0025 | II Série A - Número 010S | 25 de Outubro de 2001
o processo de tomada de decisão ter ficado mais complexo (com a introdução de uma maioria tripla no Conselho: votos, Estados-membros, e a "rede de segurança demográfica" (reivindicada por alguns Estados-membros como a Alemanha, a Espanha e os países do Benelux), e consequente aumento da possibilidade da constituição de minorias de bloqueio) e menos transparente . De forma semelhante, o Parlamento Europeu e a Comissão referem que o resultado de Nice se revelou duplamente lamentável, ou seja, dificultou a tomada de decisões, visto ter aumentado a percentagem de votos exigida para atingir a maioria qualificada; facilitando igualmente a possibilidade de um grupo de Estados-membros bloquear as decisões. Daqui resulta que o Tratado de Nice acabou por consagrar exactamente o contrário daquilo que se pretendia (uma maioria de Estados que representassem uma maioria de população ). A totalidade dos pareceres universitários recebidos refere igualmente esta complexidade.
Ainda no domínio da complexidade, já não do processo de decisão mas do próprio Tratado, a Comissão lamentou não ter sido acolhida a ideia da organização do Tratado em duas partes: num texto de base e num texto de aplicação, abrindo-se a possibilidade de se prever um procedimento de revisão simplificada para alterar o texto de aplicação, isto é, sem ratificação pelos parlamentos nacionais e, em certos casos, sem que fosse exigida a unanimidade no Conselho. Esta ideia era defendida por diversos Estados-membros e por personalidades do meio académico (nomeadamente pelo Instituto Universitário Europeu de Florença, que preparou a divisão do tratado em duas partes). A simplificação dos tratados, bastante reclamada, não foi, porém, concretizada na última CIG.
Mais uma vez se deve ter em consideração que o Tratado acabou por reflectir a permanente dicotomia e a busca pelo possível equilíbrio entre o mais da federação e o menos da intergovernamentalidade na história da construção europeia.
No que diz respeito à extensão do voto por maioria qualificada nas tomadas de decisão , quem pretendia a sua aplicação a todas as matérias, caso da Comissão Europeia e do Parlamento Europeu, considerou que as alterações introduzidas pelo Tratado de Nice foram quantitativamente positivas, mas qualitativamente decepcionantes, em face da expectativa veiculada, já que não são contempladas as políticas fiscal, ambiental e social, e os períodos de transição adiam a sua aplicação, nomeadamente no que respeita aos fundos estruturais, assim como as cláusulas de salvaguarda introduzidas, designadamente no que concerne à aplicação da política comercial comum ao sector dos serviços e aos direitos de propriedade intelectual.
No que concerne aos resultados da CIG sobre a composição da Comissão, as alterações foram profundas e radicais. A própria Comissão, o PE e os Estados-membros, principalmente os de pequena e média dimensão , regozijam-se pelo reforço do papel do respectivo Presidente, da sua nomeação passar a ser por maioria, e dos acrescidos poderes que lhe foram atribuídos. A perda do segundo Comissário para os Estados que os detinham foi compensada pela alteração da atribuição de votos no Conselho, mantendo-se no entanto o princípio da rotatividade em termos paritários para o momento em que a Comissão tenha mais de 26 membros.
Relativamente ao Parlamento Europeu, e quanto à sua composição, entende o próprio Parlamento Europeu, que se registou a quebra de um compromisso alcançado na CIG respeitante à manutenção do limite máximo de 700 membros. Observa igualmente que a repartição acordada não se rege por outro critério que não seja uma compensação pela ponderação de votos no Conselho. Esta ideia foi corroborada pela Comissão que lamentou igualmente o facto do número de lugares no PE ter sido resultado de um processo de equilíbrio relativamente à distribuição de votos no Conselho. O PE considerou ainda que se registou um aumento do défice democrático por o Tratado não ter introduzido o processo de co-decisão na execução da política comercial, na PAC, na UEM, na política de concorrência e nas ajudas estatais, não estabelecendo nenhuma relação entre a votação por maioria qualificada e a co-decisão no domínio legislativo . Embora tanto o PE como a Comissão tenham assinalado como satisfatória a introdução da referência acerca do estatuto dos partidos políticos europeus, ambos lamentam o facto de não ter sido criada a função de Procurador.
