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20 DE JULHO DE 1996

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qualificado como «faute le du service» factos danosos que resultem de ausência, do irregular ou do não oportuno funcionamento de um serviço público que não podem, ou enquanto não podem, ser atribuídos a um comportamento concreto de um qualquer órgão ou agente.

Cófttó refere Jean Rivero (in Direito Administrativo, Almedina, 1981, pág. 319),. trata-se de «deficiências no funcionamento normal do serviço atribuível a um ou a vários agentes da Administração, mas que não lhes é imputável a título pessoal, ligando-se directamente à pessoa pública a que pertence aquele agente».

Com o mesmo entendimento, refiro Freitas do Amaral (in Direito Administrativo, JJI vol., 1989, pág. 502) e Dimas de Lacerda (in Contencioso Administrativo-Responsabilidade Extracontratual do Estado, Associação Jurídica de Braga, pág. 252).

Também a jurisprudência tem feito aplicações deste entendimento. Vejam-se os Acórdãos do STA (in AD n.° 51/ 32\, e 240/1450) e o de 18.03.78 no Proc. 11129, bem como o Acórdão do Tribunal de Conflitos, in Apêndice ao Diário da República de 04.11.75.

E o Decreto-Lei n.° 48051, de 27.11.67 (que, segundo VitaJ Moreira e Gomes Canotilho «na parte em que não for incompatível com a Constituição deverá considerar-se como continuando em vigor» — obra citada) prevê no artigo 8.° a responsabilidade pelos prejuízos especiais e anormais resultante do funcionamento de serviços administrativos excepcionalmente perigosos ou de coisas e actividades da mesma natureza» independentemente do apuramento de culpa de quaisquer titulares de órgãos ou de agentes. '

A responsabilidade funda-se objectivamente no risco da actividade exercida por serviços do Estado.

39.3 — A responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas, por actos de gestão pública, rege-se ainda pelo Dec-Lei n.° 48051 de 21.11.67.

Esta responsabilidade decorre de um facto (acto ou omissão) culposo, praticado por órgão ou agente da Administração no exercício das suas funções e que, por causa desse exercício (nexo de casualidade) ofende (dano) direitos de terceiros ou desrespeita normas legais que visam protegê-íos (ilicitude).

A culpa é apreciada nos termos do Código Civil e os titulares dos direitos ofendidos devem ser indemnizados pelos danos sofridos e provados.

Posto isto, e não obstante não ter agido a Administração segundo critérios de diligência e cuidado pressupostos pela actividade de risco em questão, não deixo de ponderar a questão da determinação de um nexo de causalidade.

Desconhecendo ainda os resultados das autópsias mas considerando provável que entre as causas das mortes figure a intoxicação alumínica crónica ou aguda, é possível desde já estabelecer a alta probalidade daquele nexo entre os problemas da água deficientemente tratada na UH com todas ou algumas das mortes dos IRC assistidos no HDE.

Todavia, se não viesse a ser possível a demonstração de um nexo de causalidade entre as apontadas condutas da Administração e as mortes verificadas 22 IRC bem como as lesões provocadas nos sobrevivos, ficariam estes e os familiares daqueles num posição de manifesta fragilidade.

Neste tipo de casos, vem a doutrina reconhecendo a necessidade de vulnerabilizar o ónus da prova. Como afirma o SINDE MONTEIRO («Aspectos Particulares da Responsabilidade Médica», in Direito da Saúde e Bioética,

Ed. Lex. 1991, Lisboa, p. 147), «podem entender-se que a 'criação de um risco injustificado' ou o 'agravamento dos riscos' culposamente provocados pelo acto médico são um fundamento válido para aligeirar a prova do nexo causal, podendo levar à inversão do ónus».

Todavia, a prova do nexo causal por quem invoca o direito a uma indemnização por actos de gestão pública ilícitos, tomar-se-ia na situação vertente, lenta e demasiado onerosa.

E contudo, face às circunstâncias deve sublinhar-se o posicionamento, em desfavor do Estado, dos seguintes aspectos:

a) A posição débil, de quase sujeição, dos doentes que fazem regularmente hemodiálise, a qual lhes restringe intensamente qualquer domínio de facto sobre os citados actos médicos e sobre os demais actos de gestão pública conexos — impondo, assim, uma necessária cedência da regra geral sobre o ónus da prova, em termos equitativos;

b) O não cumprimento de deveres de cuidado quanto aos riscos inerentes, designadamente a utilização de água da rede não tratada indiciando negligência.

Não pode por isso ficar dependente do apuramento de eventuais culpas dos agentes do Estado a imediata assunção por este, como pessoa de bem que é, da sua responsabilidade pela indemnização das vítimas.

Nem tal assunção prejudica as simultâneas ou posteriores diligências tendentes ao apuramento da existência de actos ou omissões culposas dos indivíduos ao serviço do Estado.

Apurando-se a culpa, haverá então lugar à aplicação do regime do artigo 2.° do Dec-Lei 48051, e eventualmente ao direito de regresso previsto no n.° 2.

Não se apurando culpas individuais, aplicar-se-á integralmente o princípio da existência de «faute du service» ficando o Estado como único responsável perante as vítimas.

39.4 — A tudo isto ainda poderá acrescer a responsabilidade por omissão quanto à não publicação de normas regulamentares ou legislativas que determinassem a aplicação de conhecimentos científicos, técnicos e de apoio logístico adequados à correcta e segura prestação de assistência médica.

A ideia de responsabilidade do Estado por omissões legislativas ou regulamentares, mesmo fora do âmbito da inconstitucionalidade por omissão, encontra suporte no artigo 22." da Constituição. Nesse sentido, pode afirmarle, com Rui Medeiros (in Ensaio sobre a Responsabilidade Civil do Estado por Actos Legislativos, Liv. Almedina, Coimbra, 1992, p. 353, que:

Os danos devem ser imputados à Administração quando o órgão ou agente administrativo goza de liberdade na fixação do conteúdo do acto ou regulamento ou pode, inclusivamente, não o emitir. Assim, havendo discricionaridade da escolha ou da decisão, o lesado pode fundamentar o seu pedido de indemnização não só na Constituição, mas também nos preceitos legais que regem a responsabilidade objectiva da Administração.

39.5 — O meio processual adequado ao estabelecimento do direito e do valor da indemnização decorrente da