O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

7 DE DEZEMBRO DE 1988

213

O Sr. Presidente: — Muito bem, Sr.a Secretária de Estado.

Solicito, pois, aos Srs. Deputados que queiram intervir sobre o orçamento da Secretaria de Estado da Cultura o favor de se inscreverem.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Estava, de facto, a congratular-me com a possibilidade de outrem antes de mim intervir interpelando a Sr." Secretária de Estado, mas é com o mesmo gosto que inicio eu algumas observações em torno do orçamento da Secretaria de Estado da Cultura.

Tivemos oportunidade, em sede do debate na generalidade, de apreciar algumas das linhas motoras da política de cultura do Governo e da tradução que elas encontravam através da inscritibilidade de verbas no Orçamento do Estado, ou que, do nosso ponto de vista, não encontravam, como oportunamente tive também oportunidade de provar. Nesse debate, pudemos aclarar algumas obscenidades, que agora não recolocaria dada a exiguidade do tempo de que dispomos. De todo o modo, uma primeira nota importa sublinhar: a de que a consulta dos documentos que nos foram enviados pela Secretaria de Estado da Cultura não nos habilita, com muita facilidade, a um cotejo de rubricas e capítulos, dadas as novas inserções orgânicas, que dificultam uma leitura transversal e organizada do Orçamento.

Por outro lado, apesar de, intensamente, ter pedido nessa reunião que me fossem remetidos dados adicionais que pudessem fornecer alguma comparatividade, a verdade é que os não recebi. Foram, apenas, endereçadas à subcomissão algumas indicações sobre os projectos de cinema, mas nenhum desgarramento sectorial no interior da Secretaria de Estado da Cultura chegou às mãos dos Srs. Deputados e, portanto, não chegou também às minhas mãos o que, obviamente, lastimo, e esta é uma afirmação que gostaria de fazer desde já.

Assim sendo, a sindicabilidade parlamentar do Orçamento fica magnamente reduzida, ou seja, vemo-nos na contigência de referir apenas grandes rubricas e grandes regras, sem podermos talhar ao pormenor determinados aspectos pontuais de política.

A Sr.B Secretária de Estado da Cultura compreenderá que sem ter, por exemplo, um PIDDAC desenvolvido e onde estejam arrolados todos os projectos — os antigos, os que transitam, os que são novos —, não estaremos habilitados a um debate sério e qualificado do que é a actuação governamental nesta matéria. Não foram enviados, e sem eles não é possível proceder a um debate minimamente organizado. Por exemplo, ficamos sem saber se determinadas obras que vigoravam no PIDDAC do ano anterior, com carácter plurianual, mantêm essa plurianualidade, qual foi o grau de execução orçamental e do PIDDAC, que tipo de projectos transitou, que novos projectos foram incorporados.

Suponho que no escassíssimo tempo de que a Sr.a Secretária de Estado dispõe, uma vez que, tanto quanto julgo saber, teremos pouco mais de meia hora para nos confrontarmos nesta Sala, através dos nossos pontos de vista, não chegaremos de facto a gran-

des conclusões. Isto não me parece muito saudável e gostaria que a acta, com todo rigor, averbasse esta declaração peremptória, segundo a qual, assim, não se faz um debate do Orçamento do Estado.

Passando a outras questões, gostaria de, uma vez mais, colocar sobre a Mesa a consideração de alguns aspectos que se me afiguram essenciais.

É claro que a expressão orçamental que as políticas da cultura vêm encontrando no Orçamento pode por nós ser considerada suficiente ou insuficiente, tanto em função da audácia e do arrojo dos projectos que nós próprios entendemos ser necessários como em função de uma áurea mediocritas, que me parece ser aquela que tem, de alguma forma, gerido a Secretaria de Estado da Cultura.

Encontramos em áreas nevrálgicas verbas que, de forma muito clara, nos parecem insuficientes, áreas essas onde se imporia uma acção muito mais vigorosa, sejam elas as que têm a ver com a propagação da cultura portuguesa, no Mundo, e particularmente nos países africanos de expressão portuguesa, sejam as que têm a ver com o incremento da criatividade aos mais variados níveis, através dos apoios estaduais, e do plano dos chamados negócios correntes da Secretaria de Estado defrontamo-nos com a mera continuidade de uma gestão da precariedade, da penúria e da insuficiência. Ou seja, num período em que o cinema português ganha foros de qualidade aquém e além-fromeiras, em que a ficção narrativa e a poesia portuguesa se expandem pelo Mundo fora e em que há sinais de avidez pelo conhecimento do que produzimos, em que a nossa produção dramatúrgica parece, de alguma forma, também ressurgir após períodos de dificuldade, em que a actividade teatral se vem afirmando pela qualidade que é possível apludir irreticentemente através de vários grupos autónomos e independentes ou do Teatro Nacional, num período destes, aquilo a que assistimos não é ao fomento, ao incremento das acções que vêm merecendo esta aceitação, mas sim, bem pelo contrário, à manutenção de uma mesma política de horizontes bastante pardos e fechados.

Estive recentemente em França, integrando uma delegação de escritores, e foi com extrema pena, com extrema lástima, que pude constatar como de facto as coisas são diferentes no tratamento dos problemas reais por parte do nosso País e de outros países. Por exemplo, os escritores espanhóis encontravam-se, de uma forma geral, traduzidos a expensas da Secretaria de Estado da Cultura de Espanha, tanto os que ganharam como os que não ganharam prémios, enquanto que os escritores portugueses não se encontravam traduzidos e alguns deles viram mesmo projectos de tradução recusados pelas entidades oficiais. Obviamente, assim não se promove a cultura portuguesa em parte alguma. Assim, a discutir, na base dos critérios mínimos, aspectos de natureza essencial, não chegaremos a parte alguma. A propagação da literatura portuguesa em França continua a fazer-se, na grande parte dos casos, mercê de iniciativas individuais, altamente louváveis, mas de costas claramente voltadas para aquilo que é a acção do Estado.

O Instituto Português do Livro e da Leitura tem feito alguma coisa no sentido de apoiar um ou outro escritor — não vou agora definir aqui quais são os meus pontos de vista nem interrogar-me sobre os critérios que têm presidido a esse tipo de actuação —, o certo é que