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20 DE AGOSTO DE 2014

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pode ser realizada através do princípio da proteção da confiança associado às exigências da

proporcionalidade (neste sentido, também, REIS NOVAIS, O Tribunal Constitucional e os Direitos Sociais – o

Direito à Segurança Social, in Jurisprudência Constitucional n.º 6, pág. 10)».

Estas considerações valem, na mesma medida, para o regime objeto de pronúncia: trata-se de uma

alteração legislativa, que opera uma modificação do tratamento normativo em relação a uma mesma categoria

de situações, determinada, à partida, por razões de política legislativa que justificam a definição de um novo

regime legal, e que adapta o respetivo regime jurídico a situações já existentes no momento da sua entrada

em vigor.

8. Uma nota final quanto à questão da caracterização das medidas trazidas ao Tribunal Constitucional

como “transitórias” (ou seja, conjunturais) ou como “reformas sistémicas” (estruturais).

Concordo que essa caracterização influa no juízo do Tribunal, em especial, na medida em que se encontre

presente na fundamentação do poder político para a adoção da opção legislativa em causa. Mas preocupa-me

que o nível de exigência no escrutínio constitucional da norma perante os parâmetros constitucionais possa

depender, em larga medida, ou por si só, dessa distinção. Por um lado, independentemente desse caráter

estrutural ou conjuntural, os efeitos imediatos para os cidadãos de medidas incidentes sobre prestações

periódicas que integram a sua fonte de rendimento serão necessariamente os mesmos. Por exemplo, afirmar

que a CES não afetou o direito às pensões por ser temporária é dificilmente compreensível pelo cidadão

comum. Por outro lado, a diferenciação baseada no juízo de valor sobre o caráter “sistémico” ou “(a)sistémico”

da medida – por vezes desligado da fundamentação do poder político – cria uma incerteza quanto ao grau de

escrutínio que será aplicado.

Caberá ao Tribunal Constitucional qualificar uma medida como uma “reforma consistente e coerente em

que os cidadãos possam confiar” (n.º 35 do acórdão) para daí retirar consequências ao nível da sua validade

constitucional? Creio ser necessária uma reflexão sobre esta questão.

No imediato, um efeito indesejado desta jurisprudência poderá ser levar o legislador a optar por medidas

transitórias, por estarem sujeitas a um grau de escrutínio menor, que até podem ser mais gravosas para os

cidadãos. Até porque a repetição do “transitório” pode constituir uma via para a permanência.

Maria de Fátima Mata-Mouros

DECLARAÇÃO DE VOTO

Vencida quanto ao juízo de inconstitucionalidade pelos seguintes motivos:

1. O direito a receber, em substituição dos rendimentos de um trabalho que no ciclo final da existência

humana se não pode mais prestar, um certo montante de pensão é um direito conformado pela lei ordinária e

não pela Constituição. É a lei que determina quais os pressupostos que devem estar reunidos para que este

direito se constitua, com um conteúdo líquido e certo, na esfera jurídica do seu titular; é a lei que determina a

partir de que momento dele se pode fruir; é nos termos da lei que se determina o montante exato da prestação

que a ele corresponde.

Contudo, tal não significa que o referido direito (a receber um certo montante de pensão) seja, face à

Constituição, um direito comum, que, por ser conformado pelo legislador, se encontre à sua inteira disposição.

Uma vez que incumbe ao Estado organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social que proteja

os cidadãos na velhice (artigo 63.º da CRP),o direito a receber o benefício certo que corresponde a uma

determinada pensão é um direito derivado a prestações. A decisão sobre a sua existência não pertence ao

legislador. Se cabe a este último determinar como é que o referido direito se forma, não lhe cabe decidir se ele

existe ou não: a necessidade da sua existência deriva da Constituição, que obriga desde logo o legislador a

definir os meios (os pressupostos e os procedimentos) que conduzirão à sua configuração final. É o que

decorre do já referido artigo 63.º da CRP, que, aliás, corresponde a uma escolha de valor que está longe de se

apresentar como uma singularidade, ou uma “idiossincrasia”, do ordenamento português.