12 DE FEVEREIRO DE 1994
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A emissão de facturas falsas é o último expediente. Pelo meio ficam outras hipóteses, que não valerá a pena citar.
30 — Afirma-se que a aprovação comunitária, logo em Março/Abril de 1986, de uma quota portuguesa, em formação profissional de 30 milhões de contos justificava medidas drásticas e imediatas de acompanhamento e controlo. Não as ter tomado foi admitir antecipadamente abusos na utilização dos dinheiros públicos, através das fórmulas acima mencionadas, conhecidas da literatura especializada. Esta responsabilidade política deve ser assumida.
31 — Segundo depreendemos hoje, a intervenção do Ministro da tutela caracterizou-se em 1986 por querela com o director do DAFSE, Joaquim Pinto Coelho, sobre a competência desse organismo, e só em 1987 se caracterizou pela adopção de nova regulamentação, a qual (devido à forma de funcionamento do FSE) incidiria sobre as acções de 1988, a saldar em 1989.
32 — Comentemos em sequência a questão da estrutura e competências do DAFSE e a questão da legislação, ambas com forte impacte, não só nas acções desenvolvidas em 1986 e 1987 (que correspondem à fase mais desorganizada) como também nas acções desenvolvidas em 1988 e 1989 (fase mais organizada e controlada).
33 — À imagem do seu fundador e primeiro dirigente, aliás técnico reputado, o DAFSE era em 1986 uma típica equipa de staff de cerca de 20 pessoas, inorgânica, não hierarquizada, informal. Muita boa para negociar, im-preparada para controlos administrativos e contabilístico--financeiros de centenas de acções no valor de dezenas de milhões de contos.
34 — O Dr. Pinto Coelho queria reforçar o DAFSE. O Ministro preferia aproveitar a existência do IEFP, pelo menos para o acompanhamento técnico-pedagógico e para a implantação regional. Quanto ao controlo financeiro e contabilístico, independentemente de alguma intervenção do DAFSE, deveria pontificar a longa experiência da IGF (Inspecção-Geral de Finanças).
35 — A regulamentação de 1987 demonstra que o Ministro levou a melhor, mas tendo sido substituído no cargo, deixou a sua reforma para o sucessor. Quanto ao Dr. Pinto Coelho, ao que parece resignado a um modelo que não era o seu, também acabou por sair do DAFSE no final de 1987. Essa saída passou na altura despercebida do exterior.
36 — No entretanto desta querela de competências, as acções de formação profissional em 1986 e 1987 decorreram desacompanhadas. Hoje já sabemos que a quota portuguesa se fixou, mas à custa de um nível muito elevado de irregularidades (e alguns crimes). Ainda há processos pendentes e saldos por apurar e pagar.
37 — Em virtude de a equipa ministerial seguinte (Ministro Silva Peneda e Secretário de Estado Bagão Félix) ter optado por reforçar o DAFSE, que hoje conta com uma centena de funcionários só em Lisboa (o DAFSE anterior era regionalizado), poder-se-ia perguntar se o Dr. Pinto Coelho não foi ingloriamente substituído e só não foi um bode expiatório de responsabilidades alheias.
38 — Tê-lo-á sido, em parte. Mas hoje sabe-se mais. Em primeiro lugar, que a sua capacidade de organização burocrática tem limites, ou seja, o mero reforço do DAFSE em número de funcionários ou contratados não teria conduzido a uma melhoria significativa das novas tarefas de acompanhamento e controlo.
39 — Em segundo lugar, e mais grave, a sindicância ao DAFSE, a que só agora se teve acesso, indicia irregularidades manifestas do Dr. Pinto Coelho e de membros destaca-
dos da sua equipa, na sede e nas então delegações regionais do DAFSE.
40 — O início dessas irregularidades situa-se em 1985, no período de calma preparação dos projectos aprovados em 1986. As acusações são de compadrio, nepotismo, diálogo preferencial (ou quase exclusivo) com um número restrito de empresas de consultadoria agindo como intermediárias de formação profissional, consequentemente, fechamento do DAFSE a outras fórmulas alternativas de organização dos dossiers (o que levou muitas empresas a socorrer-se das ditas empresas consultoras), etc.
41 — Os factos indiciados são esses. Julgá-los compete a quem de direito. Não é aceitável afirmar que esse seria o preço a pagar em virtude de Portugal não estar institucionalmente preparado para a formação profissional, um preço da referida maximização da quota do FSE.
42 — Estes factos são importantes porque só agora são confirmados (envio do relatório de sindicância do DAFSE à Comissão Parlamentar de Inquérito), porque o Dr. Pinto Coelho surge em 1988 como director-geral do ISEFOC (Instituto de Formação Profissional da UGT) e porque algumas das empresas de consultadoria indiciadas por favorecimento se relacionam indirectamente com acções da UGT em 1988 e 1989.
43 — Quanto à legislação (decretos-leis, despachos normativos) saída em 1987, e depois em 1988, e também nos anos seguintes, pode dizer-se que c cada vez mais pormenorizada e sofisticada. Esta legislação é tida, aliás, como uma das mais estritas da empresa comunitária, o que abona em favor da conduta do Governo nesta área e da sua inequívoca vontade de corrigir os anómalos acontecimentos de 1986 e 1987.
44 — É de registar, porque nos parece estranha e porque interessa à valoração do caso UGT e de muitos outros ocorridos até hoje, que uma das únicas matérias que não foi até hoje objecto de despacho genérico (dirigido aos potenciais destinatários) é a questão dos limites dos chamados «lucros contabilísticos» de cada acção.
45 — Esse «lucro contabilístico» é afinal a remuneração consentida a cada interveniente da acção (para além do formador propriamente dito, cuja remuneração é tabelada), ou seja, o diferencial entre os custos que suporta e o preço que debita. A introdução de critérios de razoabilidade na apreciação dos dossiers de saldo é consequência desta lacuna, que nos parece dificilmente explicável, sobretudo em virtude dos inevitáveis litígios que tem ocasionado.
46 — Mas também a gestão da formação profissional a partir de 1988 (até à entrada em vigor do i.° QCA, 1990--1993), e que cobre mais directamente as acções da UGT motivadoras desta Comissão de Inquérito Parlamentar, não deixa de suscitar algumas perplexidades ao observador mais atento, e merece uma apreciação política.
47 — Um primeiro elemento a considerar é o balanceamento pendular no relacionamento a partir de 1988 dos novos responsáveis do DAFSE com as empresas de consultadoria e os agentes de formação que tinha sido preponderantes na fase conturbada imediatamente anterior, e que se tornaram num segundo fácil bode expiatório desta história.
48 — Onde antes parece ter havido favorecimento, vai desenvolver-se então uma quase sistemática perseguição, em nome do controlo e repressão das irregularidades que entretanto iam sendo detectadas.
49 — Dir-se-ia que politicamente não houve medida. Em vez de condicionar em limites estreitos a acção das