10 DE MAIO DE 1999
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O contrato prometido nunca chegou, porém, a realizar-se.
Primeiro, porque a realização do negocio prometido ficou dependente do levantamento de uma penhora do Autódromo que havia sido decretada pelo Tribunal Judicial de Cascais no âmbito de uma acção executiva para prestação de facto contra a AUTODRIL. Havendo um recurso pendente desse processo, o contrato prometido não se concretizou.
Depois, porque em Novembro de 1992 a Cámara Municipal de Cascais aprovou os estudos de localização para a construção de um complexo turístico-desportivo no Autódromo. E esse facto levou a AUTODRIL a reclamar do preço fixado no contrato-promessa para a venda do Autódromo.
Em reunião realizada em 5 de Março de 1993 entre a administração da AUTODRIL e o Secretário de Estado do Tesouro, foi manifestada por ambas as partes a intenção de dar cumprimento ao contrato-promessa de 1991, embora a AUTODRIL considerasse incorrecto o valor atribuído aos terrenos circundantes do Autódromo, por não corresponder a qualquer retorno do capital investido, o que só seria possível se fosse aprovado o complexo turístico-desportivo concebido desde o início para o conjunto, de que o Autódromo era apenas urna parte. Assim, a AUTODRIL considerava que a venda do Autódromo se encontrava ligada à aprovação por parte do Estado dos empreendimentos turísticos projectados para os terrenos circundantes, pelo que não se afigurava justa a celebração do contrato prometido, caso não tivesse lugar aquela aprovação.
Na aludida reunião, o Secretário de Estado do Tesouro esclareceu que o objectivo do Estado não era adquirir o Autódromo, mas sim encontrar urna forma de eficazmente garantir a realização nas suas instalações do Grande Prémio de Fórmula 1 e de outras provas desportivas de interesse público. O que, segundo a administração da AUTODRIL, não estava em causa, dado que, por força de protocolos celebrados com a Câmara Municipal de Cascais e com o ACP em 1984, o Autódromo vinha sendo cedido gratuitamente para o efeito há 9 anos e continuaria a sê-lo por mais 16.
Nessa ocasião, o Secretário de Estado do Tesouro recordou a necessidade de, caso se viesse a aceitar a não celebração do contrato de compra e venda prometido, se encontrassem meios, de preferência através de acordo, que permitissem ao Estado a recuperação dos seus créditos sobre as empresas do grupo Grão-Pará. Caso esse acordo con-. sistisse em troca de activos, o Secretário de Estado afirmou a vontade do Governo de proceder a todas as avaliações necessárias, incluindo a reavaliação do Autódromo, para se encontrar um valor justo. Os representantes da AUTODRIL referiram a existência de outros bens para além de Autódromo através dos quais o Estado poderia satisfazer os seus créditos. Designadamente, declararam que vinham oferecendo, desde 1982, bens dos patrimónios das suas empresas turísticas, que eram, aliás, as alegadas devedoras ao Estado, estando a sua responsabilidade em discussão nos tribunais competentes.
Em 26 de Março de 1993, o Estado indicou como perito avaliador do autódromo o engenheiro Alcides Pericão e Galo, que o avaliou em 4 309 390 contos. Por seu turno, o engenheiro Carlos Alberto Simões Rodrigues, perito nomeado pela AUTODRIL, avaliou-o em 14 130000 contos.
O contrato-promessa nunca viria a ser cumprido, tendo o Grupo Grão-Pará intentado em 20 de Março de 1993 uma acção judicial contra o Estado, visando a fixação judicial do preço do Autódromo, com vista ao cumprimento desse mesmo contrato.
Em 9 de Setembro de 1993, um despacho do Subsecretário de Estado Adjunto da Secretaria de Estado Adjunta e do Orçamento, determinou que fosse acelerada a cobrança das dívidas do Grupo Grão-Pará ao Estado e que fossem
apurados os significativos atrasos nos processos executivos que lhe diziam respeito.
Nesta situação se chegou ao acordo global.
Autorização para a realização de obras no Autódromo
As obras a realizar no Autódromo, tendo, designadamente, em vista a realização de grandes prémios de fórmula 1, constituem uma questão que tem estado subjacente a todas as tentativas encetadas pelo Estado na presente década para pôr termo ao contencioso com o Grupo Grão-Pará.
A autorização da AUTODRIL para a realização de grandes prémios de fórmula 1 no Autódromo do Estoril decorreu do já referido protocolo de 1984, celebrado entre aquela empresa e a Câmara Municipal de Cascais, pelo qual a autarquia obteve a autorização para utilizar as instalações do Autódromo quatro vezes por ano, durante 25 anos (de 1984 a 2009). A cedência foi a título gratuito, correndo os encargos com as respectivas organizações por conta da Câmara Municipal, ou das entidades suas delegadas, para quem reverterão igualmente as receitas arrecadadas.
É, porém, do conhecimento geral que a relação entre o Estado e a AUTODRIL quanto à utilização e à realização de obras no Autódromo nem sempre foi pacífica, pelo que a concretização de uma solução que permitisse a utilização deste equipamento para a realização dos grandes prémios de fórmula 1 ao abrigo de quaisquer vicissitudes relacionadas com o Grupo Grão-Pará foi um objectivo visado pelos vários governos. Apenas o actual governo pretendeu também alcançar uma solução que lograsse assegurar esse resultado.
Foi assim com o contrato-promessa assinado em 1991, que consistia na cessão de créditos do Estado sobre as empresas do Grupo Grão-Pará em troca da propriedade do Autódromo, considerado como o único complexo desportivo com aptidão para a realização de provas desportivas motorizadas, nacionais e internacionais de alta competição, incluindo o Grande Prémio de Portugal de Fórmula 1.
Também na reunião acima referida realizada em Março de 1993 entre a administração do grupo Grão-Pará e o Secretário de Estado do Tesouro, acerca do cumprimento do contrato-promessa de 1991, resulta claro o objectivo do Estado de «encontrar uma forma de eficazmente garantir a realização nas suas [do Autódromo] instalações do Grande Prémio de Fórmula 1 e de outras provas desportivas de. interesse público».
Também no que se refere ao acordo global em análise, resulta evidente o nexo de causalidade entre a tentativa de resolver o problema da fórmula 1 e a data da sua celebração.
O Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros referiu à Comissão que o acordo «não foi feito apenas para a realização da fórmula 1, mas também para resolver o problema do aeroporto, das expropriações, do hotel, dos processo judiciais, das dívidas ao Fisco e da fórmula 1 também», admitindo que o acordo veio a realizar-se em Julho de 1997, e não em Setembro ou Outubro, devido a um «forcing final» para que o acordo estivesse pronto a tempo de ainda se tentar fazer ò Grande Prémio.
Note-se, porém, que, em cartas enviadas à AUTODRIL em 9 e 12 de Janeiro de 1998 (assunto a que se voltava adiante), o Secretário de Estado do Turismo considerou a conclusão das obras no Autódromo a tempo para a fórmula 1 como «pressuposto que esteve na origem da celebração do acordo global pelo Estado» e «determinante» da sua celebração «e dos actos e contratos que se lhe seguiram».
De facto, através do acordo global, a AUTODRIL autorizou o Estado a, até 31 de Dezembro de 1997, realizar as obras que considerasse necessárias à valorização do Autódromo no âmbito da sua adequação aos níveis de exigência