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13 DE JULHO DE 2022

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direito à liberdade (artigo 27.º), da ideia da proibição de penas cruéis, degradantes ou desumanas (artigo 25.º,

n.º 2) e, finalmente, da ideia de proteção da segurança, ínsita no princípio do Estado de direito»3. Acrescentam

que «um inquestionável princípio geral de limitação das penas e dos seus efeitos é naturalmente o princípio

constitucional da necessidade e da proporcionalidade, quer quanto ao tipo de sanção, quer quanto à sua duração

e dimensão».

A proposta em causa, ao mais do que duplicar a pena máxima para o crime de homicídio qualificado, e

elevando o limite mínimo para o limiar que antes representava o máximo da pena, atinge, de forma manifesta o

referido princípio da necessidade e proporcionalidade, como refere S. Ex.ª Presidente da Assembleia da

República no seu despacho.

Descrito sinteticamente o objeto, conteúdo e motivação da iniciativa em apreço, não podemos deixar de

partilhar do reparo apontado pelo S. Ex.ª Presidente da Assembleia da República, concordando com o teor do

mesmo, de que a concretização do objetivo pretendido é o mesmo do anteriormente apresentado,

concretamente à prisão perpétua.

O invocado no recurso dos proponentes, nomeadamente o facto do projeto prever, «que seja aplicada

liberdade condicional após o cumprimento de 15 anos de pena, o que corresponde a um período de

encarceramento inferior à atual pena máxima», considerando que os fins da pena, «prevenção e reabilitação»

se encontram, desta feita, assegurados, parece-nos não encontrar sustentação, uma vez que não nos

encontramos no princípio casuístico e da aplicabilidade, não cabendo, certamente ao julgador a aplicação da lei

de modo a tornar a sua aplicação constitucional.

Os autores da iniciativa referem, na exposição de motivos, que «não se trata, por isso, de reintroduzir uma

abstração ou uma especificidade técnica, mas sim de aprofundar e aperfeiçoar o dever de realização da justiça

a que o Estado está constitucionalmente adstrito».

Contudo, e ainda que, limitando expressamente a moldura penal, não se poderá deixar de concordar que a

ratio legis é a mesma da prisão perpétua, com vista a atingir o mesmo objetivo material.

Gomes Canotilho e Vital Moreira referem que «a prisão perpétua (…) é de tal modo importante na economia

da ‘constituição penal’ que a CRP proíbe mesmo a extradição para países em que os extraditandos possam vir

a ser condenados a tal pena (ou medida de segurança), se não houver garantia oficial de que ela não se aplicará

ao caso concreto (art.33.º-4)». Ora, não se poderá deixar de entender, por maioria de razão, que qualquer pena

que se mostre de duração de carácter perpétuo, ainda que, em última análise se considere formalmente

determinada, possa ter qualquer respaldo constitucional. Para além disso, a prisão perpétua no seu sentido

estrito ou no seu modelo «revisível» como propõem os autores não tem qualquer efeito controlador do crime na

sociedade, até porque não só não há estudos científicos que o comprovem, como também os dados estatísticos

apontam no sentido contrário.

PARTE III – Parecer

Face ao exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer:

a) Que o Projeto de Lei n.º 215/XV/1.ª (CH) padece de desconformidade constitucional, por infringir o disposto

no n.º 1 do artigo 30.º da Constituição da República Portuguesa;

b) Essa desconformidade constitucional é intransponível no decurso do processo legislativo, uma vez que o

objeto do projeto de lei em apreço a ela se circunscreve;

c) Consequentemente, o Projeto de Lei n.º 215/XV/1.ª (CH) não reúne os requisitos de admissibilidade

previstos no artigo 120.º, n.º 1 alínea a), do Regimento da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 13 de julho de 2022.

A Deputada relatora, Inês de Sousa Real — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.

3 José Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit., p. 502.