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II SÉRIE -C — NÚMERO 17
ao Tribunal Constitucional não restaria mais que, verificada a inconstitucionalidade, dar disso conhecimento ao órgão legislativo competente.
Ora, o objectivo desta petição é exactamente o de solicitar à Assembleia da República que adopte as medidas legislativas adequadas à correcção das invalidades jurídicas e dos inconvenientes políticos que assinalámos ao actual estatuto da freguesia, dado que, nos termos do artigo 164.°, alínea í/), da CRP, a Assembleia da República é competente para legislar sobre as matérias em causa dispondo mesmo antes nestes domínios, por força dos artigos 167." alínea 0, e 168.°, alíneas s) e u), da CRP. de reserva absoluta e relativa de competência legislativa.
Além do mais, numa altura em que a Assembleia da República aprovou as medidas legislativas conducentes à criação das regiões administrativas, é esta a altura adequada para a necessária redefinição do estatuto das autarquias locais e da sua articulação, na medida em que a regionalização implica sempre uma redistribuição de competências e tarefas.
Assim, com base nos fundamentos expostos, pretendem os signatários que a Assembleia da República tome as medidas legislativas adequadas a conferir globalmente ao estatuto da freguesia o conteúdo, sentido e alcance propostos nesta petição e, especialmente nos domínios das atribuições e competências, finanças levais, estatuto dos eleitos locais, sedes e associações de freguesias, a proceder ã alteração da legislação vigente ou a legislar com o sentido proposto nesta petição e que a seguir se sintetiza.
4.1 — Uma vez que a natureza geral dos seus fins e a inevitável sobreposição dos elementos territorial e humano entre freguesia e município podem justificar ou até aconselhar a actual opção legislativa de fixação geral e indiscriminada das mesmas atribuições a todas as autarquias locais (artigo 2.ü, n.° 1, do Decreto-Lei n.u 100/84, de 29 de Março), a solução terá de ser essencialmente procurada não numa pouco proveitosa tentativa de distinção de «matérias locais» próprias da freguesia ou próprias do município mas na garantia da capacidade de desenvolver as tarefas autárquicas por parte das freguesias, numa base de complementaridade e autonomia relativamente aos municípios, concretizável sobretudo ao nível da reformulação global da delimitação de actuações da administração central e local em matéria de investimentos públicos e das competências dos órgãos das autarquias locais.
Hoje. mais de 15 anos decorridos sobre a institucionalização do poder local em regime democrático, é possível recolher de inúmeras experiências todo um amplo leque de tarefas próprias, de exercício obrigatório ou facultativo, que as freguesias podem e devem realizar com proveito imediato para a prossecução dos interesses das populações respectivas, seja de forma exclusiva seja em concorrência com o município.
Assim, tendo necessariamente que atender á diversificação de soluções exigida pela multiplicidade de condições próprias da existência de freguesias rurais e freguesias em núcleos de forte concentração e expansão urbana freguesias situadas nas sedes dos municípios, freguesias das grandes cidades e freguesias com a categoria de vilas, é possível enumerar um vasto conjunto de domínios onde aos órgãos das freguesias deveria ser facultada a possibilidade legal de actuação, como sejam: reparação e conservação de ruas, passeios e camiiihos; recolha e depósito de lixos; conservação da rede de esgotos; abastecimento de água; criação, conservação e gestão de parques e jardins; solicitação de expropriações por utilidade pública; habitação social e centros de apoio a idosos e crianças.-, reparação e conservação de escolas primárias e pré-
-primárias, construção, conservação e gestão de balneários, sanitários e lavadouros: construção, conservação e gestão de parques e recintos desportivos; licenciamento de actividades publicitárias, de certo tipo de obras e de ocupação da via pública; regulamentação do trânsito e colocação e conservação de sinais de trânsito; passagem de licenças de canídeos, bicicletas e veículos de tracção animal; toponímia.
Sendo que praticamente todas estas funções vêm já a ser prosseguidas pontualmente por algumas freguesias no quadro da delegação de competências que a lei faculta aos municípios, mas com as limitações, inconvenientes e desvantagens inerentes á dependência administrativa e financeira e à precariedade próprias desse instituto, haverá agora que institucionalizar estas funções como tarefas e competências próprias das freguesias, permitindo-lhes, assim, converterem-se em agentes autónomos e com capacidade efectiva de promoção do desenvolvimento das comunidades locais.
4.2 — Para tanto, e para além das alterações legais nos domínios das competências dos órgãos das freguesias e dos investimentos públicos, haverá que dotar permanentemente as freguesias da capacidade tiainceira, técnica e humana capaz de suportar o acréscimo de responsabilidade que se pretende que assumam.
Tal passa, em primeiro lugar, pela profunda alteração do regime das finanças locais no respeitante às freguesias e, especialmente, pela adopção das seguintes medidas: a afectação directa das transferências do Fundo de Equilíbrio Financeiro às próprias freguesias, como reflexo, no domínio financeiro, da autonomia da freguesia enquanto categoria autónoma de autarquia local; o aumento significativo da parte que ora lhes cabe nessas transferências, como forma de garantir uma justa repartição dos recursos públicos, adequando as receitas às novas necessidades de financiamento do investimento, e não apenas, como agora acontece, a um limite mínimo que assegura o mero funcionamento burocrático; a previsão da proveniência de uma parte substancial das receitas da freguesia da cobrança de impostos locais, como forma de alcançar uma progressiva autonomia financeira da freguesia relativamente ao Estado e às autarquias de grau superior, de adequar as receitas às necessidades reais de financiamento e de responsabilizar directamente a autarquia pelos resultados do esforço financeiro exigido ao contribuinte (pelo menos, o regime das finanças locais deve garantir uma participação gradual no produto da cobrança dos impostos locais da respectiva área, mormente os que são facilmente determináveis e estão directamente relacionados com os serviços prestados pela freguesia, como a sisa e a contribuição autárquica); o restabelecimento, pelas mesmas razões, da faculdade de as freguesias poderem lançar derramas ou participar no produto das derramas lançadas pelo município: a transferência para as freguesias, no mínimo de forma parcial, das receitas provenientes das taxas de publicidade e respectivo licenciamento.
4.3 — No domínio do estatuto do eleito local, e com incidência directa na racionalização do funcionamento das freguesias e aproveitamento dos seus recursos humanos, permanece em aberto a necessidade de consagração de um regime de permanência que não exclua, como agota acontece, os autarcas das freguesias, permitindo aos órgãos da freguesia a possibilidade de colocarem eleitos locais a desempenhar funções a tempo inteiro ou parcial.
Por outro lado, o estabelecimento de uma remuneração ou compensação financeira digna para os eleitos da freguesia, como base mínima de dignificação da função e disponi-