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20 DE JULHO DE 1996

174-(101)

D) A norma regulamentar em causa viola directa e materialmente o princípio/garantia da confiança que os cidadãos podem depositar na unidade e integridade da ordem jurídica, o qual se revela como corolário imediato do princípio do Estado de direito, consagrado no artigo 2.° da CRP. Isto, sucintamente, porque o despacho SERE de 23 de Outubro de 1992 põe em crise a habilitação operada

pela citada legislação de 1974/78, determinando a

revogação de direitos constituídos, sem que para tanto se encontre fundamento jurídico-constitucional apto.

E) a norma que é objecto da presente iniciativa, ainda que, por mera hipótese, não se tratasse de norma interpretativa sempre pretenderia assumidamente modificar norma contida em actos legislativos sucessivos ao Decreto-Lei n.° 302/74, de 5 de Julho, violando o disposto no artigo 115.°, n." 5, da CRP. Isto se for admitido que os citados actos legislativos não devam conceber-se como legislação subsequente ao Decreto n.° 36 508, de 17 de Setembro de 1947, caso em que não pode deixar de reconhecer-se a subsistência da eficácia das habilitações para todos os efeitos legais, complementando as normas contidas nos artigos. 128." e 129.°, n.05 1, 3 e 4, do ECD e nos artigos. 3.° e 4.°, alínea o), do Decreto-Lei n.° 120--A/92, de 30 de Junho.

F) A norma ora impugnada, mesmo que de norma contida em acto legislativo se tratasse, realizando interpretação autêntica das normas citadas imediatamente supra, sempre seria inconstitucional, por violação dos princípios da igualdade e da tutela da confiança na unidade da ordem jurídica, decorrentes, respectivamente, dos artigos 13.° e 2.° da Constituição.

Nestes termos, pela motivação exposta e por violação das normas e princípios constitucionais enunciados, pede o Provedor de Justiça, exercendo o poder que lhe é conferido no artigo 281.°, n.° 2, alínea d), da Constituição, a declaração com força obrigatória geral, pelo Tribunal Constitucional, da norma contida no despacho SERE de 23.10.1992 (cópia em anexo), para os efeitos previstos no artigo 282.°, n.° 1, da CRP.

94.06.09 R-2796/93

O Provedor de Justiça vem, ao abrigo do disposto no n.° 1 e na alínea d) do n.° 2 do artigo 281.° da Constituição da República Portuguesa e do disposto no n.° 3, do artigo 20.°, da Lei ,n.° 9/91, de 9 de Abril, requerer a apreciação da constitucionalidade das normas contidas na alínea d) do n.° 3 do artigo 2." da Lei n.° 14/89, de 30 de Junho, no artigo 79.° do Decreto-Lei n.c 422/89, de 2 de Dezembro, e na Portaria n.° 1159/90, de 27 de Novembro, nos termos e com os fundamentos seguintes:

1.° O artigo 79.° do Decreto-Lei n.° 422/89, de 2 de Dezembro, ao abrigo do disposto na Lei n.° 14/89, de 30 de Junho (lei de autorização legislativa), permitiu, expressamente, aos empregados dos quadros das salas de jogos aceitar as gratificações espontaneamente dadas pelos frequentadores daquelas salas (n.° 1), proibindo, porém, a percepção individual das referidas liberalidades (n.° 2).

2." A mesma disposição legal previu, desde logo, que as regras de distribuição das gratificações pelos empregados com direito à sua percepção fossem fixadas por portaria, ouvidos os representantes dos trabalhadores (n.° 3).

3.° E que em tais regras pudesse determinar-se que uma percentagem das gratificações, não superior a 15%, reverteria para o Fundo Especial de Segurança Social dos Profissionais da Banca dos Casinos, ou para outros fundos a constituir, ouvidos os representantes dos trabalhadores (n.°4).

4.° Efectivamente, a Portaria n.° 1159/90, de 27 de Novembro, veio a aprovar as regras de distribuição das gratificações percebidas pelos trabalhadores das salas de jogos tradicionais e privativas de máquinas dos casinos.

5." Ora, se já a mera proibição da percepção individual de gratificações e a autorização para criação de regras disciplinadoras da sua distribuição se apresenta de constitucionalidade duvidosa, o alargado âmbito da citada Portaria realça tal vício, agravando-o. É o que se procurará, de seguida, demonstrar.

I

Da violação do artigo 62.fi, n.a 1, da Constituição

6.° Como afirma o jurisconsulto Dr. Vítor Faveiro, a fls. 20 do douto parecer proferido acerca deste assunto (que se anexa ao presente articulado):

As gratificações espontâneas, dadas pelos frequentadores dos casinos têm (...) a natureza de negócios jurídicos unilaterais, inominados, abstractos, tendo por objecto a manifestação e execução da vontade do gratificante de enriquecer o património do gratificado, por motivos puramente subjectivos e não revelados, compreendendo, entre outros, a mera exibição ou ostentação do prazer de ganhar (...). Não existindo, nas gratificações, qualquer relação jurídica entre o gratificante e a entidade patronal do gratificado, não pode a entidade patronal avocar a si, ou exercer a qualquer título, o direito ou função de dispor do objecto da gratificação em termos de o atribuir, por si, a quem melhor entender, possivelmente a pessoa diversa da vontade do gratificante substituindo-se, assim, a essa vontade, ou contra-riando-a mesmo; ou retirando ao destinatário da gratificação um direito privado de titularidade sobre a importância que lhe é dada.

7.° Ora, como o mesmo autor vem a concluir, ainda no citado parecer, também o legislador, por força do supracitado preceito constitucional, não pode contrariar a vontade do gratificante, atribuindo a outros, que não àqueles a quem directamente foi entregue a gratificação, o respectivo valor.

8.° É que o direito à transmissão da propriedade privada, consagrado no n.° 1 do artigo 62." da Constituição, só será respeitado se, e enquanto, o beneficiário da transmissão for aquele que o transmitente quiser, efectivamente, compensar. Por outro lado,

9.° A partir do momento em que ao trabalhador é entregue qualquer montante a título de gratificação, por qualquer um dos motivos subjectivos mencionados, exemplificativamente, no supra citado parecer, o respectivo montante — que foi ofertado àquele trabalhador em particular e não a qualquer outro, nem, tão pouco, ao estabelecimento onde trabalha —, passa a integrar a sua esfera jurídica, o mesmo é dizer, passa a ser sua propriedade privada, caindo sob a protecção do já sobejamente citado artigo 62.°, n.° 1, da Constituição.