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II SÉRIE-C— NÚMERO 31
O Sr. Carlos Duarte (PSD): — O meu pedido de esclarecimento prende-se com uma afirmação tecida pelo Sr. Deputado António Campos relacionada com o despacho emitido pelo Ministério da Agricultura sobre esta matéria.
Existe um conjunto de despachos, emitido em 1990, antes da ocorrência de qualquer caso suspeito, que constitui a transcrição para o quadro jurídico nacional de algumas directivas da Comunidade para além de algumas precauções preventivas que o Estado Português queria ver acauteladas...
O Sr. António Campos (PS): — Isso foi no dia 28 de Maio de 1990.
O Sr. Carlos Duarte (PSD): — No dia 28 de Maio de 1990, o Sr. Ministro da Agricultura assinou um despacho em que diz, nomeadamente: «Considerando que deve ser acautelada a saúde pública e tomadas determinadas precauções, devem ser adoptadas algumas medidas suplementares relativas a determinados tecidos e órgãos.» O n.° 4 do mesmo despacho, referente à polémica aqui introduzida por algumas pessoas, diz o seguinte: «Todos os animais da espécie bovina que, por observação clínica ou por ocasião de inspecção ante mortem, apresentem sintomas clínicos que levem a suspeitar da encefalopatia espongiforme bovina devem ser abatidos separadamente e o seu cérebro submetido a um exame histopatológico para pesquisa de encefalopatia espongiforme bovina. Caso se confirme a presença da citada encefalopatia, as carcaças e as miudezas dos animais atingidos devem ser destruídas.»
Tendo em conta este despacho que acabei de ler, pergunto ao Sr. Doutor se entende que ele define o tipo de exame,a fazer ou se define o conjunto de precauções a assumir por parte da Administração, por forma a ser acautelada a saúde pública, uma vez que determina a destruição das carcaças dos animais suspeitos, devendo ser recuperados os órgãos ou tecidos para exame histopatológico, sem prejuízo de outros exames que, eventualmente, a comunidade científica e técnica entenda como necessários e que não são definidos pelo poder político.
A segunda pergunta é no sentido de saber se o Sr. Doutor reconhece capacidade científica e técnica ao Sr. Prof. Manuel Lage, investigador-coordenador do Laboratório Nacional de Investigação Veterinária, ao Sr. Prof. Braço Forte Júnior, ao Sr. Prof. Dias Correia e a um conjunto de cientistas que vieram depor nesta audição parlamentar, tendo questionado a necessidade de utilização de outros meios auxiliares e complementares de diagnóstico que confirmassem ou não a doença, após o exame histopatológico ter sido feito pelo Laboratório.
O Sr. Presidente (Antunes da Silva): — Não há mais inscrições, pelo que tem a palavra o Sr. Dr. Azevedo Ramos, para responder.
O Sr. Dr. Azevedo Ramos (Investigador do Laboratório Nacional de Investigação Veterinária): — Sr. Deputado Carlos Duarte, pôs a questão de o Sr. Prof. Dias Correia ter colocado a possibilidade de se utilizarem outros meios auxiliares de diagnóstico. Ora, é evidente que eles existem — ninguém deve negá-lo — mas é para contribuir para o esclarecimento de casos duvidosos.
Os outros exames complementares podem ser: as alterações electroquímicas na urina, os métodos de imunofluorescência, a pesquisa das scfapie-associated fibrils, os métodos de immunobtotting, os de westemblotting, a imu-nocitoquímica dos astrócitos e até a inoculação inter cerebral
de ratinhos. Estes são vários métodos que existem para confirmar casos duvidosos ou até mesmo no caso de animais que tenham um quadro clínico típico de BSE e cujo exame histopatológico não revele lesões. Nestas circunstâncias, podem e devem ser utilizadas estas provas, o que não foi o caso.
Seguidamente, o Sr. Deputado colocou a questão de saber se havia limitação pela DGP (Direcção-Geral da Pecuária) relativamente ao LNTV (Laboratório Nacional de Investigação Veterinária) para a utilização de outros métodos complementares ou se- o LNTV considerou que o exame histopatológico era definitivo, dado que seriam essenciais outros métodos complementares.
Ora, é evidente que, mercê da formação que adquiri no Reino Unido bem como da literatura que trouxe comigo, quer seja da Comunidade, quer seja da CEE, quer mesmo de
outros Estados que não fazem parte da CEE, como é o caso
dos Estados Unidos da América, posso responder-lhe que não são essenciais outros métodos complementares. Como disse na minha intervenção inicial, o exame histopatológico é suficiente desde que as lesões sejam evidentes, nos locais adequados, e que não mereçam dúvidas. É que estas lesões não aparecem ad hoc em qualquer área do sistema nervoso centra) mas sim numa fracção do bolbo raquidiano,, numa porção chamada «obex», essencialmente em três áreas muito importantes: no trajecto do solitário, no trajecto do trigémeo e nos núcleos do solitário e do vago dorsal. As lesões também aparecem noutras áreas, mas é nestas pequenas fracções daquela porção anatómica que é típico. Como se diz no citado livro da OIE, são patognomónicos, o que significa que define, que não merece dúvidas.
Puseram-mè também o caso do primeiro animal que foi abatido no matadouro de Chaves, com um tiro na cabeça, que só terá chegado ao Laboratório cinco dias depois e que, portanto, terá sofrido processos de autólise, o que poderá ter prejudicado as operações. Ora, a questão não é bem essa.
É evidente que, mercê do animal que foi tratado em Chaves e que foi seguido pelo clínico durante vários dias, tornava-se desumana a sua sobrevivência. Na verdade, os animais têm uma alteração de comportamento, mercê de o sistema nervoso ter alterações neurológicas profundas, cujas lesões, conforme se vão agravando, vão criando sofrimento bastante desumano - desculpem repetir o termo mas é mesmo este: sofrimento desumano - e, neste caso, foi decidido pelos responsáveis regionais de sanidade veterinária fazer o abate no matadouro de Chaves para impedir que o animal continuasse a sofrer, dado que estava numa fase de automu-tilação. Devo dizer que um dos quadros clínicos da doença é o do animal automutilar-se, deitado, fazendo chagas de decúbito, etc, podendo, depois, dar origem a outros processos infecciosos, através da «porta de entrada» de feridas que façam entretanto.
O animal foi abatido no dia 22 de Junho de 1990, no matadouro de Chaves, e chegou ao Laboratório do Porto no dia 27 de Junho, tendo passado, portanto, os tais cinco dias. Só que também tenho de esclarecer que, no matadouro de Chaves, o cérebro foi introduzido num frasco com formol, com uma capacidade de cinco litros, tendo sido transportado para o Laboratório da Direcção Regional, em Mirandela, o qual se encarregou do respectivo transporte até ao Laboratório do Porto. Portanto, não houve qualquer alteração de natureza autolítica ou outra, tendo havido o cuidado de seguir rigorosamente as normas que os técnicos ingleses distribuíram pelo mundo inteiro, especialmente para a Comunidade.
Seguiram-se, pois, todas as normas que estão estabelecidas para um caso destes, após o que se procedeu ao corte