, atendendo à severidade das penalidades cominadas. Na verdade, vários crimes sexuais são punidos com penas de prisão até 8 anos (artigos 163.°, 165.°, n.° I, 166.°, n.° 2, 168.°, 169.°, 170.°, n.° 2, 172.°, n.° 1, e 173.°, n.° 1) ou até 10 anos (artigos 164.°, 165.°, n.° 2, 172.°, n.° 2, e 176.°, n.° 2), penas essas que podem ainda ser agravadas quando o agente exerce o poder paternal, a tutela ou a curatela sobre a vítima [artigo 177.°, n.° 1, alínea a)]. Ora, não se compreende que a inibição destes poderes-deveres esteja-sujeita a um limite temporal máximo substancialmente mais curto do que o previsto para a pena principal de prisão.
Plena de significado, na perspectiva da liberdade de expressão e informação (artigo 37.° da Constituição), é a supressão do regime estabelecido para o crime de difamação no artigo 180.°, n.° 5. Na verdade, tal norma, cuja eliminação foi propugnada, sem contestação, pela comissão de revisão do anteprojecto de 1987, exclui a possibilidade de o agente da difamação provar a verdade do facto imputado, quando ele constituir crime e não tiver havido condenação transitada em julgado. Ora, esta restrição impede, tendencialmente, a denúncia pública de crimes ou pressupõe, em alternativa, que o agente logre antecipar o juízo do tribunal na qualificação do facto imputado como crime. Demais, a restrição conduz a resultados absurdos nos casos de extínção da responsabilidade penal, em que a inexistência de sentença condenatória nem sequer indicia a ausência de crime e a falsidade da imputação.
No que respeita aos crimes contra o património, esclarece-se que o valor da unidade de conta é o estabelecido nos termos dos artigos 5.° e 6.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 212/89, de 30 de Junho, para efeitos de determinação do valor diminuto, elevado ou consideravelmente elevado da coisa (artigo 202.°). Esta precisão confirma, aliás, a prática jurisprudencial que tem sido firmada.
Aos casos especiais de burla já previstos — burla relativa a seguros, burla para obtenção de alimentos, bebidas ou serviços e burla informática — acrescenta-se um novo tipo, qualificado, referente ao aliciamento ou promessa de trabalho ou emprego que envolvam a deslocação de trabalhadores de um Estado para outro. Na^ realidade, estas condutas fraudulentas sujeitam frequentemente os trabalhadores a condições infra-humanas, configurando-se como particularmente desvaliosas e censuráveis. Assim se expüca que este crime mereça uma pena de prisão até 5 anos ou uma pena de multa até 600 dias — podendo elevar-se, nos
casos mais graves, para pena de prisão de 2 a 8 anos — e requeira, no plano processual, a qualificação de público.
A falência não intencional prevista no artigo 228." é substituída pela insolvência negligente, que também poderá ser praticada pelo devedor que, tendo conhecimento das dificuldades económicas e financeiras da sua empresa, não requerer em tempo nenhuma providência de recuperação. Este crime passa a consumar-se mediante a ocorrência e a verificação judicial da situação de insolvência, harmonizando-se a conduta típica com o correspondente crime doloso previsto no artigo 227.° No caso de se seguir a falência, a responsabilidade penal será agravada, aplicando-se pena de prisão até 1 ano ou pena de multa até 120 dias, tal como hoje se prevê no artigo 228.°, e não somente pena de prisão até 6 meses ou pena de multa até 60 dias.
Para além disto, passa a considerar-se como autor deste crime — e também dos crimes de insolvência dolosa e de favorecimento de credores (artigos 227.° e 229.°, respectivamente) — quem exerce de facto a administração da pessoa colectiva, sociedade ou associação de facto. Tal regime não prejudica, porém, o disposto no artigo 12." do Código Penal.
A discriminação racial, concebida como crime contra a Humanidade no artigo 240.° do Código Penal, é tipicamente alterada de modo a abranger a discriminação nacional e religiosa. E o crime passa a poder ser cometido através da negação pública de crimes de guerra ou contra a paz e a Humanidade, feita com o intuito de incitar à discriminação racial ou de a encorajar. Trata-se, em todos os casos, de dar cumprimento à acção comum adoptada, sobre a matéria, pela União Europeia.
No âmbito dos crimes de perigo comum, qualifica-se o crime que envolva engenho ou substância capaz de produzir explosão nuclear, cuja perigosidade excede, largamente, a representada pelas demais condutas previstas no artigo 275.°
A tutela da segurança das comunicações é reforçada por uma modificação respeitante à captura ou desvio de aeronave, navio ou comboio (artigo 287.°). Esta alteração refere-se à captura ou desvio de veículo de transporte colectivo de passageiros, conduta que, presentemente, não é contemplada pela descrição típica. Por razões de igualdade, tal conduta deve ser incluída na previsão do artigo 287.°, embora mereça punição menos severa.
Por outra parte, esclarece-se que, para efeito de punição pelo crime de condução de veículo em estado de embriaguez (artigo 292.°), vale a regra de conversão dos valores do teor de álcool no ar expirado em teor de álcool no sangue genericamente consagrada na alínea a) do n.° 1 do artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 111/94, de 3 de Maio: Tal regra baseia-se na correspondência entre 1 mg de álcool por litro de ar expirado e 2,3 g de álcool por litro de sangue.
São dois os crimes contra o Estado sujeitos à alterações significativas: mutilação para isenção de serviço militar (artigo 321.°) e tráfico de influências (artigo 335.°).
Na primeira situação, descriminaliza-se a automutilação, conduta sem dignidade punitiva, à luz do princípio da necessidade das penas e das medidas de segurança, em tempo de paz e numa ordem jurídica que consagra a objecção de consciência (artigo 276.°, n.° 4, da Constituição e Lei n.° 7/92, de 12 de Maio). A heteromutilação com o