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II SÉRIE-A — NÚMERO 47

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I – DINÂMICAS RECENTES DA HABITAÇÃO EM PORTUGAL

Quando comparado com a generalidade dos países europeus, e face à génese tardia e imperfeita do Estado

social português (que relegou para segundo plano a concretização do pilar relativo ao direito à habitação no

quadro dos direitos sociais), o nosso País enquadra-se nos modelos de política habitacional focados em

públicos-alvo específicos e, nesse âmbito, no conjunto de países com políticas de promoção direta residuais

(que, entre outros critérios, detém um parque público inferior a 5 % do total).1

Este perfil minimalista da política habitacional, seguido durante décadas, teve como exceção relativa apenas

dois momentos. Ao nível da promoção direta, no período do pós-25 de Abril de 1974, em que se atingiram os

valores mais relevantes de promoção pública direta de alojamentos (a que se junta, mais tarde, a promoção

associada ao Programa Especial de Realojamento nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto). Ao nível da

promoção indireta, com a generalização do acesso à aquisição de casa própria (essencialmente orientada para

segmentos da classe média), a partir de finais dos anos 80. Aliás, é sobretudo no decurso desta política de

promoção indireta (mediante apoios públicos à aquisição de casa própria), que se foi instalando na sociedade

portuguesa a ideia de que o problema da habitação – no sentido da capacidade das famílias para aceder a um

alojamento – estava, no essencial, ultrapassado.

Esta noção, que perdurou até há relativamente pouco tempo, encontra suporte em diversos indicadores,

sendo de destacar, entre eles, a elevação do rácio de alojamentos por família, que em 20 anos (1991 a 2011)

passou de 1,3 para 1,5, mantendo-se sensivelmente neste patamar em 2021.

Por outro lado, no mesmo período, a percentagem de agregados familiares a residir em casa própria registava

um aumento de quase 10 pontos percentuais (passando de 65 % para 73 %), com uma ligeira descida para os

70 % em 2021, que não coloca em causa a clara prevalência desta forma de ocupação no total de alojamentos.

Podendo igualmente ser interpretado como um indício de melhoria generalizada da situação habitacional do

País a partir dos anos 90, pelo maior volume da oferta de habitação, o número de fogos devolutos registava um

acréscimo de 67 % entre 1991 e 2011 (passando de cerca de 440 000 para 735 000, e para cerca de 723 000

em 2021) e o número de alojamentos precários (barracas e outros) reduzia-se em cerca de 76 % (de 27 300

para 6600) no mesmo período, a que acresce uma nova redução, em 2021, para cerca de 4000 fogos.

A ideia de superação da situação estrutural de crise habitacional viria, porém, a esbater-se nos anos mais

recentes, sensivelmente a partir de meados da segunda década do Século XXI. Isto é, num contexto marcado

por três processos essenciais: o impacto económico e social da crise financeira de 2008; as reorientações

políticas no setor da habitação, nomeadamente no quadro do processo de «ajustamento» estrutural (2011-

2015); e, por último, a relevância de novas dinâmicas habitacionais nas principais cidades, como as que se

associam ao aumento do investimento imobiliário estrangeiro e à intensificação da procura turística.

Quadro 1

Principais indicadores da habitação em Portugal (1970-2021)

1970 1981 1991 2001 2011 2021

Alojamentos por família 1,17 1,16 1,32 1,37 1,45 1,44

Casa própria 49,3 % 56,6 % 64,7 % 75,7 % 73,2 % 70,0 %

Fogos devolutos 373 950 190 331 440 271 543 777 735 128 723 214

Habitações precárias (barracas e outras)

34 860 46 391 27 642 27 319 6 612 4 042

Fonte: INE, IP

No seu conjunto, estes processos contribuiriam para uma tendência de subida dos valores de aquisição e

arrendamento, sobretudo a partir de 2013, tendência essa que se tem vindo a acentuar nos últimos anos e que

nem durante a crise pandémica se inverteu, sem que o Estado fosse capaz de dar resposta cabal às

necessidades com o escasso parque público existente.

1 European Parliament (2013), Social Housing in the EU, Directorate-Generale for Internal Policies, Brussels.