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6 DE OUTUBRO DE 2021

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Relativamente ao primeiro inquérito, de fevereiro de 2015, que contou com uma amostra superior a 3000

mulheres e era destinado àquelas cujo parto tivesse ocorrido entre janeiro de 2012 e março de 2015, realça que

«a maioria das mulheres teve alguma intervenção durante o seu trabalho de parto e parto, dado que apenas

cerca de 11% destes foram sem intervenção, o que contrasta com o número expectável de partos fisiológicos

numa população como a portuguesa. A epidural foi o procedimento mais comum (aproximadamente 70%),

seguido da episiotomia (aproximadamente 70%) e ocitocina artificial (mais de 50%). Mais de 40% dos bebés

nascidos por via vaginal nasceram por parto instrumentado, dos quais quase dois terços com recurso a ventosa

e um terço com recurso a fórceps. Mais de 40% das mulheres afirmaram não terem sido consultadas sobre as

intervenções ou exames realizados durante o trabalho de parto e parto e/ou não tiveram informação sobre

opções de parto, como indução, cesariana, parto domiciliar, entre outras. Quase 25% das mulheres não se

sentiu bem com a posição adotada para a expulsão. Mais de 10% das mulheres refere que a experiência de

parto influenciou de forma negativa a sua autoestima, existindo, ainda, um número significativo de mulheres que

não se sentiu segura, apoiada, ouvida, respeitada ou bem tratada e para quem o parto teve uma influência

negativa, tanto a nível pessoal como a nível inter-relacional, na relação com o bebé e com o parceiro. Finalmente,

1468 mulheres, ou seja, 43,8% das inquiridas, afirmaram não ter tido o parto que queriam.»

Quanto ao segundo inquérito, que foi dirigido às mulheres cujo parto ocorreu entre 2015 e 2019, destaca que

«18% das mulheres não teve direito ao acompanhamento durante o parto. Verifica-se um elevado recurso à

episiotomia, que ocorreu em mais de 60% das situações. Ainda, cerca de 30% das mulheres afirmaram ter sido

vítimas de desrespeito, abuso ou discriminação. Aqui destacaram particularmente a prática de intervenções não

consentidas, as quais afetaram direta e negativamente a perceção das inquiridas sobre a sua experiência de

parto. Foi, ainda, mencionada a relação deficiente com os prestadores de cuidados e situações de abuso verbal

e físico.»

Os dados dos inquéritos revelam que as recomendações, nomeadamente as relacionadas com a

medicalização do parto, redução da utilização da episiotomia e respeito pelas opções da mulher, não estão a

ser cumpridas, mas revelam também a existência de casos de abusos verbais e físicos em instituições de saúde.

São, também, referidos procedimentos específicos, como seja a episiotomia, cuja utilização é excessiva e

rotineira e que contraria as recomendações da OMS, e pode, entre outros, ter efeitos físicos e psicológicos

adversos na mãe e levar à morte.

Refere a proponente que a episiotomia, «quando não se justifique por razões médicas, deve ser considerada

como uma violação dos direitos da mulher e uma forma de violência baseada no género contra as mulheres».

Já no que diz respeito à manobra de Kristeller, «esta é, segundo a OMS, uma prática a evitar por acarretar

complicações para a parturiente».Refere ainda que «a violência obstétrica tem particularidades que justificam

a sua autonomização enquanto crime, não se confundindo com outras previsões legais».

Destaca também, na exposição de motivos, os dados da Organização Mundial de Saúde e do Observatório

português dos sistemas de saúde, a Resolução da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa n.º

2306/2019 sobre violência obstétrica e ginecológica; a recente Resolução do Parlamento Europeu sobre a

situação da saúde e dos direitos sexuais e reprodutivos na UE no contexto da saúde das mulheres

(2020/2215(INI) e trabalhos de investigação, bem como a proibição deste tipo de violência contra as mulheres,

enquanto violação de direitos humanos e forma de discriminação, em diversos documentos internacionais,

nomeadamente a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres

(CEDAW), a Declaração sobre a Eliminação da Violência Contra as Mulheres da ONU e Convenção do Conselho

da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica (Convenção

de Istambul).

O projeto de lei promove, assim, a alteração do Código Penal, aditando ao respetivo artigo 144.º-A (Mutilação

genital feminina) um n.º 3, que faz equivaler ao crime já previsto e punido «as intervenções levadas a cabo por

médico ou por outra pessoa legalmente autorizada que resultem na mutilação genital de pessoa do sexo

feminino, em violação das leges artis» e criando um novo tipo de crime semipúblico, através do aditamento de

um artigo 166.º-A, com a epígrafe «Violência Obstétrica» definido como o ato de «sujeitar mulher, durante o

trabalho de parto, parto ou puerpério, a violência física ou psicológica, que lhe cause dor, dano ou sofrimento

desnecessário ou limite o seu poder de escolha e de decisão».

O projeto de lei prevê ainda o agravamento da pena (de um terço, nos seus limites mínimo e máximo), se a

conduta ocorrer em circunstâncias ou contra pessoas em situação de especial vulnerabilidade, que identifica do