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0027 | II Série A - Número 110S | 04 de Julho de 2003

 

dos trabalhadores, a que se referia a primitiva redacção do artigo 17.º, e que, por isso, já gozava do regime próprio dos direitos, liberdades e garantias, a transferência, operada pela primeira revisão constitucional, do conjunto dos "direitos fundamentais dos trabalhadores" para o título dos "direitos, liberdades e garantias" revestiu se de um "particular significado constitucional", quer por traduzir "o abandono de uma concepção tradicional dos "direitos, liberdades e garantias" como direitos do homem ou do cidadão genéricos e abstractos, fazendo intervir também o trabalhador (exactamente: o trabalhador subordinado) como titular de direitos de igual dignidade", quer por implicar "uma óbvia subversão do conceito tradicional da empresa (...) como domínio privado dos seus titulares, dispondo soberanamente das relações e postos de trabalho". E também é significativo que o primeiro dos direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores constitucionalmente consagrado seja o direito à segurança no emprego, com destaque para a garantia contra despedimentos sem justa causa: "trata se de uma expressão directa do direito ao trabalho (artigo 58.º), o qual, em certo sentido, consubstancia um aspecto do próprio direito à vida dos trabalhadores" (J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1993, págs. 285 e 286).
O carácter vital deste direito acentua a sua radical fundamentalidade: como se disse no Acórdão n.º 581/95, a proibição dos despedimentos sem justa causa é "a garantia da garantia". Daqui decorre que o sentido óbvio dessa proibição é o da rejeição da possibilidade de o empregador privar, sem justa causa, o trabalhador do seu emprego, o que implica que, julgada improcedente a justa causa invocada, a única forma de tutela adequada seja a reintegratória, que não a sancionatória ou a indemnizatória. Como referem José Joaquim Gomes Canotilho e Jorge Leite (A Inconstitucionalidade da Lei dos Despedimentos, separata do número especial do Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra - Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor António de Arruda Ferrer Correia, Coimbra, 1988, págs. 51 e 52): "Se o acto que extingue o contrato vem, afinal, a revelar se anti jurídico, a única reacção adequada do ordenamento jurídico compatível com o sistema da estabilidade é a de privar aquele acto da sua consequência normal, determinando a sua invalidade e consequente subsistência do vínculo contratual. A "monetarização" do despedimento como alternativa à reintegração permitiria, afinal, à entidade empregadora aquilo que a CRP quer, manifestamente, proibir - "desembaraçar se" do trabalhador apesar de não haver causa legítima de despedimento." (Cf. ainda António Barbosa de Melo, "Reflexão sobre o projecto de diploma relativo à cessação do contrato de trabalho", Revista de Direito e de Estudos Sociais, ano XXXI, 1989, n.ºs 3 4, onde se sustenta que o regime então analisado, que, "na ordem prática das coisas (e disto é que tratam as leis e o direito, e não de teorias e ideologias) (...) significa a mesmíssima coisa que autorizar a entidade empregadora a rescindir unilateralmente o contrato individual de trabalho a troco, tão só, de uma compensação pecuniária ao trabalhador despedido", "se não concilia, em meu modo de ver, com a protecção imediata que o artigo 53.º da CRP dá ao bem jurídico que designa por segurança no emprego", embora preconizasse a consagração, como causa objectiva de despedimento, que a entidade empregadora poderia accionar de novo, a "degradação do ambiente de trabalho resultante da reintegração do trabalhador ilicitamente despedido", que funcionaria como "contra estímulo a que o trabalhador que venceu a luta judicial se arvore em "rei" da sua relação de trabalho", já que "a espada que fica a pender sobre a sua cabeça levá lo á a tudo fazer para que a nova causa de despedimento possível não venha a ter lugar").
A tutela reintegratória só poderá ser afastada em situações em que outros valores constitucionalmente relevantes o justifiquem, como é o caso do contrato de serviço doméstico, em que a imposição da reintegração poderia atentar contra a intimidade da vida familiar. É essa a única situação até agora contemplada na legislação ordinária. O exemplo da função pública, por vezes invocado como uma segunda excepção, é claramente improcedente: da genérica previsão de a Administração invocar impossibilidade ou grave prejuízo para o interesse público no cumprimento das sentenças dos tribunais administrativos não resulta que pudesse ser considerada procedente eventual oposição à reintegração de funcionário vítima de acto expulsivo contenciosamente anulado com fundamento em vício impeditivo da repetição do acto com o mesmo conteúdo decisório. Pelo contrário, mesmo quando o lugar do funcionário demitido já tenha sido provido por terceiro, por acto administrativo "firme", aquele funcionário, obtida a anulação do acto expulsivo, tem direito a ser provido em lugar de categoria igual ou equivalente àquela em que deveria ser colocado, ou, não sendo isso possível, à primeira vaga que venha a surgir na categoria correspondente, exercendo transitoriamente funções fora do quadro até à integração neste (cf. artigo 173.º, n.º 4, do novo Código de Processo nos Tribunais Administrativos, e artigo 83.º, n.º 4, do Estatuto Disciplinar, norma esta relativa à revogação ou alteração de pena expulsiva na sequência de revisão do processo disciplinar).
Na situação contemplada na norma ora em apreço não se descortina a presença de valores constitucionalmente relevantes que justifiquem o sacrifício do mais fundamental dos direitos fundamentais dos trabalhadores: o direito ao trabalho.
Relendo a jurisprudência deste Tribunal quanto à garantia da segurança do emprego e à proibição de despedimentos sem justa causa (cf. n.º 16 do precedente acórdão) e recordando o alargamento que, a nível da legislação ordinária, o conceito de justa causa foi registando, constata se que, até ao presente, sempre se exigiu a verificação de uma situação de impossibilidade na manutenção da relação laboral para se permitir o despedimento. No Acórdão n.º 581/95, considerou se constitucionalmente admissível a causa objectiva de despedimento então apreciada (extinção do posto de trabalho) porque condicionada à impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho, requisito que consta da alínea b) do n.º 1 do artigo 27.º da LCCT e se mantém na alínea b) do n.º 1 do artigo 403.º do Código do Trabalho. No Acórdão n.º 64/91, considerou se constitucionalmente admissível a causa objectiva de despedimento então apreciada (inadaptação do trabalhador) porque condicionada à verificação de uma situação de impossibilidade objectiva da subsistência da relação de trabalho, requisito que consta do n.º 1 do artigo 27.º do Decreto Lei n.º 400/91, de 16 de Outubro, e se mantém no n.º 1 do artigo 406.º do Código do Trabalho.
Este requisito de impossibilidade prática, mesmo interpretado no sentido de não exigibilidade, desaparece na