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13 DE DEZEMBRO DE 1996

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pedi ao Dr. Luís Francisco Rebelo que me desse algumas informações (aliás, foi a primeira vez que a Sociedade Portuguesa de Autores foi obrigada a fazer esse estudo, porque nunca se tinham lembrado disto) e vou deixar aqui um número que, realmente, é preocupante e atesta bem o que é a área dos criadores, dos autores, dos escritores, dos pintores, etc. — em matéria de direitos de autor, 65% dos cerca de 14 000 inscritos na Sociedade Portuguesa de Autores, recebem anualmente, menos do que um salário mínimo! Isto significa que dois terços dos nossos criadores, nas mais vastas áreas, recebem uma média de quatro contos por mês! Isto é um número que aterra qualquer pessoa! Na outra ponta, existem 6% que recebem anualmente mais de 1000 contos; isto é, uma pessoa que receba, por hipótese, 1200 contos por ano, recebe cem contos por mês — e estes são os tais 6% dos grandes criadores, dos grandes escritores, dos grandes músicos! Obviamente que há excepções, obviamente que não está aqui incluído um José Saramago ou um Herman José — mas esses são o tal 0,5% que lá existe. Mas 6% e apenas 6% ganham anualmente mais do que 1000 contos. Portanto, quando se fala de apoio à criação, temos de saber em que terreno é que estamos a trabalhar porque temos de saber que estamos a trabalhar com estes criadores e com estas condições de trabalho — não estamos a trabalhar, como acontece noutros países, numa situação em que estes apoios sejam mais impulsos do que propriamente apoios de base; aqui, trata-se de apoiar quase para sobreviver.

São questões muito práticas que penso que estão nas preocupações latentes do Governo mas, às vezes, não estio nas preocupações do dia-a-dia porque há muita coisa que se decide bem gerindo mal. Voltando à questão da guitarra portuguesa, sendo o dinheiro pouco, se me derem a escolher entre fazer um grande apoio à guitarra portuguesa ou encomendar uma ópera ao Philip Glass, obviamente que o Philip Glass fica na lista de espera!

Eu terminaria por dizer o seguinte, Sr. Ministro: tive a felicidade de conhecer o Jacques Lang, estive várias vezes com ele, designadamente quando estive na televisão, e, para acentuar e sublinhar aquilo que há pouco foi dito, se hoje se for a França perguntar aos franceses qual é o Ministro dos últimos 15 ou 20 anos de quem eles se lembram, eles dizem «Jacques Lang» e, antes, lembravam-se do André Malraux; o que eu desejaria ao Sr. Ministro é que, daqui a 15 ou 20 anos, quando perguntassem aos portugueses quem era o Dr. Manuel Maria Carrilho, eles soubessem quem era.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Presidente (Henrique Neto): — Tem a palavra a Sr." Deputada Maria Luísa Ferreira.

A Sr.° Maria Luísa Ferreira (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, desiludidos pelas expectativas criadas, consideramos fraca a aposta feita no sector da cultura. De facto, consideramos insuficiente o reforço deste Orçamento do Estado, ao contrário do Sr. Ministro que, por aquilo que ouvimos há pouco, o considera bastante, quiçá mesmo invejável para outros países da Europa, com realidades com certeza bem diferentes da nossa. Quanto aos documentos de análise que têm vindo a ser-nos apresentados pelo Governo, alguns mesmo entregues nos últimos minutos e com números sucessivamente alterados, outras com análises comparativas que não consideram os fundos comunitários, registamos o seu pouco rigor e fiabilidade.

Assim acontece, por exemplo, em relação às dotações propostas para as Delegações Regionais do Alentejo e Algarve que, apesar de substancialmente inferiores ao total global de 1996, são-nos apresentadas como tendo um aumento de 100%.

Sr. Ministro, de 1996 conhecemos nós os fundos comunitários e as respectivas contrapartidas nacionais, mas nada vemos sobre contrapartidas nacionais para 1997. Por que razão, Sr. Ministro, não as considerou?

Ainda no tocante a delegações regionais, vai ou não ser reforçada a intervenção destes organismos, tendo em vista as suas novas competências orgânicas? Que actividades vão elas desenvolver? Qual vai ser o seu papel?

O Sr. Presidente (Henrique Neto): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques.

O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): — Obrigado, Sr. Presidente.

Sr. Secretário de Estado, Sr. Ministro: Quero fazer algumas considerações um pouco gerais, já que a hora vai adiantada e a minha tentação seria mais convidar todos para irmos jantar. Não que eu tencione pagar-vos o jantar, mas, enfim...

De qualquer maneira, quero só sublinhar que, contrastando com o debate de orçamentos de outros anos, o debate do deste ano subiu de nível, nomeadamente no que se refere aos contributos dados pelos membros do Governo. Sente-se que existe agora a visão de um projecto adoptado e a prosseguir, que existem, naturalmente, divergências por parte das diversas forças aqui representadas, que existem pontos de vista que talvez sejam controversos, mas que existe também consistência, e esse aspecto importa ser aqui realçado no seu contraste, como disse, com os debates de anteriores orçamentos em anteriores contextos.

De qualquer modo, penso que numa perspectiva de futuro quanto ao que importa fazer tanto no âmbito da política cultural como no quadro do interesse nacional, convém que nos libertemos de heranças do passado, não só de heranças do ponto de vista administrativo ou financeiro mas também das que dizem a concepções, a visões das coisas, das políticas e da própria cultura, no contexto da sociedade em que vivemos. E esse libertar de heranças também passa por nos libertarmos de outras heranças que, por vezes, até são externas à nossa própria realidade nacional.

Passaram novamente por aqui os fantasmas do André Malraux e do Jacques Lang. Eu estive a semana passada em França, onde o André Malraux estava bastante «badalado» — tudo o que ele escreveu está a ser reeditado —, e li até um artigo no Le Monde que fazia um balanço, fundamentado em números, do que foram tanto a acção do André Malraux como a do Jacques Lang. Obviamente que o André Malraux correspondeu a um tempo, a uma conjuntura, a um determinado contexto histórico e cultural em França, um país que, aliás, tem as suas características próprias, assim como o Jacques Lang.

Srs. Deputados, convém que, cada vez mais, consigamos reflectir em torno das nossas especificidades nacionais, o que não quer dizer que não tenhamos muito a aproveitar neste domínio — antes pelo contrário — com as realidades de outros países.

Neste sentido, uma das coisas que, em minha opinião, importa aqui superar, é a visão — e eu que acho que ela ainda predomina — de que quando se fala da política cul-