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1638 | II Série A - Número 029 | 17 de Janeiro de 2004

 

que abrange, para além das que já estão delimitadas, as "demais actividades (…)", sendo estas as que era suposto delimitar !...
Uma interrogação também parece legítima quanto ao objectivo da lei enunciado em terceiro lugar, que consiste em "estabelecer um padrão básico quanto ao regime jurídico das ARI", quanto mais não seja pelo simples facto de, desde logo, se admitirem derrogações ao disposto na lei-quadro.
Adicionalmente, ambiguidades internas à própria lei limitam esse "padrão básico".
Um exemplo está na equiparação do Presidente e dos Vogais das Autoridades Reguladoras a Director-Geral e a Subdirector-Geral (artigo 25.º), quando, por outro lado, a mesma lei refere que as ARI são equiparadas a entes públicos empresariais (artigo 3.º, n.º 3).

2.3 Um outro tipo de interrogações prende-se com o conteúdo do projecto de diploma, que prevê minúcias regulamentares, eventualmente mais próprias de um regulamento interno do que de uma lei-quadro, tais como:

- Estabelecer o número de vezes em que o Conselho de Administração se reúne por ano… (artigo 22.º);
- Estabelecer que a acta das reuniões deve ser assinada por todos os membros presentes… (artigo 22.º, n.º 3);
- Estabelecer que nos termos dos Estatutos, o CA pode nomear, um director dos serviços e de gestão administrativa e financeira!... Um e um só!...

2.4 Outras interrogações poderão ligar-se a algumas imprecisões, lacunas e gralhas, por não favorecerem uma correcta apreciação do projecto de lei.

Por exemplo:

- O projecto de lei estabelece, no artigo 27.º, n.º 5, que a remuneração dos membros do Conselho de Fiscalização consta de diploma próprio, nos termos do artigo 25.º, n.º 2.
Acontece que no artigo 25.º não se fala em qualquer diploma próprio e o artigo refere-se a matéria diversa!...
- As funções reguladoras são desempenhadas, nos termos do n.º 2 do artigo 2.º, "no quadro da Lei e das orientações estratégicas definidas pela Assembleia da República e pelo Governo, através dos instrumentos próprios, nomeadamente o programa do Governo e o respectivo plano anual".
Não parece claro se esse plano anual é o previsto no artigo 54.º, isto é, o Plano de Actividades das ARI, como seria lógico, ou se esse plano anual é um Plano de Actividades anual do Governo, como resulta directamente da construção da frase.
- Não são previstas outras orientações estratégicas do Governo, para além das incluídas no respectivo programa, não se acolhendo como tal compromissos formalmente tomados por aquele órgão de soberania, nomeadamente antes da constituição de uma ARI.
A experiência, aliás, já mostrou que este aspecto não deve ser ignorado!...

2.5 Outra interrogação prende-se com o perfil dos membros a nomear para o CA é baseado em "(…) pessoas de reconhecido saber, experiência e competência na área em causa".
A questão a aprofundar está em saber se no texto não estará manifestamente a mais a "área em causa", isto é, em saber se o que verdadeiramente interessa não será recrutar pessoas de reconhecido saber, experiência e competência, e… bom senso…, independentemente da sua área de formação ou de experiência mais óbvia ou imediata.
Interessará reflectir se daquela restrição, sobretudo se for conjugada com o regime das incompatibilidades, não resultarão dificuldades óbvias e que se expressam na diminuição dos campos de recrutamento de pessoas com as características pretendidas.

2. Conclusões

O projecto de lei n.º 346/IX, que aprova a Lei-Quadro sobre Autoridades Reguladoras Independentes nos domínios económico e financeiro sugere as seguintes conclusões, a primeira, e a mais importante, de ordem geral, e as restantes directamente relacionadas com o concreto diploma em apreço:

1.ª É recente a regulação em Portugal, e na Europa, através de organismos independentes.
Eles, naturalmente, nasceram com soluções organizativas diferentes, indo de encontro a necessidades sentidas de forma diversa.
Estão a despontar, neste momento, em Portugal, outras áreas onde a regulamentação se torna indispensável, como a da saúde.
Haverá que reflectir sobre se a regulação das novas áreas e uma lei-quadro hão-de resultar das experiências em curso, da evolução do pensamento económico e jurídico sobre a regulação em si, do maior ou menor ritmo das privatizações de empresas que desenvolvem actividades de interesse económico geral e da especial natureza dos mercados envolvidos, avaliáveis, situação a situação, pelos Governos, ou se constituem algo que se deve subordinar, sem demora, a um quadro de referência arquitectado de forma dedutiva, por não estribado na experiência.
Havendo um largo caminho a percorrer, surge, naturalmente, a interrogação de saber se é ajustado estar a espartilhar desde já novas soluções organizadoras em esquemas pré-definidos, naturalmente mais rígidos e, porventura, menos eficazes.

2.ª Parece legítima a interrogação sobre se o projecto de lei n.º 346/IX atinge o primeiro objectivo a que se propõe e que é "delimitar as áreas em que se justifica a adopção das ARI".
Com efeito, no artigo 1.º, onde se define o objecto da lei, apenas se mencionam as áreas onde já existe, por uma ou outra forma, organismo regulador, acrescenta-se uma área, a da saúde, e referem-se, como objecto de regulação especial, "as demais actividades encarregadas de serviços de interesse geral".
Assim, a delimitação de áreas - logo o primeiro objectivo do projecto de diploma - não parece acolhida no texto do projecto de lei.
Ele visa delimitar as áreas em que se justifica a adopção das ARI, mas o seu articulado refere que abrange, para além das que já estão delimitadas, as "demais actividades…", sendo estas as que era suposto delimitar !...