19 DE JUNHO DE 1993
258-(27)
Ora, ao contrário do que aqui foi dito pelo colega que me antecedeu, embora a patologia nervosa tenha um modelo de sintomatologia muito semelhante em todos os casos, no que toca à BSE, há particularidades específicas que a diferenciam dos restantes problemas. Assim, como se tratava de um bovino que tinha sido importado de Inglaterra, suspeitei da doença e declarei-a ao serviço competente, até por se tratar de uma doença de declaração obrigatória. Imediatamente, os serviços removeram o animal, indemnizaram o proprietário e os restos seguiram para análise. Não soube de mais nada, a não ser por meu interesse próprio quando, passado um tempo, perguntei ao responsável sanitário, que me disse ser uma encefalopatía provocada por um menin-goccocus, que é um agente bacteriano, e assim ficou a situação. Não sei se terei tido outro caso, mas este problema deixou de ter importância, uma vez que o outro caso não foi típico e, não o sendo, nem sequer pus o problema.
O Sr. Presidente (Antunes da Silva): — Sr. Doutor, penso que terminou a sua intervenção inicial. Os Srs. Deputados colocariam agora as suas questões, a que depois responderia.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.
O Sr. António Campos (PS): — Sr. Dr. José Carlos Pereira, muito obrigado por ter vindo a esta Comissão.
Sr. Doutor, foram importados de Inglaterra cerca de 12 000 animais. O efectivo inglês, numa proporção de 0,04%, estava afectado com encefalopatia espongiforme bovina e, quando a Comunidade tomou algumas medidas fortes e tornou obrigatória a declaração da doença, todos os técnicos sabiam que, em Portugal, havia casos de encefalopatia. Na proporção das importações, todos nós sabíamos que, pelo menos, existiriam em Portugal cerca de 20 a 30 casos. O Sr. Dr. Armada Nunes, há pouco, deu-nos aqui um elemento precioso, informando-nos que o tempo de incubação desta doença pode ir dos 2, 8 ou 10 anos. Gostaria de saber não só se a Direcção-Geral dos Serviços Pecuários, algum dia, criou algum serviço especial de acompanhamento do gado importado de Inglaterra mas também se o Sr. Doutor foi alguma vez avisado e preparado para o acompanhamento especial dos animais que tinham vindo de Inglaterra.
Disse o Sr. Doutor que, quando manda análises para o laboratório, recebe o resultado das mesmas na totalidade. Como é que, neste caso, reagiu quando não lhe deram oficialmente o resultado da análise que enviou?
Em terceiro lugar, o Sr. Doutor, com os seus conhecimentos técnicos — e estamos aqui a discutir três ou quatro casos—, e dado que o gado, quando veio para cá, não foi sujeito a nenhum teste, nem havia nenhuma forma de diagnóstico antecipado que permitisse a não existência desse gado em Portugal, confirma-nos que, de facto, deve haver muitos mais casos do que aqueles que são hoje conhecidos oficialmente em Portugal? Para o Sr. Doutor qual é o benefício e o sentido de esconder uma situação que, no fim de contas, implicava compromissos internacionais e nacionais de clarificação e de ajuda à comunidade cientifica nacional e internacional, dado que é uma doença que penso estar ainda num grau de desconhecimento bastante elevado, sabendo que o Governo português publicou legislação no sentido de tornar a declaração desta doença obrigatória, pois o Governo Português cumpriu o que tinha ficado assente na Comunidade? O que é que pensa que terá levado o Laboratório a ter dois tratamentos, dado que, para qualquer análise, lhe eram fornecidos os resultados e para esta isso não aconteceu?
O Sr. Presidente (Antunes da Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Dr. José Carlos de Azevedo Pereira.
O Sr. Dr. José Carlos de Azevedo Pereira (Técnico do Agrupamento de Defesa Sanitária da Cooperativa Agrícola de Barcelos): — Sr. Deputado, não há dúvida nenhuma de que, se os Ingleses tinham ou têm ainda nos seus efectivos quatro casos em 1000 de BSE e se Portugal importou 12 000 efectivos, é evidentemente presumível que alguns dos nossos animais teriam de vir infectados, uma vez que eles consumiram o agente infeccioso. Ora, sendo assim, dado existirem 4 casos em 1000 efectivos, em 12 000 efectivos teríamos 48 casos. Portanto, teoricamente, e respeitando a proporção da doença em Inglaterra, teriam vindo para Portugal 48 casos. No entanto, é preciso ver que esses bovinos foram importados, provavelmente, até 1989, data da última importação de gado inglês para os países exteriores. Esses efectivos foram importados desde 1982 até 1989 e mais de metade — bem mais de metade— está morto, foi abatido para consumo ou levou outros fins. O problema que se colocaria agora seria de descendência, se, de facto, a doença é transmissível verticalmente, o que não está provado. E, como não está provado, não tem nenhum efeito prático. De toda a forma, não me surpreende que, em Portugal, os casos tenham sido só cinco ou seis, porque, na realidade, esta doença é rara, não é uma doença que atinja um efectivo em escala. Os animais infectam-se por via oral e, por isso, só estarão doentes os que consumiram o agente infeccioso. Sendo assim, já foi uma felicidade — em termos científicos, evidentemente — termos encontrado 3 ou 4 casos.
Claro que ninguém foi avisado sobre o número de animais importados de Inglaterra, nem ninguém recebeu — pelo menos eu não recebi — nenhum aviso especial para tomar medidas especiais de precaução relativamente a esta doença.
Realmente, de todas as análises que são enviadas ao Laboratório obtemos respostas, mais cedo ou mais tarde. Nesta, como disse há pouco, não obtive resposta. Aliás, a que obtive foi diferente da realidade, porque vim a saber, recentemente, que o meu caso foi positivo depois de o assunto ter sido despoletado por um jornalista do semanário Expresso.
Quanto a haver um teste prévio que, quando o gado chegasse de Inglaterra, tornasse acessível o diagnóstico ou a presença de infecção nos animais, devo dizer que não existem testes para esse efeito. O único processo de diagnosticar a doença, como já aqui foi dito pelo meu colega, é o exame laboratorial. Só post mortem é que a doença é diag-nosticável. Mas, como disse, não haverá muitos casos, pelo menos presentemente. Se, como tudo indica, a doença não for transmissível aos descendentes, os animais que consumiram a infecção em Inglaterra, presentemente, em Portugal, são relativamente poucos, e, como tal, até é natural que não apareçam mais casos.
Quanto à questão de os serviços esconderem os resultados, devo dizer que, em minha opinião, a classe veterinária devia ter tido conhecimento da existência da doença. E isto para muitos efeitos, inclusivamente para permitir aos veterinários práticos, que muitas vezes encontram síndromas neurológicas que podem ser ou não de BSE, mas que são confundíveis com essa doença, uma investigação sobre esses assuntos, que há ainda a fazer, e, além do mais, o estudo das outras doenças neurológicas. Penso, portanto, que tinha interesse nacional e técnico que lhes fosse dado conhecimento da existência da doença, embora sabendo, à partida, que esta é realmente uma doença restrita. Neste momento, não se pode dizer que temos a doença em Portugal; só a tere-