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II SÉRIE-A — NÚMERO 38

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que concerne a uma escolaridade obrigatória aí prevista. Esses deveres públicos tomam outra concretização no

artigo 75.º (Ensino público, particular e cooperativo), onde se prevê (n.º 1) que «O Estado criará uma rede de

estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades de toda a população». Nada aponta para uma

oposição entre os contributos da escola e os contributos dos pais para a educação das crianças e jovens, tudo

aponta para uma complementaridade.

É indiscutível que a CRP reconhece aos pais o direito a fazer opções educativas para os filhos, embora

nenhum direito fundamental seja totalmente indisponível no equilíbrio com outros direitos fundamentais. Em

concreto, na CRP o direito reconhecido aos pais a fazerem opções educativas para os filhos é equacionado

juntamente com outros direitos, mormente aqueles que dizem respeito à autonomia da posição da própria

criança e aqueles que traduzem valores que o texto constitucional considera dignos de serem promovidos no

processo educativo e pelos quais deve velar a regulação pública da educação. E, ainda, porque o «direito e o

dever de educação e manutenção dos filhos» (n.º 5 do artigo 36.º) é mais um poder-dever do que um direito

subjetivo dos pais oponível ao Estado ou aos próprios filhos – o que reconhecemos no princípio orientador do

superior interesse da criança.

A CRP estatui sobre os direitos das crianças e jovens: desde um plano mais geral, no n.º 1 do artigo 26.º,

reconhecendo a todos o direito ao desenvolvimento da personalidade, até, noutro capítulo dos direitos e deveres,

reconhecendo especificamente às crianças o direito à «proteção da sociedade e do Estado», designadamente

em vista do «seu desenvolvimento integral» e «contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais

instituições».

O direito das crianças à proteção, tal como se encontra formulado no artigo 69.º do texto constitucional, obriga

quer o Estado quer a sociedade, devendo entender-se como abrangidos os poderes públicos, mas também os

cidadãos, desde logo as famílias, e as instituições (em sentido amplo).

O que essa proteção visa é o «desenvolvimento integral» das crianças (artigo 69.º, n.º 1), noção que devemos

relacionar com a de «desenvolvimento da personalidade» (artigo 26.º, n.º 2), de tal modo que não pode ser

descurada a necessária atenção à variação com a idade que a proteção terá de acompanhar (até porque não

existe uma precisão constitucional do que se entende por criança, nem existe sequer uma distinção

constitucional entre criança e jovem, mesmo oferecendo-se uma proteção específica aos jovens, constante do

artigo 70.º, onde, de novo, não se fixam limites etários à noção, nem à correspondente proteção específica).

O n.º 1 do artigo 69.º inclui no âmbito do direito à proteção reconhecida às crianças a obrigação de ir «contra

o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições», o que deixa ao legislador ordinário a

tarefa de definir as circunstâncias justificativas de eventuais limitações ao exercício do poder parental, bem como

da vigilância e punição de abusos cometidos em ambiente institucional ou doméstico – mesmo que não se atinja

o limiar de gravidade previsto no n.º 2, que envolve a privação de um «ambiente familiar normal» e a

correspondente necessidade de uma «especial proteção», neste caso especificamente cometida ao Estado.

Conjugando os vários preceitos constitucionalmente invocados, cabe ponderar se existe base legal para uma

eventual pretensão parental de isolar um filho da exposição a convicções diferentes daquelas que orientam a

vida dessa família; se existe base legal para admitir como princípio a possibilidade de subtrair sistematicamente

uma criança ou jovem ao pluralismo característico de uma sociedade democrática.

De notar ainda que, no âmbito da «Participação democrática no ensino», o artigo 77.º da CRP, além de

reconhecer a professores e alunos «o direito a participar na gestão democrática das escolas, nos termos da lei»

(n.º 1), reconhece ainda, a várias associações representativas de vários olhares sobre o ensino, incluindo os

pais, «formas de participação» «na definição da política de ensino» (sem que se preveja a participação na

respetiva execução) – embora, mais uma vez, sob reserva de lei (n.º 2). Note-se que esta modalidade de

participação inscrita no n.º 2 é concebida como um exercício coletivo (através de associações ou instituições),

não como um exercício individualizado tal como previsto no n.º 1.

Neste quadro, faz sentido rever as disposições da Lei de Bases do Sistema Educativo, Lei n.º 46/86, de 14

de outubro, na sua redação atual (LBSE), que concretiza os valores constitucionais, estabelecendo «o quadro

geral do sistema educativo» (n.º 1 do artigo 1.º), nos aspetos diretamente relevantes para a apreciação da

iniciativa em análise.