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2 DE DEZEMBRO DE 2020

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– O exposto em (i) obriga a ponderar a seguinte questão: relativamente ao ensino secundário, se legislarmos

no sentido de tornar facultativa a frequência da componente de Cidadania e Desenvolvimento quando esta seja

implementada como disciplina autónoma, será de admitir que essa faculdade de não frequentar dependa da

modalidade de implementação pela qual tenha optado esta ou aquela escola em concreto, a saber, apenas

numa de quatro modalidades de implementação previstas para o ensino secundário? O exercício da faculdade

de não frequentar pode depender de fatores tão contingentes? Ou considera-se a possibilidade de virem a ser

suscitados um certo número de incidentes de não frequência para situações que, sendo contingentemente

diferentes, não o seriam quanto à substância do equilíbrio de direitos em causa? E que efeitos teria a

concretização dessa possibilidade na vida concreta das comunidades escolares?

– A questão acabada de suscitar para ponderação acerca do exposto em (i) suscita a ponderação de uma

questão mais geral, relativamente à norma proposta na iniciativa em análise, na medida em que oferece a

faculdade de não frequentar a componente de Cidadania e Desenvolvimento a alunos de certos níveis de ensino,

mas não a outros: se estivesse correta a caracterização oferecida pelo proponente na exposição de motivos,

essa faculdade existiria para alunos no 2.º e 3.º ciclos do ensino básico, mas não para alunos do 1.º ciclo ou do

ensino secundário. Devemos ponderar se, futuramente, não seria argumentável que, por uma questão de

igualdade, todos os alunos deveriam poder exercer a mesma faculdade de não frequentar relativamente a

unidades de formação onde houvesse qualquer contributo, mesmo que marginal (por exemplo, como contributo

de um trabalho de projeto) de conteúdos de Cidadania e Desenvolvimento.

– O exposto em (ii) obriga a ponderar a seguinte questão: a autonomia devolvida às escolas para um trabalho

profundo de desenvolvimento curricular, uma flexibilidade que tem de ser mobilizada em resposta aos contextos

locais e às necessidades próprias dos seus alunos concretos, implica uma estrutural, embora progressiva e

provavelmente lenta, eliminação da rigidez e uniformidade da organização do ensino e da aprendizagem no

conjunto dos estabelecimentos de ensino, envolvendo variadas combinações entre disciplinas e variadas

estratégias de reorganização do tempo e do espaço da escola, prevendo-se que, com a evolução, cada caso

(cada escola) venha a ser um caso – e que a componente de Cidadania e Desenvolvimento não ficará,

certamente, de fora dessa dinâmica, razão pela qual a aplicação da norma proposta na iniciativa em apreço

seria vastamente desigual de caso para caso, cabendo ponderar se os valores invocado a fundamentar a

iniciativa da liberdade educativa – por mais estimáveis que sejam – ficariam bem servidos pela aprovação e

aplicação da norma proposta, com tão díspar aplicação. Como aplicar tal norma, por exemplo, nos «domínios

de autonomia curricular» abertos à articulação curricular e/ou trabalho interdisciplinar: admitindo a faculdade de

não frequentar a globalidade de qualquer «domínio de autonomia curricular» onde se registasse um contributo

de Cidadania e Desenvolvimento, quando, ainda por cima, essas combinações podem ser variáveis ao longo do

tempo – podendo até não ser completamente antecipável, pelo aluno ou pelos pais, em que dia ou hora vai

intervir numa atividade multidisciplinar um contributo de Cidadania e Desenvolvimento?

– O exposto em (iii) obriga a ponderar a seguinte questão: uma vez que os temas que alguns considerem

justificar a faculdade de não frequentar Cidadania e Desenvolvimento (quaisquer que sejam esses temas)

podem ser introduzidos ao nível de escola, no quadro da «Oferta Complementar», de oferta facultativa, mas de

frequência obrigatória, cabe ponderar: a prevista faculdade de não frequentar poderia ser estendida a essas

novas disciplinas? A quem competiria arbitrar um eventual desacordo acerca da similitude com o âmbito

intencionado pelo legislador na norma ora proposta? E seria admissível esse exercício de similitude,

designadamente fora dos mecanismos próprios da comunidade educativa para envolver todos os interessados

no processo de desenvolvimento curricular?

Como pano de fundo das questões que, nos parágrafos anteriores, foram identificadas como questões a

ponderar pelo legislador, sem que seja este o local para lhes dar resposta (este é apenas o local para suscitar

questões que o legislador deve ponderar), podemos identificar uma questão mais geral: deverá o legislador

escolher interferir diretamente com o currículo praticado no ensino básico e secundário, determinando conteúdos

ou determinando o que é facultativo ou obrigatório? Ou deverá, antes, o legislador, esperar que, numa sociedade

pluralista, esse pluralismo se exerça em cada comunidade educativa? – como, se bem entendemos, é a via

indicada por, pelo menos, dois dos «princípios orientadores» que o Decreto-Lei n.º 55/2018, de 6 de julho, define

para a implementação do currículo dos ensinos básico e secundário, a saber: «Concretização de um exercício

efetivo de autonomia curricular, possibilitando às escolas a identificação de opções curriculares eficazes,