Em contrapartida, o PE manifestou apreço pela atribuição do direito de iniciativa e do parecer favorável no processo
(4) Elmar Brok e Dimitrios Tsatos, Síntese dos resultados da CIG, Comunicação aos membros do parlamento Europeu, 19 de Dezembro de 2000.
(5) Intervenção do Presidente da Comissão, Romano Prodi, no Parlamento Europeu, sobre o Conselho Europeu de Nice, 12 de Dezembro de 2000.
(6) "Conviria encontrar um modelo que garantisse um equilíbrio entre a necessidade de conferir aos Estados-membros de pequena dimensão maiores possibilidades de participarem numa via de integração e a necessidade de considerar o peso da população numa via democrática.", in Posição de princípio da Áustria, 10 de Fevereiro de 2000, p. 6
(7) "O texto do Tratado que resulta de Nice é ainda mais complexo do que os anteriores, o que não contribuirá para aproximar os cidadãos da União Europeia", in parecer da FD da Universidade de Lisboa, p. 2.
(8) "... uma aplicação tão extensa quanto possível deste princípio constitui um elemento determinante para a manutenção da capacidade de acção de uma União alargada.", in CIG 2000: documento de reflexão da República Federal da Alemanha, 21 de Março de 2000, p. 5
(9) "A Dinamarca propôs que a determinação das taxas mínimas para certos impostos verdes fosse sujeita ao voto por maioria qualificada", in CIG 2000: Contributos do governo dinamarquês, p. 3
(10) "...seria impensável à Áustria pôr em causa o direito que cada Estado-membro tem de designar, pelo menos, um membro da Comissão (...) aspecto fundamental da credibilidade e da legitimidade da Comissão. (...) a Áustria opõe-se à ideia de criar "comissários de segunda categoria"", in Posição de princípio da Áustria, 10 de Fevereiro de 2000, p. 5; "A Conferência tem de confirmar o princípio (...) cada Estado-membro tem de estar representado na Comissão por um comissário. Todos os comissários deverão ser membros de pleno direito da Comissão e terem um voto cada um no momento de tomar decisões", in CIG 2000: Contributos do governo dinamarquês, p. 4; "... cada Estado-membro dever estar nela representado (...) nenhuma hierarquização...", in CIG 2000: Memorando do Benelux, 19 de Outubro de 2000, p. 5
(11) "Para que aceite renunciar ao seu segundo comissário, a Alemanha exige que seja encontrada uma solução satisfatória relativamente a outras questões, nomeadamente no que concerne a ponderação de votos", in CIG 2000: documento de reflexão da República Federal da Alemanha, 21 de Março de 2000, p. 4; "Os votos no Conselho serão revistos a favor dos Estados-membros de maiores dimensões. Mas, em contrapartida, estes prescindirão de ter dois comissários para apenas um.", In CIG: Reform for Enlargement, The British Approach to the European Union IGC 2000, Fevereiro 2000, p. 19; "...considerando a hipótese em que os cinco Estados-membros de maiores dimensões renunciariam ao seu direito de designar um segundo membro da Comissão, a Áustria está disposta a encarar uma adaptação da ponderação de votos no Conselho.", in Posição de princípio da Áustria, 10 de Fevereiro de 2000, p. 6; "A Itália encontra-se preparada para renunciar ao segundo comissário em nome de uma reponderação de votos (...) os quatro grandes Estados-membros deverão (...) obter uma compensação pela perda do segundo comissário", in CIG 2000: posição da Itália, 3 de Março de 2000, pp. 3-4
(12) "A Áustria julga que nos domínios em que se decidisse por maioria qualificada, o procedimento de co-decisão deveria ser aplicado como princípio.", in Posição de princípio da Áustria, 10 de Fevereiro de 2000, p. 8; a mesma ideia é expressa in CIG 2000: Memorando do Benelux, 19 de Outubro de 2000, p. 5 e in CIG 2000: posição da Itália, 3 de Março de 2000, p. 5