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20 DE JULHO DE 1996

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o conjunto dos docentes que prestaram materialmente as citadas provas e em relação aos quais foram equiparados em termos absolutos; discriminação por não auferirem qualquer benefício por comparação com os docentes não abrangidos pela legislação aprovada entre 1974 e 1979, a qual pressupunha a simples suspensão do Exame de Estado.

76.° Não restam dúvidas, por fim, quanto ao carácter discriminatório — porque desprovido de fundamento constitucionalmente válido — da distinção levada a cabo pelo despacho de 23.10.1992, de Sua Excelência o Secretário de Estado dos Recursos Educativos.

77° Bem recentemente, teve o Tribunal Constitucional oportunidade de enunciar o alcance do princípio da igualdade no que importa para o caso vertente:

Se o princípio da igualdade não proíbe que haja diferenças de tratamento na lei, antes por vezes as impõe directa ou indirectamente, o que com segurança se pode dizer é que tal princípio proíbe, isso sim, as discriminações arbitrárias, irrazoáveis ou infundadas, sendo tidas como tais todas as que não encontrem um apoio suficiente na distinta materialidade das diferentes situações que se contemplam ou na compatibilização do aludido princípio da igualdade com outros princípios constitucionalmente acolhidos. (Acórdão n.° 806/93, Proc.° 204/91, in DR, II, n> 24, 29.01.1994.)

78.° Isto é assim, dado que ao elenco das causas de discriminação positiva no artigo 13.°, n.° 2, da CRP, não se concede natureza taxativa, desde logo, porque a letra da norma contida no artigo 7.°, da Declaração Universal dos Direitos do Homem não o consentiria.

79.° O arbítrio do tratamento desigual é tão mais sentido na esfera jurídica dos seus destinatários quanto se permita retirar dá impossibilidade de realização das provas de exame de Estado por motivo que lhes foi inteiramente alheio — a suspensão das provas determinada por despacho ministerial, ao abrigo do regime resultante do Decreto n.° 36 508, de 17 de Setembro de 1947 e legislação subsequente, até 1979 mantido inalterado nos seus traços essenciais.

80.° Por outro lado, a atender-se — como se fez observar — a permissão constitucional de certos tratamentos desiguais porque ancorados em outros valores constitucionalmente valorados, há-de preservar-se em todo o caso a adequação, necessidade e razoabilidade da medida diferenciadora em ordem à tutela ou à prossecução dos aludidos valores.

81.° Ora, na verdade, ainda que por mera hipótese viesse a consentir-se à Administração diferenciar aquilo que a lei Fizera assimilar, teria de concluir-se pela ausência de proporcionalidade na medida da diferença oferecida aos docentes contemplados por legislação e regulamentação aprovadas no período de 1974 a 1979 que é a mesma que recebem os restantes (efectivados posteriormente) e aqueles que prestaram materialmente provas de Exame de Estado antes da sua suspensão.

82.° Por forma a concluir este ponto, cujo desiderato consiste na demonstração do carácter discriminatório da norma ora impugnada, dir-se-á não ficarem em nada precludidas as asserções precedentes no caso hipotético de se considerarem os diplomas habilitadores aprovados entre 1974 e 1979 como estando situados à margem do conceito de legislação subsequente empregue nos artigos 129.° e

130.° do ECD, bem como no Decreto-Lei n.° 120-A/92, de 30 de Junho e no Decreto-regulamentar n.° 13/92, da mesma data.

83." Mesmo em tal hipótese, nada habilitaria o despacho em causa a produzir a exclusão daqueles que, por direito próprio, beneficiaram da habilitação, para todos os efeitos legais, à realização com sucesso das provas de exame de Estado.

84.° Não o tendo afirmado o regime definido no Decreto-Lei n.° 409/89, de 18 de Novembro, não o tendo deixado expresso o ECD, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 139-A/90, de 28 de Abril, não o tendo jamais reconhecido a legislação ulterior, o silêncio não admite dúvidas quanto à subsistência da equiparação para todos os efeitos, porquanto ubi lex non dixit, tacúit.

85.° Assim, entendida praeter ou contra legem a norma impugnada— a qual, se admitindo o primeiro caso não será meramente interpretativa — sempre colide com o princípio inscrito no artigo 13.°, n.° 2, da CRP e com o artigo 7.°, da Declaração Universal dos Direitos do Homem, razão pela qual é materialmente inconstitucional.

V

Da violação do princípio da tutela da confiança por parte dos cidadãos na ordem jurídica, enquanto corolário imediato do Estado de Direito, consagrado no artigo 2.°, da CRP.

86.° Colhendo bons frutos do aprofundamento das relações do Direito Constitucional com os conhecimentos alcançados no domínio juscivilístico, não se torna difícil caracterizar a sucessão de comandos por parte do Estado (habilitação, para todos os efeitos legais, a realização com sucesso das provas de Exame de Estado/exclusão de benefícios aos mesmos habilitados) como um comportamento colisor com a proibição de ventre contra factum proprium.

87.° Esta proibição deve ser compreendida no sentido segundo o qual «há venire contra factum proprium, em primeira linha, numa de duas situações: quando uma pessoa, em termos que, especificamente, não a vinculem, manifeste a intenção de não ir praticar determinado acto e, depois, o pratique e quando uma pessoa, de modo, também, a não ficar especificamente adstrita, declare pretender avançar com certa actuação e, depois, se negue» (António Menezes Cordeiro, Da Boa Fé no Direito Civil, vol. D, Coimbra, 1984, pág. 746).

88.° Não restam dúvidas, hoje, quanto à subordinação do Estado ao direito que ele próprio cria. Isto não redunda, naturalmente, na imutabilidade da ordem jurídica. Antes significa que no exercício do poder legislativo, o Estado há-de respeitar limitações decorrentes dos seus actos tomados pretéritamente, a começar pelos actos legislativos, em razão das situações jurídicas que se constituem e se consolidam sob a sua eficácia.

89." «Assegurar expectativas e direccionar condutas são indubitavelmente funções primárias do direito.

Por um lado, assegurar expectativas. Assegurar desde logo a confiança fundada nas condutas comunicativas das 'pessoas responsáveis', fundada na própria credibilidade que estas condutas reivindicam. Entré essas 'pessoas responsáveis' (ou 'pessoas de bem' ou 'pessoas de juízo' se deve contar o próprio Estado Legislador, que 'responde' pelas expectativas criadas pelas próprias leis que edita» (João Baptista Machado, «Iniciação ao Mundo do Direito»,