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23 DE AGOSTO DE 2022

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bem-estar animal.

A formulação qualitativa de algumas normas, desprovida de referenciais objetivos, vem impossibilitando a

devida fiscalização, gerando dúvidas de interpretação e, como tal, a impunidade perante situações objetiva e

indubitavelmente lesivas do bem-estar dos animais de companhia.

É o caso, designadamente, do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 8.º, que dispõe que «os animais

devem dispor do espaço adequado às suas necessidades fisiológicas e etológicas, devendo o mesmo permitir

a prática de exercício físico adequado» (itálicos nossos).

O exemplo citado manifestamente não cumpre as exigências de clareza e definição vigentes em matéria

contraordenacional nem os objetivos formulados no n.º 1 do artigo 7.º, que exige que as condições de

detenção e de alojamento dos animais de companhia devem salvaguardar os seus parâmetros de bem-estar

animal.

Nesse contexto, como é sobejamente conhecido, destacam-se duas situações que justificadamente vêm

causando grande alarme social e reclamando a intervenção dos poderes públicos: o acorrentamento

continuado dos animais de companhia e o confinamento dos mesmos a varandas e espaços afins, muitas

vezes sujeitos às mais adversas condições atmosféricas.

São dois exemplos paradigmáticos que em tudo representam a antítese dos princípios que norteiam e

devem nortear a detenção e a acomodação dos animais de companhia. No entanto, infelizmente, não são

situações incomuns no nosso País.

Em Portugal estima-se que existem atualmente mais de 6 milhões de animais de companhia, na sua

maioria cães e gatos.

O número de animais de companhia detidos em casas de habitação tem aumentado exponencialmente nos

últimos anos. Em 2015, cerca de dois milhões (54%) dos lares portugueses possuía, pelo menos, um animal

de estimação, representando um crescimento de 9% em apenas quatro anos; por outro lado, 53% dos cães e

64% dos gatos detidos como animais de estimação vivem dentro de casa.

De assinalar até que se tem registado um expressivo aprofundamento da ligação emocional aos animais de

companhia em detrimento da tradicional ligação funcional, sendo aqueles definidos por metade dos seus

detentores como «membros da família».

É conhecida e reconhecida a importância dos animais de companhia nas sociedades urbanas modernas,

contribuindo decisivamente para a melhoria da qualidade de vida e da saúde psíquica e emocional de quem

com eles interage, idosos e crianças em particular.

Ciente dessa importância e da necessidade de dignificar o seu estatuto enquanto animais especialmente

valorados pela sua função social, o legislador português reservou-lhes um tratamento especial, quer em sede

de tutela penal exclusiva, através da Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto, e, mais recentemente, da Lei n.º

39/2020, de 18 de agosto, quer no âmbito do Código Civil, através da Lei n.º 8/2017, de 3 de março, pela qual

não só beneficiam hoje do estatuto civil próprio dos animais enquanto seres sensíveis como ainda de diversas

disposições específicas, designadamente, no capítulo do Direito da Família.

Não resulta, pois, admissível nem conforme aos valores e regimes legais enunciados, que um animal de

companhia possa ser alojado em varandas e outros espaços afins ou mantido acorrentado uma vida inteira,

condenado a uma existência miserável, privada de liberdade de movimentos, que é, afinal, a essência da

condição animal.

Adicionalmente, são numerosos os estudos que apontam para a perigosidade da detenção e alojamento de

animais, em especial cães, mas chegam-nos denúncias também de casos de gatos que vivem

permanentemente acorrentados, em condições impróprias, desde logo, privados de exercício físico ou sujeitos

a acorrentamento ou confinamento prolongados.

Os cães, por exemplo, são animais sociais que necessitam da socialização para poderem desenvolver-se

de forma saudável. Se permanecerem acorrentados ou confinados a uma área exígua durante horas, dias,

meses ou até anos, podem sofrer sérios danos emocionais e físicos, devido aos efeitos acumulados do

isolamento, da frustração e do tédio. Acresce que cães que antes eram amigáveis e calmos podem, assim,

tornar-se infelizes, ansiosos e, muitas vezes, agressivos por força da circunstância de se encontrarem

permanentemente acorrentados.

Segundo o Center for Disease Control norte-americano, os cães acorrentados têm maior probabilidade,

cerca de 2,8 vezes mais, de morder. E no mesmo sentido, até com consequências gravosas, concluiu o