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II SÉRIE-C — NÚMERO 23

individuais e outra é conferir-lhe execução por meio de normas. Num caso ou noutro, terá lugar a interpretação de normas, mas.no segundo caso essa execução implica a afectação da esfera jurídica de terceiros, nunca podendo assumir-se, mais ou menos discretamente, como se de interpretação autêntica se tratasse.

61° De resto, sempre haverá controlo jurisdicional sobre a interpretação projectada nos actos da Administração Pública, por meio do controlo que aos Tribunais compete sobre esses mesmos actos e sobre a sua fundamentação.

62.° E não se argumente também com a margem de livre apreciação confiada à Administração por conceitos vagos e indeterminados, porquanto, ainda que viesse a admitir-se ser esse o caso vertente, não permitiria a letra do sempre citado artigo 115.°, n.° 5, outorgar a üm acto regulamentar com eficácia externa o poder de fazê-lo.

63." Nem se argumente com um hipotético resultado de fragmentação da actividade administrativa ao qual conduziria a ausência de um poder interpretativo uniforme no seio da Administração, dado que as relações de hierarquia administrativo a tanto obstarão em qualquer caso (vd. Paulo Otero, Conceito e Fundamento da Hierarquia Administrativa, Coimbra, 1992, pág. 204).

64." Onde a lei não efectuava qualquer distinção, por se reportar a todos quantos houvessem logrado alcançar os efeitos propiciados pelo Exame de Estado, até à extinção deste como matriz de referência (através do Decreto-Lei n.° 519-T1/79, de 29 de Dezembro), veio o Governo, no exercício de poderes administrativos, fazê-lo, quando poderia ter recorrido à via legislativa para interpretar autenticamente normas contidas em acto legislativo. Contudo e como adiante se observará, a interpretação sufragada sempre violaria materialmente princípios constitucionais.

65.° Há-de concluir-se, assim, em conformidade com o exposto, ter o despacho de Sua Excelência o Secretário de Estado dos Recursos Educativos, de 23 de Outubro de 1992, a natureza de acto normativo, e por sê-lo, violar directamente a norma constitucional do artigo 115.°, n.° 5.

IV

Da violação do principio da igualdade (Artigo 13.9, da CRP)

66.° De entre a sua vasta e complexa acção na origem jurídicoconstitucional, o princípio da igualdade faz resultar a proibição do tratamento discriminatório, ou seja, proibição do tratamento desigual atribuído a situações essencialmente iguais infundadamente, como também do tratamento igual conferido a situações essencialmente diversas.

67.° Partindo de um ou de outro corolário, a norma ora impugnada colide com o dispositivo constitucional do artigo 13.°, n.° 2.

68.° Isto é, a norma impugnada, quer por excluir certo benefício a determinado conjunto de professores (a dispensa de apresentação de trabalho de natureza educacional ou mesmo a dispensa de candidatura, caso possuam

cumulativamente peto menos vinte cinco anos de serviço docente) quando o concede a outros em situação fundamentalmente idêntica, quer por lhe negar esse mesmo benefício fundando-se numa falsa similitude com o conjunto mais vasto de professores excluídos, colide em

qualquer dos casos com a proibição do tratamento arbitrário.

69.° Com efeito e como pôde ser descrito supra, após a suspensão da realização de provas de Exame de Estado,

em 1974 e até à data reformulação operada pelo Decreto--Lei n.° 519-T1/79, de 29 de Dezembro, no tocante à

profissionalização e efectivação, um significativo conjunto

de professores dos ensinos primário, preparatório e secundário, bem como outros docentes, recebeu plena habilitação correspondente à realização, com sucesso, das provas de Exame de Estado. Para tanto, esses docentes cumpriram a sequência dos requisitos que os colocariam em posição de prestar provas de Exame de Estado, designadamente a aprovação no estágio para a docência.

70." O meio utilizado pelo legislador no Decreto-Lei n.° 302/74, de 5 de Julho («... correspondem, para todos os efeitos legais, ao Exame de Estado...»), no Decreto--Lei n.° 405/74, de 29 de Agosto («... são considerados para todos os efeitos legais como habilitados com o Exame de Estado ...»), no Decreto-Lei n.° 294-A/75, de 17 de Junho (fazendo prosseguir a vigência do diploma precedentemente citado), no Decreto-Lei n.° 616/76, de 27 de Julho («... correspondem, para todos os efeitos legais, ao Exame de Estado ...»), no despacho n.° 21/78, de 5 de Julho (onde se consideram profissionalizados «para todos os efeitos legais» alguns docentes a quem foi feito corresponder o Exame de Estado) e no Decreto-Lei n.° 210/78, de 27 de Julho («... correspondem, para todos os efeitos legais, ao Exame de estado ...»), ao ser entendido, admitamos, como uma ficção legislativa.

71." Ficção legislativa no sentido que se lhe reconhece comumente, tal como a descreveu Baptista Machado:

Estas funcionam, em última análise, em regra, como remissões implícitas: em vez de expressamente remeter para normas determinadas que regulam determinados factos ou situações, o legislador estabelece que o facto ou situação a regular é ou se considera (como se juridicamente fosse) igual àquele facto ou situação para que se acha já estabelecido um regime na lei. (Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 6.* reimp., Coimbra, 1993, pág. 108.)

72.° E adianta o ilustre Professor:

É este um processo que já não tem que nos surpreender, pois já vimos que o jurista-intérprete, ao operar com conceitos que circunscrevem as facti-spe-cies legais para fins de aplicação do direito, tem muitas vezes de reconduzir realidades novas, porventura ainda não conhecidas no tempo em que a lei foi elaborada, a conceitos legais pré-existentes. (Idem, pág. 108.)

73." Em todo e qualquer caso tem de considerar-se a cisão efectuada pela norma regulamentar ora impugnada como discriminatória porque arbitrariamente geradora de tratamento desigual, dado o reconhecimento, entre 1974 e 1979, da identidade essencial de situações.

74,° Ainda que se viessem a aferir na actualidade alguma dissemelhança entre a situação dos docentes que 'hajam efectivamente prestado com sucesso as provas de Exame de Estado — aferição essa que sempre colidiria com o princípio da tutela da confiança, conforme se verá infra — o certo é que o seu tratamento não pode ser pura e simplesmente idêntico ao dos docentes nunca habilitados ou equiparados à realização com sucesso das provas de Exame de Estado.

75.° Melhor se compreenderá, então, a referência supra efectuada a uma discriminação pela face e pelo verso: discriminação no tratamento prejudicial por comparação com