19 DE JUNHO DE 1993
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mentação humana, quer destinados à indústria. Após uma episódica passagem por uma grande empresa de lacticínios fui subdirector-geral do Instituto de Qualidade Alimentar. Nesta circunstância estive quatro anos e, posteriormente, em 1986, assumi a presidência daquele Instituto de onde saí em 1990.
Srs. Deputados, em primeiro lugar, quero dizer que não sou cientista, não sou professor, mas, apenas, um técnico que
serviu a Administração Pública em lugares de responsabilidade, mormente aqueles que desempenhei a partir de 1986.
Relativamente à encefalopatia espongiforme dos bovinos (BSE), pouco mais sei do que aquilo que é relatado nos jornais. Inclusivamente, devo dizer-lhes que o se passa na comunicação social — não só nos jornais — deixa-me um tanto apreensivo, porque, efectivamente, exerci funções de decisão em termos de salvaguarda da saúde pública. Foram momentos particularmente delicados, nomeadamente quando se deu o acidente de Chernobyl, em que era obrigatório controlar todos os géneros alimentícios e animais vivos provenientes de vastas regiões do globo. Num outro aspecto mais restrito — e ainda nessas condições — tive ainda de assumir responsabilidades quando surgiu na Europa um surto de nsteriose, que provocou a morte em cidadãos suíços e franceses.
Nessa circunstância, passe a minha modéstia olho estes problemas com algumas reticências. Na minha formatura em Ciências Veterinárias, já lá vão muitos anos, aprendi que um diagnóstico tem de ser feito com um conjunto de informações para ser possível caracterizar e dizer que é a doença x ou y. Se assim não fosse, limitávamo-nos a colher os sintomas, a introduzir esses sintomas ou os resultados laboratoriais num computador e teríamos uma resposta.
Daí que esta matéria é extremamente melindrosa e, por isso, o diagnóstico diferencial e identificação de agente causador da doença são fundamentais para a definir.
Ora, por aquilo que ouvi, parece-me que esta situação não ocorreu. Admito que existam fortes suspeitas de que houve quatro casos de BSE em bovinos importados de Inglaterra. Mas isto não é a mesma coisa que dizer que há em Portugal BSE. O facto de entrar no País um indivíduo com febre amarela, não quer dizer que em Portugal há febre amarela.
Se fosse, porventura, director-geral da Pecuária, tinha de ser muito cauteloso para não acontecer o fenómeno que é muito frequente em países como o nosso, um pequeno país, de grande sensibilidade, onde o consumidor deixa de consumir logo que se noticia a existência de uma doença nos bovinos ou em qualquer outra espécie. De um modo geral, atendendo a que é matéria extremamente complicada, as pessoas não estão em condições de entender os meandros de uma situação destas.
Srs. Deputados, estamos no campo da biologia, que não é matemático. O velho aforismo de Hipócrates de que não há doenças mas doentes é muito certo e aplicável nesta circunstância.
Primeiro, é uma doença em relação à qual existe uma suspeita muito forte, mas não há uma certeza; segundo, estamos perante uma doença que não é transmissível, nem horizontal nem verticalmente como é afirmado por alguns cientistas através dos documentos que tive oportunidade de ler; terceiro, é uma doença que tem um período de incubação relativamente longo, e os animais jovens não são atacados.
Até agora, em relação aos animais que apareceram com esta sintomatologia, ou com a doença que foi diagnosticada em Inglaterra, a causa foi determinada. Mas aqui em Portugal tal não aconteceu. Portanto, em primeiro lugar, pàrece-
-me que a posição da Direcção-Geral da Pecuária era defender a saúde pública. Isso foi feito. Mas, mais do que isso, era preciso não alarmar a população portuguesa, porque sabemos quais são os efeitos desses alarmes.
Srs. Deputados, fui duas vezes à televisão aquando do acontecimento de Chernobyl: ao 24 Horas, a primeira vez, e ao Telejornal das 20 horas pela segunda vez. A minha preocupação primeira foi a de não alarmar a população, o que consegui. Por exemplo, ninguém sabe, provavelmente, que rejeitámos um barco com 30 000 t de trigo que devolvemos à procedência — aqui era devolver à procedência não aceitar e destruir— frutos secos provenientes da Turquia, como também ninguém sabe que foram inutilizados largos quilos de queijo do tipo camembert, que entraram pelo porto de Setúbal.
Quando se dá o alarme de que algo se passa no gado bovino, a primeira coisa que acontece é baixar a procura da carne desta espécie. Poderia não haver qualquer risco, mas a reacção é sempre a mesma: quer o consumidor quer o produtor ficam alertados, e perante a dúvida o primeiro deixa de comprar o segundo deseja vender. A ampliação de oferta leva a baixa de preço no mercado que, por sua vez, cria no sector uma situação de crise. Penso que foi esta situação que o director-geral da Pecuária quis, efectivamente, evitar.
O Sr. Presidente (Antunes da Silva): — Sr. Dr. João Cotta Dias, muitíssimo obrigado pelas declarações. Tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.
O Sr. António Campos (PS): — Sr. Presidente, o Sr. Dr. João Cotta Dias fez aqui uma intervenção fora do quadro normal do funcionamento do Estado de direito, pois o Estado Português, o Estado Francês e o Estado Inglês assumiram compromissos. Tanto quanto tenho conhecimento, os casos que surgiram em França estão relacionados com as vacas inglesas, aliás como em outros países da Comunidade onde foi declarada a própria doença.
O apelo que o Sr. Dr. João Cotta Dias fez é mais ou menos o seguinte: são casos de vacas importadas — todos sabemos isso — e pode haver entre 20 a 40 casos de encefalopatías em Portugal!...
Sr. Doutor, todos sabemos isso nesta Comissão, na medida em que fazemos as contas tendo por base a percentagem inglesa e as vacas que importámos!
, Aliás, o primeiro diagnóstico feito num país foi em Inglaterra. A Comunidade, quando faz a declaração obrigatória estabelece um método de diagnóstico que é utilizado na própria legislação portuguesa, bem como nas legislações inglesa e francesa.
Com efeito, o Sr. Dr. João Cotta Dias diz que são poucos casos, que não vale a pena alargar..., ou, então, somos um país de cientistas especiais, de um grande quadro científico, e que os outros países obedecem às bases de diagnóstico que fazemos!... Até talvez tenhamos uma estrutura científica muito diferente da dos outros páises e, portanto, temos a obrigação de fazer o complemento daquilo que os outros países não fazem, apesar de mais ricos do que Portugal, que têm uma estrutura científica muito maior do que a nossa, mas devo dizer que, enquanto país pequeno, devíamos ter uma grande estrutura científica.
Talvez fosse por essa via, mas não é esse o caso que estamos a debater e, portanto, o Sr. Doutor vem fazer aqui — desculpe o pequeno aparte, e o Sr. Presidente vai deixar--me fazê-lo — a história dos metagonislas e das hormonas