25 DE MAIO DE 1991
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4.9 Ausência dc fracturas nos corpos das vítimas. — Está esclarecida no processo a ausência dc fracturas na generalidade das vítimas (cf. o relatório das autópsias) c sobre este aspecto a Comissão pôde ouvir peritos módicos qualificados. O Dr. Vasconcelos Marques, médico do Dr. Sá Carneiro, refere que «o Dr. Sá Carneiro tinha condiçáo predisponente para ter lesões de coluna (....] sempre que alguém tiver um acidente c náo esteja consciente, a probabilidade dc haver fracturas dos membros é mínima ou nula [...]» (fl. 11); «[...] sc mc perguntar por que é que nenhum tinha fracturas, dir-lhe-ci que sc deve ao facto dc nenhum deles estar consciente. Aliás, é um assunto que náo tem sequer discussão» (cf. o depoimento do Dr. Vasconcelos Marques, fl. 1259 da III CEIAC).
No mesmo sentido apontam as análises do Armcd Forces Institui of Palhology cm Março dc 1982 (fls. 366 c scg. do processo da PJ), que, na sua tradução oficial (Livro de Camarate, p. 290, cd. do Ministério da Justiça), referem:
Quando não há sinais dc fracturas c dc injúrias viscerais evidentes na autópsia, os exames radiológicos do corpo inteiro c dissecação da parte posterior do pescoço são úteis na determinação dc outras causas dc incapaciiação física.
O perito médico legal, Dr. Fernando Fonseca, inquirido acerca das mesmas questões pela Comissão, é bem claro ao referir que as vítimas no momento de colisão «poderiam estar desmaiadas mas vivas» (cf. o dcpoimcnlo dc Fernando Fonseca, fl. 922 da III CEIAC).
Conclui-se, assim, que na altura da colisão da aeronave com as casas de Camarate as vítimas já sc encontravam inanimadas. Fa/, sentido a afirmação dc outros pontos acerca do entendimento dc que as vítimas sc encontravam ainda vivas no momento do embate, mas, para a ausência dc fracturas, o que tem relevância é o seu estado dc inconsciência ou ausência dc sentidos.
5.g Ausência dc comunicações entre o Cessna c a torre dc controlo do Aeroporto. — A última comunicação enue o avião c a torre de controlo do Aeroporto verificou-sc às 20 horas, 16 minutos c 25 segundos, consistindo na autorização para a descolagem c sua resposta (11. 90 do rclaidrio da DGAC).
Assim, no tempo cm que durou o voo, ou seja, entre o início dc descolagem c o embale final, nenhuma comunicação existe cnlre o avião c a torre ou vice-versa. Este facto rcvcla-sc estranho, já que a rapidez com que a comunicação rádio pode ser efectuada cnlre a lorrc dc controlo c a aeronave cm voo é extremanente fácil c rápida.
Técnicos aeronáuticos ouvidos pela Cl são do entendimento de que resulta muito provável como explicação o corte anormal dc possibilidade dc comunicação rádio ou na incapacitação dc tripulação (cf. os depoimentos dos piloios Georgino Silva, IL 31 da IV CEIAC, Alcides Teixeira Lopo, III CEIAC, João Penaguião, III CEIAC, c comandante Mário Gouveia, III CEIAC). Este último chega a descrever pormenorizadamente o sistema dc comunicações com a torre referindo a facilidade dc lai contacto, «basta carregar num botão situado no manche», pelo que sc não houve contacto era porque o piloto «estava inanimado» (cf. o dcpoimcnlo do comandante Mário Gouveia Homem, fl. 6103 da III CEIAC).
6." Sobrevivência das vítimas. — Existem testemunhos claros dc que o avião quando imobilizado cm posição dc ponic sobre as casas dc Cainaraic não registava quaisquer sinais dc vida a bordo do Cessna.
João Pereira Santana, morador do bairro dc Camarate, refere que «as pessoas pensavam que o avião caiu sem ninguém» c por isso «é que não houve tentativa dc salvamento» (cf. o dcpoimcnlo dc João Santana, fl. 254 do relatório da DGAC).
O faclo é coerente com a existência dc um incêndio a bordo c com o eslado dc inanimaçâo das vítimas.
O já referido perilo médico legal, Fernando Fonseca, foi explícito cm considerar que, cm sua opinião, o incêndio «deu-se antes da colisão», fundamcniando-sc cm que as vítimas não teriam atingido as percentagens de monóxido dc carbono encontradas no respectivo sangue sc o incêndio livesse consistido apenas num braseiro dc gasolina (cf. o dcpoimcnlo dc Fernando Fonseca, fls. 26 e 75 da III CEIAC).
7." Disposição relativa dos corpos das vítimas. — Resulta dos autos, c cm particular do depoimento do médico legisla, que não só efectuou as autópsias como acompanhou a própria remoção dos corpos das vítimas do local do sinistro, que estas, conquanto parcialmente queimadas, «quem as conhecesse era capa/, dc as identificar relativamente» (cf. o depoimento dc José Sombrcirciro, fls. 55, 181 c 186 da III CEIAC).
Pela observação directa constante dos autos relativamente a este aspecto (fl. 4091 do vol. D da 1 CEIAC), decorre que, ao remover os corpos das vítimas do solo após a combustão do aparelho c a extinção do incêndio, o corpo dc um dos pilotos sc encontrava cm posição supra-jacente, os passageiros a seguir c o outro piloto cm posição subjacente.
Pela análise comparativa dos outros documentos dos autos, não resultam quaisquer dúvidas sobre qual dos pilotos sc encontrava cm posição suprajacente (comandante Jorge Albuquerque) c qual dos pilotos sc enconuava cm posição subjacente relativamente à totalidade dos passageiros da aeronave (co-piloio Alfredo dc Sousa).
No mesmo sentido salicnui-sc, por exemplo, que o perito médico legal Fernando Fonseca declara (cf. fl. 121, 15 dc Abril dc 1986) que, «com respeito à proximidade ou afastamento do foco |...| sc [uma vítima] está mais perto, morre mais depressa c terá menos monóxido dc carbono».
Isto é, do ponto dc vista mcdico-lcgal, c possível determinar o momento relativo dc ocorrência da morte dc cada uma das vítimas, sendo que o diferente grau dc inalação dc fumos é suficientemente indiciário a este respeito, por virtude da paragem de respiração aquando da morte, c estes graus relativos podem cxirair-sc com suficiência da percentagem da carboxi-hemoglobina detectada cm cada uma das vítimas — o piloto Jorge Albuquerque tem a mais baixa destas laxas dc carboxi--hcmoglobina (40%) c o co-piloio Alfredo dc Sousa uma das mais alias (58%).
Pelo modo como o avião resvalou para o solo, o Çacvo é indiciário dc que o piloto c o co-piloio a bordo, a seguir a produ/.ir-sc a emergência, deixaram dc csiar no mesmo local da aeronave — cockpit — c o co-piloto sc encontraria na traseira da cabina no momento dos embales.
Por outro lado, o manipulo da porta do Cessna apresentava, segundo o processo c as observações feitas imediatamente após o sinistro, indícios dc haver sido mexido durante o voo. Aliás, o próprio NTSB c desta opinião ao afirmar no seu estudo que «lhe lowcr main door was found with its handlc jammed in a partially opcn position» (cf. o csiudo do NTSB, appendix D, fl. 4, parágrafo 5).