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II SÉRIE-C — NUMERO 23

19.° Ora, essa delimitação exclui do âmbito de aplicação do citado Decreto-Lei, no qual se esgota a disciplina da assistência material aos trabalhadores quando se encontrem involuntariamente em situação de desemprego, os funcionários e agentes da Administração Pública, pois a sua relação jurídica de emprego é regulada no Decreto-Lei n.° 427/ 89, de 7 de Dezembro (e em estatutos especiais, como é o caso do Estatuto da Carreira Docente, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 139-A/90, de 28 de Abril), e não pelo regime jurídico privado do contrato individual de trabalho, cuja matriz contínua a ser o Decreto-Lei n.° 49408, de 24 de Novembro de 1969.

20.° No que respeita aos funcionários e agentes da Administração Pública, se há casos em que as causas de extinção da relação jurídica de emprego não permitem configurar situações de desemprego involuntário — caso da exoneração, prevista no artigo 29.° do Decreto-Lei n.° 427/89, de 7 de Dezembro —, não deixam de ocorrer, em número apreciável, situações que não mereceram a atenção do legislador no sentido de obter um desenvolvimento adequado à plena exequibilidade do direito contido no artigo 59.°, n.° 1, alínea e), da Constituição.

21." Uma dessas situações encontra-se prevista no artigo 6.°, n.° 10, do Decreto-Lei n.° 427/89, de 7 de Dezembro, onde se admite a exoneração por despacho da entidade que tiver nomeado o funcionário, no decurso do período probatório, sem prejuízo do regime do estágio de ingresso.

22." Também o caso dos funcionários e agentes a quem seja aplicada a pena disciplinar de demissão, prevista no artigo 11.°, n.° 1, alínea f), do Decreto-Lei n.° 24/84, de 16 de Janeiro, é configurável como situação de desemprego involuntário, em termos idênticos à dos trabalhadores vinculados por contrato individual de trabalho, cujo desemprego decorrente de despedimento com justa causa é considerado, nos termos do artigo 3.°, n.° 1, alínea a), do Decreto-Lei n.° 79-A/89, de 13 de Março, involuntário.

23.° De igual forma, no caso dos funcionários e agentes considerados pessoal disponível, nos termos do Decreto--Lei n.° 247/92, de 7 de Novembro, a necessidade de opção por alguma das medidas excepcionais de descongestionamento da função pública previstas no artigo 6.° desse diploma pode vir a conduzir à extinção inelutável da relação jurídica de emprego público, na medida da impossibilidade prática da activação, em cada caso concreto, da totalidade das alternativas ali elencadas.

24." Por outro lado, no caso dos agentes administrativos, isto é, do pessoal cuja relação jurídica de emprego nasce da celebração com a Administração Pública de contrato administrativo de provimento, regista-se que, para além da caducidade do mesmo (dada a sua natureza transitória, como expressamente se reconhece no artigo 15.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 427/89, de 7 de Dezembro), são verificadas situações de extinção da relação jurídica de emprego por simples denúncia da entidade empregadora, sem que se reconheça qualquer elemento de voluntariedade por parte do agente administrativo (artigo 30.°, n.° 1, alínea b), idem].

25." Outro tanto sucede no regime especial definido no Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensino Básico e Secundário — vulgo, Estatuto da Carreira Docente —, aprovado pelo Decreto--Lei n.° 139-A/90, de 28 de Abril, a propósito das situações de nomeação provisória, período probatório e contrato administrativo (artigos 30.°, 32.° e 33.°, respectivamente).

26." Assim sendo, e não existindo qualquer outro regime normativo que tenha como objecto o direito dos trabalhadores à assistência material quando involuntariamente se encontrem em situação de desemprego, há-de concluir-se que o direito conferido no artigo 59.°, n.° 1, alínea e), da Constituição, não encontra concretização legislativa no que toca aos agentes administrativos e a algumas situações respeitantes aos funcionários públicos, apesar de nada permitir — antes pelo contrário — um tratamento desigual face aos trabalhadores de contratação privada.

27.° E estando em causa, como vimos, um direito fundamental de natureza análoga à dos direitos, liberdades e garantias, não é dada ao legislador ordinário total margem de livre decisão no tocante à oportunidade de concretização do direito, pois não se está face a um direito «sob reserva do possível» (Vieira de Andrade, ob. cit., p. 201), facto que a autorizaria o poder legislativo ordinário a diferir a sua concretização ou desenvolvimento de acordo com uma opção que tomasse relativamente à afectação de recursos disponíveis.

28.° Do que veio a ser exposto resulta que, encontrando-se o direito à assistência material dos trabalhadores involuntariamente desempregados, apresente já na versão originária da Constituição — portanto, desde 25 de Abril de 1976 —, e constituindo um direito fundamental beneficiário do disposto no artigo 17.°, é configurada, de há muito, uma omissão inconstitucional das medidas legislativas necessárias a tornar exequível a norma constante do artigo 59.°, n.° 1, alínea e), da Constituição.

29.° Mesmo que, por hipótese, se considerasse não estarmos perante um direito fundamental de natureza análoga à dos direitos, liberdades e garantias, caso em que seria deixada ao legislador significativa margem de livre decisão quanto à oportunidade da sua concretização, ainda assim se verificaria, em todo o caso, uma omissão inconstitucional, no sentido do artigo 283.°, n.° 1, da Constituição.

30." A omissão em causa é relativa e não total ou absoluta, pois há concretização legislativa da norma constitucional; apenas essa concretização é incompleta, deixando de fora uma parte dos trabalhadores destinatários da protecção constitucional.

31.° O legislador, ao instituir um regime de assistência material para os trabalhadores que involuntariamente se encontrem em situação de desemprego, o qual apenas cobre os trabalhadores vinculados por contrato individual de trabalho (abrangendo, salvo melhor opinião, os contratos de trabalho a termo), deixando de fora alguns trabalhadores da função pública, violou o princípio da igualdade previsto no artigo 13.° da Constituição. Este princípio é, como se deixou entender supra, concretizado no proémio do artigo 59.°, n.° 1, para o caso vertente, ao prever expressamente que todos os trabalhadores têm todos os direitos consagrados no seu articulado.

32.° E essa violação do princípio da igualdade não é menos evidente por, eventualmente, se considerar estar em causa um direito fundamental sem natureza análoga à dos direitos, liberdades e garantias, pois como sustenta Gomes Canotilho «se o legislador actua voluntariamente criando uma certa disciplina legal, então ele fica obrigado a não deixar inconsiderados os casos essencialmente iguais aos previstos no Toibestond legal» (Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador — Contributo para a compreensão das normas constitucionais programáticas, Coimbra, 1982, p. 335).

33.° Nestes termos, poderia parecer indicado recorrer aos mecanismos de fiscalização por acção, como parece enten-