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20 | II Série A - Número: 130S1 | 7 de Setembro de 2007


17.4 — Persistem, assim, em pontos decisivos, fundadas dúvidas quanto aos direitos do contribuinte de participação no procedimento de decisão do acesso ao sigilo bancário e de impugnação judicial dessa decisão.
Esta falta de certeza e segurança jurídicas, só por si, vulnerabiliza a posição defensiva do contribuinte, em temos constitucionalmente censuráveis, por violadores do princípio do Estado de direito e do direito fundamental de acesso ao direito e à via judiciária (v. Gomes Canotilho, ob. cit., 497).
Como diz impressivamente o Tribunal Constitucional espanhol, a propósito de garantia similar à do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, consagrada no artigo 24.1 da Constituição do país vizinho: Esta tutela para ser «efectiva», como exige el artículo 24.1 da Constitución, ha de ser expedita y fácilmente determinable y no se puede obligar a un litigante a que averigüe y, casi adivine, en el conjunto del complejo ordenamiento procesal, qué medios tiene para obtener la protección de sus derechos e intereses legítimos (STC 30/1984, de 6 de Março, apud Sánchez-Cruzat, Derecho fundamental al proceso debido y el Tribunal Constitucional, Pamplona, 1992, 213).

17.5 — Para além de impreciso quanto às garantias de defesa que oferece, o regime em análise dá-nos, no seu desenho global, uma nova previsão de derrogação administrativa do sigilo bancário excessivamente aberta e pouco condicionada.
Precisamente numa situação em que essa medida, para além da afectação do direito à reserva da privacidade, como inevitavelmente acontece em todos os casos de levantamento que não passem pelo consentimento do titular, põe em causa também o direito à reclamação e à tutela jurisdicional efectiva, o legislador não predispõe medidas cautelares e atenuadoras, possíveis sem sacrifício do objectivo visado. Isto é, naquele caso em que a efectividade e consistência das garantias ao contribuinte mais se justificavam, é precisamente aquele em elas são mais descuradas.
Ao dizermos que essas garantias, e a sua efectividade prática, eram aqui particularmente requeridas, estamos sobretudo a pensar no contexto e na fase procedimental ou processual em que se faculta o acesso.
Note-se que a administração fiscal, durante a instrução que deu origem ao acto agora impugnado, não dispunha, salvo nas hipóteses do artigo 63.º-B da Lei Geral Tributária, do poder de acesso directo a dados bancários. Quando o contribuinte se apresenta a exercer o seu direito de reclamação ou impugnação, ela, por esse facto, passa a deter um poder de acesso que anteriormente lhe estava negado, a pretexto da prossecução da verdade material a que já anteriormente estava vinculada.
No caso da impugnação judicial, é particularmente nítida a desconformidade ao princípio do processo equitativo (n.º 4 do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa). Na verdade, houve uma decisão administrativa cuja validade já está a ser sindicada por um tribunal. E o que se verifica é que, em sede de contestação aos vícios que o requerente imputa a essa decisão, a administração ganha novos poderes administrativos, que depois pode fazer frutificar, a seu ganho, no processo judicial a decorrer. Para isso, é-lhe inclusivamente concedido um prazo suplementar de contestação (n.º 3, in fine, do artigo 110.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, na redacção dada pelo artigo 3.º do Decreto n.º 139/X).
Numa espécie de reposição do procedimento tributário cuja decisão está a ser apreciada, os poderes administrativos, agora reforçados com uma nova prerrogativa, prolongar-se-iam, assim, na fase judicial.
Decorrendo à margem do processo de impugnação judicial, a derrogação do sigilo tem repercussão no seu resultado, sem que se mostre devidamente satisfeito, nem antes, nem após a prolação da decisão, o princípio fundamental do contraditório.
Assim, a violação do princípio do procedimento e do processo equitativo, quanto ao regime de derrogação do sigilo bancário na hipótese em apreço, vai conduzir a um condicionamento substancial do exercício, pelo contribuinte, das suas garantias impugnatórias de actos tributários. Não sendo directa e frontalmente restringido o direito de reclamar ou impugnar judicialmente, a verdade é que a forma não equitativa como está prevista a perda do sigilo e o factor causal que a determina esvaziam, em grande medida, aqueles direitos da sua efectividade prática.
Deste modo, mostram-se violados os artigos 2.º e os seus corolários: artigo 20.º, n.º 1 e n.º 4, e 268.º, n.º 4, da Constituição da República.

18 — Se passarmos de uma análise mais concentrada nos direitos fundamentais de natureza adjectiva para levarmos a cabo uma ponderação de bens, também no plano substantivo, somos levados a concretizar e desenvolver reflexões já feitas sobre as restrições à reserva da privacidade, à luz do princípio da proporcionalidade.
Recordemos que, na exposição de motivos da proposta de lei n.º 85/X, que está na génese da Decreto n.º 139/X, da Assembleia da República, se apresentam duas razões para as alterações legislativas.
Numa fase do processo em que se previa ainda que elas tivessem incidência apenas na reclamação graciosa, é-lhes apontado como fim, em primeiro lugar, «possibilitar à administração tributária, em estrita execução do princípio do inquisitório a que está subordinado o seu procedimento nos termos do artigo 58.º da Lei Geral Tributária, a averiguação plena dos factos alegados pelo contribuinte em sede de reclamação graciosa, designadamente mediante o acesso aos elementos pertinentes protegidos pelo sigilo bancário, de