19 DE JUNHO DE 1993
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além do Departamento de Patología, no que concerne ao exame histopatológico, está equipado com uma boa Unidade de Microscopia Electrónica para observação e estudo das fibrilhas, com departamentos de virologia, bacteriologia e outros em condições de possibilitar um correcto diagnóstico diferencial, como se impõe.
Desejava fazer estas considerações de forma a W. Ex." compreenderem que, se bem que não esteja por dentro de algumas partes do processo — que, quanto a mim, não foi conduzido da melhor forma —, tal não significa que não esteja inteirado da doença.
O Sr. Presidente (Antunes da Silva): — Os meus agradecimentos, Sr. Prof. Doutor Manuel Cardoso Laje, pela exposição feita, bem como pela disponibilidade evidenciada.
Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados António Campos e Carlos Duarte.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.
O Sr. António Campos (PS): — Sr. Professor, agradeço as informações prestadas, mas gostava de colocar-lhe algumas questões.
Em primeiro lugar, depois de ter ouvido a sua intervenção, sou levado a concluir que o Laboratório Nacional de Investigação Veterinária não aproveita os melhores e protege os piores técnicos.
De facto, tenho em meu poder alguma documentação segundo a qual o laboratório do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge quis importar priões só para pesquisa. O Laboratório Nacional de Investigação Veterinária proibiu-o e a argumentação, muito sólida, apresentada ao referido Instituto é do seguinte teor: «O Laboratório Nacional de Investigação Veterinária, tanto em Lisboa como no Porto, encontra-se apto à realização das provas recomendadas pela CEE e pela OIE para o diagnóstico laboratorial das encefalopatías espongiformes dos animais, pelo que, se for considerada a realização de um tal estudo, não se toma necessário recorrer a outras instituições.» Mas a verdade é que dois técnicos do citado Laboratório deslocaram-se a Inglaterra para se especializarem nesta matéria.
Outra conclusão a que chego é a de que, apesar de as análises se terem realizado, os resultados nunca foram, como habitualmente, fornecidos aos técnicos. O Laboratório Nacional de Investigação Veterinária apoia o trabalho dos técnicos fornecendo-lhes o resultado das análises, mas tenho em meu poder um documento confidencial, dirigido ao di-rector-geral, no qual o Sr. Dr. Matos Águas diz o seguinte: «Conforme instruções de W. Ex.", escondo o resultado das análises.» Também penso que algumas análises foram repetidas em laboratórios ingleses.
Pergunto: sob o ponto de vista científico, que mais é necessário para provar que, em Portugal, há encefalopatia espongiforme bovina, sabendo, como o Sr. Professor já disse, não tratar-se de uma novidade para ninguém? De facto, importámos bastantes animais, pelo que me parece óbvio que, em Portugal, existam casos de encefalopatia.
Porém, Sr. Professor, recorro à sua autoridade profissional por não compreender alguns aspectos desta questão. De facto, trata-se de uma doença de declaração obrigatória e, em relação à produção de medicamentos que utilizam fígado, cérebro e tecidos nervosos dos bovinos, a Comunidade tomou medidas rigorosas de controlo.
Suponho que o Sr. Professor nos dirá que cientificamente esta doença não é totalmente conhecida, até pelo número de anos que o seu período de incubação pode durar. Assim, pergunto: num assunto de Estado desta natureza, assumindo
o Governo Português compromissos fortes no seio da Comunidade, quando todos os técnicos com quem conversei — e foram muitas dezenas — sabem que em Portugal há indícios desta doença, qual é a explicação científica para a falta de uma grande clareza e abertura, de um comportamento do Estado por parte dos responsáveis perante algo cujos efeitos desconhecemos?
O Sr. Presidente (Antunes da Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Prof. Dr. Manuel Cardoso Laje.
O Sr. Prof. Doutor Manuel Cardoso Laje (Investigador--Coordenador do Laboratório'Nacional de Investigação Veterinária): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Campos, sou, por feitio e hábito de trabalho — e já nos temos cruzado no campo no tempo em que me dedicava mais à avicultura —, uma pessoa aberta e acho que todas as pessoas podem contribuir para esclarecimento dos problemas.
Não tenho medo de confrontar as minhas opiniões com as de outras pessoas e entendo que todos o devemos fazer. Creio que o secretismo é, em ciência, absolutamente errado e que não conduz a qualquer lado, porque há pessoas que pensam que descobriram uma grande coisa, no fim, depois de destapada, verifica-se que nada tem dentro.
Na minha opinião —e estou absolutamente de acordo com o Sr. Deputado António Campos —, devia ter sido aceite a colaboração do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, tanto mais que conheço e sou muito amigo do professor Armindo Filipe, que é uma pessoa de muito valor e que tem estudado este assunto dos priões.
Como V. Ex." certamente sabe, porque se tem debruçado sobre o assunto, este agente é muito complicado; não é um vírus nem uma bactéria e é difícil estudá-lo até porque se trata de uma proteína com uma alteração tão pequena na sua constituição que nem sequer os anticorpos são capazes de detectá-la. É por essa razão que não é possível fazer provas prévias com animais vivos.
Já expliquei por que razão se deslocaram dois técnicos a Inglaterra e creio não podermos dizer que foram aprender a fazer o diagnóstico desta doença — em quatro dias, não se aprende a fazer o diagnóstico de coisa alguma — mas, sim, as técnicas de histologia. Foi por essa razão que, de início, disse ter sido errado enviar alguém sem prática.
Há 30 anos que faço observações ao microscópio e ainda hoje sinto algumas dificuldades. Aliás, podia mostrar a W. Ex.M uma listagem de mais de 40 doenças do sistema nervoso central que apenas podem ser detectadas por alguém experiente, por quem tenha visto dezenas, centenas, de cérebros com alterações, que são muitas, até de autólise. Os vacúoios podem querer dizer muito, mas não são tudo.
No caso do Dr. Azevedo Ramos — e presto-Jhe aqui a minha homenagem por tratar-se de um técnico com uma boa experiência —, com certeza que, com a bagagem que levava de Portugal, quatro dias foram suficientes para inieirar--se da técnica histológica, ou seja, das zonas onde se localizavam as lesões, porque a sua localização é precisa em determinados pontos do cérebro, em determinados núcleos nervosos. As vacas não são nada loucas —coitadas!—, se calhar, são menos loucas do que muitos de nós; o agente está centrado em determinados núcleos nervosos que comandam a locomoção e outras actividades do animal pelo que nem as proteínas nem o seu funcionamento é o norma).
Portanto, os referidos técnicos deslocaram-se a Inglaterra para aprenderem a forma de cortar e fixar os cérebros, o ponto em que podiam ser encontradas as lesões porque não