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7 DE DEZEMBRO DE 1988

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Creio que quem ler esta acta ou quem assistir a este debate ficará inevitavelmente com uma interrogação angustiante no espírito. O rol de realizações exibido pelo Sr. Ministro, ponto por ponto, apresenta-se com um tom de tal forma risonho, optimista, portador de algum orgulho accionista, isto é, orgulho na acção, que as pessoas ficarão sem perceber verdadeiramente por que é que o mundo judicial está em convulsão. São todos eles absolutamente falhos de mérito e inteiramente insensatos e V. Ex.a está cheio de sensatez e de realizações, ou é o contrário? Temos para nós que é o contrário.

Este não será seguramente o ano de entrada dos envelopes com janela nos tribunais, como marca histórica. O que vai marcar este ano é seguramente o facto de haver um movimento grevista com a dimensão que este tem, pelas razões que são do conhecimento de todos, incluindo do Ministério. É um facto! Este não será o ano das 503 máquinas de escrever nos tribunais — elas são bem vindas, e até são necessárias em maior número, novas e adequadas, e também que se soubesse mexer nelas, etc. —, será, sim, o ano em que o Ministério da Justiça, depois de ter andado a fazer negociações, fez promessas todos os meses que no mês seguinte adiava, em que prometeu aos trabalhadores judiciais, designadamente no quadro de uma negociação que depois foi rompida e na qual eles estavam com boa-fé, determinadas coisas que posteriormente de forma alguma concedeu e em que o Ministério da Justiça foi confrontado com a rejeição da sua política. Isto marcará o ano em causa, e não seguramente a introdução de 103 fotocopiadoras, que são benvindas e que certamente fazem falta. Pena é que de vez em quando não haja as tomadas eléctricas necessárias, que os tribunais caiam aos bocados e a fotocopiadora, coitada, possa ter uma telha em cima! Esse é o problema com que estamos confrontados.

Creio que a análise que o Sr. Ministro fez decorre daquilo que é a marca actual da politica do Ministério. O Ministro da Justiça corre atrás da sombra de Fontes Pereira de Melo, no mínimo, e nestas corridas atrás da sombra de Fontes ficam de lado as pessoas e designadamente outra ou outras das componentes da política do Ministério, que obviamente não vêm roladas na lista que o Sr. Ministro aqui nos trouxe.

Na lista trazida pelo Sr. Ministro não vem obviamente a menção ao impacte das custas judiciais no acesso à justiça. Não pode vir porque isso estragaria a pintura! Em Portugal, este ano foram dados passos para trás no acesso ao direito. E o aumento das custas, que foi rejeitado pelas classes profissionais que estão ligadas ao mundo judicial e seguramente pelos cidadãos, está aí como facto marcante deste ano. É isto que marca este ano e que está a ameaçar marcar o próximo ano.

Este também é o ano primeiro da vigência do Código de Processo Penal e acerca disso o Sr. Ministro não disse nada, prudentemente, porque sabe tão bem como nós que o primeiro ano de aplicação daquele código é um pandemônio, ou seja, os requisitos da lei não foram cumpridos, a formação dos magistrados não se fez, etc. A compra de um edificiozinho para os ma-

gistrados do Ministério Público na Polícia Judiciária lá se fez, mas quem é que ousa hoje verdadeiramente dizer que o Ministério Público controla os processos entrados na PJ? Suponho que ninguém! É uma ficção!

O quadro do Ministério Público é o que se sabe. Os serviços vivem de esmolas dos judiciais. Aliás, alertamos para o seguinte: os orçamentos dos tribunais não foram apresentados ao Gabinete da Gestão Financeira e não há circular para o cumprimento do Decreto-Lei n.° 112/88. Entre outras coisas, as secretarias do Ministério Público não vão poder funcionar, como é óbvio nesse caso, por duodécimos em 1989 e, portanto, vão estar sujeitas a viver de esmolas se o Governo não tomar alguma medida durante este período.

Além disso, continua a haver atrasos clamorosos no processamento de tudo o que diz respeito aos ajustamentos dos tribunais e situações caricatas de juízes a terem de pagar do seu bolso os dinheiros para fazer expedições postais e notificações, o que é inteiramente inaceitável!

Por outro lado, em relação às regras para garantir a boa aplicação do Código de Processo Penal, o que é difícil dada a sua natureza, devo sublinhar que a situação existente é francamente alarmante. Estamos em quadro de pré-policialização e instrução preparatória, se é que já não estamos no coração dessa policializa-ção em Portugal.

O Sr. Ministro não falou disto, tal como não falou das consequências da aprovação da nova Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais, porque ai o Governo fez aprovar, na Assembleia da República, o lançamento de encargos para cima das autarquias locais e optou pela distância das populações em relação aos tribunais.

Quando o Sr. Ministro fala com satisfação da existência futura de serviços de atendimento ao público nas sedes dos círculos judiciais, está a dar, de forma sorridente, o quadro daquilo que é grave e bastante triste para as populações: é que entre os círculos e as populações há distâncias inaceitáveis e, portanto, as populações que chegarem aos respectivos círculos serão os sobreviventes da caminhada. Isto é, aquilo que se criou com esse mecanismo é uma maior distância para o atendimento, e não um atendimento mais próximo.

Obviamente que isto não vem no discurso e nas grinaldas da política propagandística do Ministério. Não vale a pena estarmos a analisar sector a sector, mas seria útil que nos pudesse explicar, por omissões particularmente chocantes, que em matéria prisional o Sr. Ministro diga «Finalmente Caxias»!». Bom, Sr. Ministro, «finalmente Caxias», dizemos nós, porque bem nos batemos, designadamente na 1.a Comissão, para que «finalmente Caxias». Mas a questão é que também nos batemos para que finalmente Monsanto e neste caso nada! E, assim, o inferno de Monsanto, que neste momento, para quem lá esteja empilhado, é o frigorífico de Monsanto, continua. E creio que hoje, nesta sala, que é razoavelmente fria, saberemos todos que não é tão fria como o inferno de Monsanto.

Penso que isto exigiria medidas urgentes que continuam por adoptar. Prisões não se constroem sem milhões: esta é a triste realidade, isto é sabido. Mas no caso concreto do sistema prisional português, velho, velhíssimo, e a pergunta do Sr. Ministro, ou o lembrete, a memória, é correcta — digam-nos à quantos anos é que se construiu a última prisão — e revela que o sistema está podre, decadente e cheio de pessoas. Ora,