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16 DE MARÇO DE 2021

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«Artigo 30.º

(Direito à vida)

1. A vida humana é inviolável.

2. Não existe pena de morte.»

Este texto foi transporto, quase integralmente, para o texto final. O Deputado constituinte José Ribeiro e

Castro, em texto de opinião recente, datado de 2 de fevereiro de 2021, publicado no jornal onlineObservador,

aludiu à força extraordinária desta fórmula, em comparação com as outras propostas de texto então

apresentadas:

«[A] generalidade dos projetos de Constituição, em 1975, continha formulações jurídicas habituais na

proteção do direito à vida. O projeto do CDS dizia: ‘Constituem direitos e liberdades individuais do cidadão

português (…) o direito à vida e à integridade física.’. O do PS: ‘É garantido o direito à vida e integridade

física.’. O do MDP/CDE e da UDP nada diziam. O do PPD afirmava: ‘O Direito à vida e à integridade pessoal é

inviolável’. Foi o do PCP a propor a proclamação consagrada: ‘A vida humana é inviolável’».

A individualização no n.º 2 do artigo 24.º da exclusão – pela afirmação «em caso algum haverá…» – da

pena de morte, correspondendo embora a uma tradição de referenciação desta no texto constitucional, que

remonta à Constituição de 1911 (que constitucionalizou a abolição operada em 1867), não deixa de ter o

sentido de um reforço da afirmação contida no n.º 1, subtraindo-lhe, numa elevação de grau de proteção, o

que na génese bíblica do mandamento não matarás, na sua evolução no pensamento judaico-cristão, foi

construído, a par da guerra, como exceção ao imperativo moral de não matar (cfr. Nahum M. Sarna, The JPS

Torah Commentary, Exodus, The Jewish Publication Society, Philadelphia, Jerusalem, 1991, p. 113; «The

Christian Judge and the Taint of Blood: The Theology of Killing in War and Law», James Q. Whitman, The

Origins of Reasonable Doubt. Theological Roots of the Criminal Trial, Yale University Press, New Haven,

Londres, 2008, pp. 28-49). E permanece a pena de morte – só permanece, todavia, para quem a aceite – com

um sentido paradoxal face à afirmação da inviolabilidade da vida humana.

Neste contexto, vale assinalar, na exegese do artigo 24.º (então o artigo 25.º), que uma maior proximidade

ao legislador histórico (ao contexto histórico da construção dessa disposição) conduziu Gomes Canotilho e

Vital Moreira, na 1.ª edição da sua Constituição Anotada, à afirmação de uma natureza absoluta do valor do

direito à vida: «[o] valor do direito à vida e a natureza absoluta da proteção constitucional traduz-se no próprio

facto de se impor mesmo perante a suspensão constitucional dos direitos fundamentais, em caso de estado de

sítio ou de estado de emergência» (ob. cit., Coimbra, 1978, p. 92). Assim, acompanhando a questão no

contexto evolutivo desta obra de referência – cuja análise permite interessante perspetivação diacrónica do

tratamento jurídico-constitucional da questão –, na respetiva 2.ª edição, já com a consideração do problema do

suicídio, questionando quanto a este os Autores a referenciação ao próprio do dever de proteção da vida,

encontra-se igualmente presente a afirmação da mesma ideia de uma proteção absoluta, associada a uma

natureza qualificada do direito: «[a]o conferir-lhe uma proteção absoluta, não admitindo qualquer exceção, a

Constituição erigiu o direito à vida em direito fundamental qualificado» (ob. cit., Coimbra, 1984, p. 190). Tal

ideia é repetida, até de forma mais enfática, na 3.ª edição, aí já com a ponderação da questão da eutanásia:

«[j]urídico-constitucionalmente não existe o direito à eutanásia ativa, concebido como o direito de exigir de um

terceiro a provocação da morte para atenuar sofrimentos («morte doce»), pois o respeito da vida alheia não

pode isentar os ‘homicidas por piedade’» (ob. cit., Coimbra, 1993, pp. 174-175).

É importante referenciar, a culminar o percurso empreendido pela obra em análise, a caracterização do

direito à vida, num contexto mais próximo do presente, na 4.ª edição: «[n]ão se trata […] apenas de um prius

lógico: o direito à vida é material e valorativamente o bem (localiza-se, logo, em termos ontológicos no ter e ser

vida, e não apenas no plano ético-deontológico do valor ou no plano jurídico axiológico dos princípios) mais

importante do catálogo de direitos fundamentais e da ordem jurídico-constitucional no seu conjunto.

Precisamente por isso é que o direito à vida coloca problemas jurídicos de decisiva relevância nas

comunidades humanas» (ob. cit., anot. I ao artigo 24.º, p. 447). Além disso, é reiterada a inexistência de um