O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

30-(22)

II SÉRIE-B — NÚMERO 7

ANEXO

PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA GABINETE DO PROCURADOR-GERAL

Tenho a honra de enviar fotocópia da informação n.° 90/ 97, elaborada neste Gabinete, sobre o assunto em epígrafe e de levar ao conhecimento de V. Ex.a o despacho que, sobre o assunto, S. Ex.a o Conselheiro Procurador-Geral da República, em exercício, se dignou exarar;

Concordo.

Remeta ao Gabinete de S. Ex.a o Sr. Ministro da Justiça.

Lisboa, 23 de Outubro de 1997. —Dias Bravo. O Chefe do Gabinete, Ernesto António da Silva Maciel.

ANEXO Informação

1 — A Sr." Deputada Isabel Castro, do Partido Ecologista Os Verdes, dirigiu ao Ministério da Justiça o requerimento n.° 1067/VII (2.")-AC, de 11 de Junho de 1997, sobre «utilização de sistemas de vídeo na vigilância de cidadãos».

O requerimento respeita ao recurso a câmaras de vídeo em unidades hoteleiras, para, invocando razões de segurança, proceder à vigilância de cidadãos.

A utilização desses instrumentos com tal fim foi denunciada e demonstrada através de um programa de televisão.

Segundo a Sr." Deputada afirma no requerimento, a vigilância ocorre no total desconhecimento das pessoas observadas e «em espaço privado (o quarto), o que acentua a escandalosa violação dos direitos destes cidadãos, a devassa da sua privacidade e a ilegalidade contra si assim cometida».

S. Ex.a o Ministro da Justiça solicitou o envio da informação possível e relevante tendo em vista a preparação da resposta ao requerimento.

2 — Desconhece-se a que programa e estação televisiva se refere o requerimento da Sr.a Deputada, a natureza da demonstração que aí era feita dos factos denunciados e o grau de identificação e concretização destes.

Na Procuradoria-Geral da República não consta qualquer outro expediente sobre esta matéria e não há igualmente nota da pendência, nos tribunais, de processos que, directa ou indirectamente, se mostrem relacionados com a vigilância de cidadãos em espaços privados.

Tentaremos proceder ao enquadramento jurídico da questão, em breves traços, esperando que da nota resultante surta alguma utilidade para o.fim pretendido.

3.1 —O direito à reserva da intimidade da vida privada • e familiar é um direito fundamental consagrado no artigo 26.° do texto constitucional.

Trata-se de um direito complexo, que compreende «o . direito a impedir o acesso de estranhos a informações sobre a vida privada e familiar e o direito a que ninguém divulgue as informações que tenha sobre a vida privada e familiar de outrem» (J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3° ed.. revista, Coimbra Editora, p. 181).

A delimitação da esfera privada e familiar que merece a protecção da intimidade tem tido inúmeros contributos

doutrinais e jurisprudenciais, quer no que se refere à nossa ordem jurídica quer ao direito estrangeiro.

Alguns autores descreveram a vida privada como retiro

voluntário e temporal do indivíduo, da busca de solidão ou

da intimidade de um pequeno grupo, ou da situação de reserva ou de anonimato dentro de grupos mais vastos.

Outros definiram direito de reserva, como a pretensão do indivíduo de ver impedida a curiosidade de outros, proibindo-se a indiscrição e a publicidade não querida, o conhecimento e a divulgação das vicissitudes pessoais e familiares.

Mais correntemente, entende-se o direito à privacidade como o direito a ser deixado só, a ser deixado em paz, à não submissão injustificada à consideração pública.

As várias definições de vida privada, de privacidade ou de intimidade fazem, em regra, apelo a um elemento objectivo — o tipo de actos em causa; a um elemento subjectivo — a vontade do indivíduo, o seu consentimento; a um elemento espacial — a área em que os actos são praticados, em que o indivíduo se encontra.

De um modo geral, atende-se, na delimitação entre privado e público, à postura psicológica diversa que as pessoas adoptam por se encontrarem em família ou entre amigos, ou por estarem num espaço reservado, e faz-se notar que o grupo restrito ou o espaço físico íntimo são eleitos pelo indivíduo para o desenvolvimento da sua vida não pública.

O domicílio e a respectiva inviolabilidade têm também protecção constitucional, no artigo 34.°, n.0* 1, 2 e 3; trata-se de um dos direitos fundamentais que funcionam como garantias do direito à reserva da intimidade da vida privada e familiar.

O domicílio surge como uma projecção da pessoa, o local por excelência em que se realiza a dimensão da sua vida, em que se concretiza a sua intimidade.

3.2 — O legislador penal, no desenvolvimento do imperativo constitucional do n.° 2 do artigo 26° da Constituição da República Portuguesa julgou merecedores de tutela a vida privada e o domicílio, enquanto bem pessoal, àquela associado — a violação do domicílio e a devassa da vida privada encontram-se tipificados como crimes nos artigos 190.0 e 192.° do Código Penal.

O artigo 192.° define o crime de devassa da vida privada nos seguintes termos:

1 — Quem, sem consentimento e com intenção de devassar a vida privada das pessoas, designadamente a intimidade dá vida familiar ou sexual:

a) Interceptar, gravar, registar, utilizar, transmitir ou divulgar conversa ou comunicação telefónica;

b) Captar, fotografar, filmar, registar ou divulgar imagem das pessoas ou de objectos ou espaços íntimos;

c) Observar ou escutar às ocultas pessoas que se encontrem em lugar privado; ou

d) Divulgar factos relativos à vida privada ou a doença grave de outra pessoa.

O n.°2 do mesmo artigo exclui a punibilidade quando o facto «for praticado como meio adequado para realizar um interesse público legítimo e relevante».

O «espaço íntimo», o «lugar privado», há-de incluir, desde logo, a habitação mas também qualquer espaço em que o indivíduo tenha haveres pessoais, pernoite, se recolha nas horas de lazer, em que lhe seja possível, legitimamente, vedar o acesso a outrem.

Assim, espaço íntimo, lugar privado, será. indubitavelmente, a casa de habitação, mas também a zona habitada pelo hóspede, a tenda de campismo, a cabina do transa-