11 DE MARÇO DE 1996
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-lhe-ei duas questões muito concretas sobre áreas que nos são muito sensíveis.
A primeira tem a ver com a separação da população prisional. Não identificamos no orçamento verbas especificamente destinadas a este objectivo e refiro-me à separação dos presos preventivos daqueles que estão a cumprir penas efectivas, dos presos jovens dos presos de mais idade, dos pequenos delinquentes dos grandes delinquentes. É um assunto que nos preocupa e que justifica uma solução peio que agradecemos que nos seja dada alguma
informação sobre essa matéria.
A segunda questão, a não ser que estejamos a fazer uma leitura errada do orçamento, tem a ver com a escassez da verba destinada à reinserção social pois, tanto quanto nos foi possível identificar, estão inscritos 6000 contos para instalação de equipas de reinserção social.
Nãó vou fazer aqui a defesa de qualquer aspecto de fundo em relação a esta matéria. Eram apenas estas duas questões muito concretas que gostava de ver esclarecidas.
O Sr. Presidente (Henrique Neto): — Tem a palavra o Sr. Deputado Laborinho Lúcio.
O Sr. Laborinho Lúcio (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, mais uma vez, reitero o prazer que tenho em poder trocar impressões com V. Ex." na Assembleia sobre aquilo que julgo que, afinal de contas, nos é comum, a paixão que ambos temos pela justiça, e suponho que esse é um ponto em que estamos claramente de acordo.
Isso leva-me, inclusivamente, como aliás tem sido hábito, a fazer uma intervenção muito mais dirigida às questões que nos preocupam e ao modo como, eventualmente em convergência de Estado, podemos encontrar soluções do que a pôr-lhe um conjunto de questões que relevam mais da área de uma estereotipada intervenção política. Voltar-me-ei mais para aquilo que é uma experiência de terreno, que como membro do Governo tive, e que V. Ex.a está a ter neste momento, para pegar na questão que me preocupou, que preocupa V. Ex." e que preocupa os portugueses e que não se resolve, aliás, como nenhuma questão essencial, com um golpe de mágica. Refiro-me à lentidão da justiça, à menor celeridade com que sobretudo os tribunais respondem aos conflitos e diferendos entre os cidadãos que suscitam a sua intervenção.
.Creio, Sr. Ministro, que estaremos de acordo quanto ao objectivo, à necessidade de introduzir mecanismos que dêem, desde logo, uma maior explicitação externa a um eventual movimento de melhoria e, ao mesmo tempo, à necessidade efectiva de transmitir aos cidadãos a noção e a convicção de que essa melhoria existe e de que eles vêm a ser os seus beneficiários, visto que são os titulares originários do valor que os tribunais administram.
Gostava de perguntar-lhe, Sr. Ministro, se é possível —e sei que é difícil, portanto não estou a fazer-lhe nenhuma pergunta insidiosa ou que tenha qualquer segunda intenção —, no seu espírito, adiantar uma previsibilidade quanto à duração média de processos dentro de dois, três, quatro anos. Temos, como o Sr. Ministro sabe, uma análise estatística continuada no Ministério da Justiça que, de há seis anos para cá, assenta nos mesmos critérios objectivos e, portanto, é possível fazer assentar sobre o problema da lentidão uma grelha de apreciação que, melhor ou pior, do ponto de vista da qualidade efectiva, é objectivada pelo facto de ter mantido os mesmos critérios ao longo do tempo. E, na análise dessa grelha, foi possível concluir que, tendo em conta ainda a situação negativa do funcionamento
do sistema, tem havido, desde 1989, uma melhoria progressiva na duração média dos processos. Gostava de saber até que ponto é possível fazer uma projecção sobre o caminho previsível para conseguir-se essa melhoria.
Por outro lado, Sr. Ministro, ainda hoje — e o facto de eventualmente me situar agora num ponto de vista onde esse tipo de questões podem ser abordadas sem algumas exigências como aquelas que pendem sempre sobre o Ministro da Justiça — continuo a ter a mesma COüViCÇãO de que a questão da lentidão da justiça não se resolverá nunca, se é que alguma vez se resolve em qualquer sistema semelhante ao nosso, sem falarmos claramente da gestão global do sistema de justiça. Continuo convencido de que temos de reflectir profundamente sobre essa matéria sem reservas que, sobretudo, venham inquinar a nossa reflexão como as que têm a ver com a vontade ou não de pôr em causa a independência dos tribunais. Evidentemente que estou hoje muito mais liberto para falar dessa matéria situando-me na oposição mas creio, ainda assim, mesmo nesta posição, que as ideias que, de alguma forma, tentámos pôr em discussão se mantêm e que não podemos evitar um debate sério, de Estado, sem preconceitos, sobre a questão do governo dos tribunais e da gestão do funcionamento do sistema de justiça.
Gostava de saber até que ponto V. Ex.a tem já — não direi reflexão, porque essa tem-na com certeza — algum caminho andado neste domínio ou se, pelo contrário, entende que esta é matéria que ficará fora das cogitações do Govemo nesta área.
Evidentemente, poderíamos trocar impressões sobre variadíssimos aspectos do funcionamento do sistema mas gostava de pegar na questão dos tribunais de círculo que V. Ex.a. focou para lhe dizer, Sr. Ministro, sem qualquer tipo de reservas, que não serei eu a fazer oposição a qualquer reforma que demonstre melhorar o funcionamento do sistema.
Julgo que nenhum Ministro da Justiça ficará na história por ter criado ou não este ou aquele tribunal e muito menos se, tendo criado um tribunal, ele funciona mal. Justamente por isto, tenho total liberdade de espírito para solicitar ao Ministro da Justiça que, apesar de tudo, reflicta ainda um último momento sobre os tribunais de círculo, como acabou de dizer, porque o Sr. Ministro sabe e vai ter no terreno, várias vezes, consciência prática de que muitas medidas também não têm o sucesso que se pretende porque há quem queira que esse sucesso se não efective realmente.
O Sr. Ministro sabe que os tribunais de círculo nunca " foram queridos por determinados grupos profissionais que operam no interior do sistema de justiça e a questão fundamental é a de saber se não o foram porque razões de cidadania o justificam, e nessa altura têm razão, ou se não o foram porque razões corporativas o justificam, e nessa altura não há que dar razão a esse tipo de pretensões.
O Sr. Ministro sabe mesmo que a existência de tribunais de círculo, comezinhamente como isto, impede que alguns magistrados ganhem menos cinco contos por mês, visto que serão apenas os presidentes efectivos dos tribunais de círculo a terem um estatuto remuneratório diferente e não a generalidade dos magistrados como acontece se não houver tribunais de círculo. Isto para lhe dar um exemplo mínimo do que pode ser um obstáculo, sendo certo que outros exemplos máximos poderiam ser invocados também nesse sentido.
Há uma ideia base, nuclear, do tribunal de círculo: permitir que questões de maior complexidade sejam julgadas por magistrados de maior competência e com