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16 DE JUNHO DE 2022

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e controle administrativo das condições em que esses animais são detidos. Por conseguinte, a relação do

homem com os seus animais de companhia possui hoje já um relevo à face da ordem jurídica que não pode ser

desprezado.»10

Com a alteração apresentada, pretende-se, igualmente suprir a indeterminação dos conceitos utilizados na

descrição quer do objeto da conduta incriminada, que do que se entende por a «motivo legítimo» a contrario

sensu, referindo e excecionando claramente que não se aplica à utilização de animais nos termos e para os fins

legais, elencando-os.

Desta forma, entendemos que o processo de criminalização dos maus-tratos a animais, e agora não apenas

aos de companhia, dispõe de precisão e densidade suficientes, ao contrário do que acontecia com as normas

anteriores para que potenciais autores do ilícito-típico possam claramente compreender e antecipar o

comportamento que se pretende punir, tornando-o, assim, compatível com a exigência de lei certa, decorrente

do n.º 1 do artigo 29.º da Constituição.

Acresce que «para que o tipo de crime esteja de acordo com o bem jurídico que lhe confere legitimidade, e

para o alinhar com o crime de abandono que integra a mesma categoria, é necessário interpretar a expressão

«animais detidos» restritivamente, como referindo-se apenas a animais que, tendo sido domesticados, se

tornaram dependentes de cuidados humanos.»11

É nossa convicção que atualmente já existe no nosso País amplo consenso em torno das soluções jurídico-

criminais adotadas por outros ordenamentos jurídicos afins, como é o caso do país vizinho.

O exposto torna premente a necessidade de alteração das premissas legais no âmbito da tutela penal dos

animais, ditando a eliminação do atual critério funcionalista e subjetivo, dificultador da interpretação e da

aplicação das normas penais e até do fundamento constitucional destas, conforme tem sido alertado por ilustres

penalistas como a Prof.ª Doutora Teresa Quintela de Brito, já ouvida sobre esse assunto em sede de Comissão

Parlamentar.

Neste sentido e nas palavras da filósofa norte-americana Martha Nussbaum «os animais não humanos são

capazes de uma existência condigna. É difícil precisar o que a frase pode significar, mas é relativamente claro

o que não significa (…) O facto de os humanos atuarem de uma forma que nega essa existência condigna

aparenta ser uma questão de justiça, e uma questão urgente.»12

Considerando o que vai exposto, o PAN propõe-se alargar a tutela penal dos animais, com base no modelo

espanhol vigente, corrigindo, assim, aquela que é uma clamorosa injustiça de tratamento entre animais que não

sentem de forma diferente, independentemente do objetivo da sua utilização, pelo menos daqueles mais

vulneráveis, que estão à mercê da ação humana.

Entendemos ainda que, face ao regime da propriedade de animais, tal como se encontra hoje configurado

pelo artigo 1305.º-A do Código Civil, importa diferenciar a propriedade de coisas inanimadas da propriedade de

animais, no âmbito da tutela penal do património, concretamente no que respeita ao crime de dano e na

consequente tipologia do crime, diferenciando-os e submetendo à necessidade de queixa ou acusação particular

apenas os crimes cujo objeto da ação seja uma coisa.

Por fim, importa garantir a aplicabilidade da lei e a punição efetiva das condutas previstas no ilícito penal. E,

apesar de, no nosso entender, ser necessária uma revisão geral das molduras penais previstas no nosso Código

Penal, de forma a adequá-las e consensualizá-las com a natureza e gravidade do crime, prevê-se, para já,

necessário aumentar os limites máximos previstos para as penas de multa dos crimes de maus-tratos e

abandono de animais, bem como da pena de prisão pelo dano morte, na proporção entre culpa e medida da

pena, em nome de exigências de prevenção geral e especial.

Nestes termos, a abaixo assinada Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, ao abrigo das disposições

constitucionais e regimentais aplicáveis, apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei alarga a outros animais a tutela criminal prevista contra os animais de companhia, procedendo,

para o efeito, à quinquagésima sexta alteração do Código Penal aprovado pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de

10 Acórdão do Tribunal da Relação do Porto (dgsi.pt) 11Cfr. Declaração de Voto do Sr. Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro (https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20210867.html) 12 Martha Nussbaum, Frontiers of Justice, 2007