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II SÉRIE-C — NÚMERO 16

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pode também ser assim? Por outro lado, é evidente que uns têm mais capacidade de socialização do que outros.

Portanto, o que parece ser uma medida igualitária pode ser discriminatória”.

No final refere a educação para a cidadania e a necessidade de “seduzir” os professores, e diz “Em relação

ao kit que fiz com a AMUCIP — o kitRomano Atmo —, ele carece de formação e de sedução — de um processo

de sedução como eu fiz com as crianças de rua. O processo de sedução não pode ser impingido, tem de ser

um processo de sedução dos professores, porque às crianças, «tudo o que lhes é dado com embrulho de

rebuçado elas engolem». É preciso saber que a formação dos professores, nesta área, ficou muito penalizada

desde que a formação passou a estar centrada nos créditos da matemática, da língua portuguesa e das ciências.

A cidadania (…) Pronto! Isso ficou… Essas formações não são acreditadas pelo Ministério da Educação, só é

acreditado o que é disciplinar. Antigamente, nós fazíamos formação, pelo menos o ICE (Instituto das

Comunidades Educativas) fazia formação, nessa linha da cidadania, da participação, da interculturalidade, e

isso era creditado. Neste momento não é. Logo, por mais que queiramos fazer as coisas, temos este calcanhar

de Aquiles pela frente. Porque, para seduzir para a formação intercultural é preciso que os professores queiram

participar e, em troca, só o fazem se têm créditos para subir na carreira. É assim que está a funcionar o mercado

da educação”.

 Maria do Rosário Carneiro, Professora da Universidade Católica

No início da sua intervenção, após uma referência ao trabalho desenvolvido na Assembleia da República no

qual esteve envolvida, em que abordou o antes e o após acontecimentos de Vila Verde em 1995, diz sobre as

comunidades ciganas “Aquilo que eu continuo a constatar é que nós continuamos a saber muito pouco sobre

uma comunidade que é portuguesa. De facto, são objeto de discriminação racial, mas são portugueses, não são

estrangeiros”.

Refere ainda, sobre a recolha de dados “(…) nós não sabemos quantos ciganos portugueses vivem em

Portugal. Nós só conhecemos os ciganos pobres. Estes têm dois tipos de problemas relativamente à sua

discriminação. Em primeiro lugar, a circunstância de serem pobres e, em segundo lugar, o facto de pertencerem

a uma etnia específica. Portanto, isto não está dissociado”.

Diz ainda “Também penso que, relativamente a esta comunidade e à forma como sobre ela intervimos, para

além de não sabermos muito bem quantos são, também não sabemos muito de como são. Penso que

continuamos a fazer intervenções, e não são só intervenções políticas, são também estudos, muitos estudos,

feitas com base em soluções generalistas. Naquilo que eu penso que sei do outro, naquilo que eu penso que o

outro precisa e naquilo que eu penso que o outro é. Nunca o outro. Isto enviesa completamente, porque fazer

uma política ou definir um modelo de intervenção para uma comunidade, sem que ela esteja lá, na presunção

daquilo que ela precisa, com base em estatísticas, é a condenação ao insucesso”.

Pobreza e exclusão social

Maria do Rosário Carneiro introduz na sua intervenção a dimensão da pobreza como fator de exclusão destas

comunidades referindo: “A discriminação de que a população cigana portuguesa é alvo, não tem só a ver com

características culturais ou étnicas. Tem também a ver com a sua circunstância de exclusão socioeconómica.

São pobres, e aqueles que nós conhecemos são os mais pobres dos pobres, porque têm a sua fragilidade

económica acrescida de uma circunstância marcante de diversidade, que é a sua marca étnica, que nós

poderemos dizer — com alguma perspetiva de auto preservação de um grupo que se sente excluído — que se

fecha e que se reforça na sua invocada cultura própria. Portanto, temos aqui um problema muito complicado,

muito complexo. Não se trata de uma mera discriminação de natureza racial e étnica. A verdade é que também

é isso, mas tudo isto acontece porque existe esta outra circunstância da sua extrema pobreza. Isto porque,

relativamente aos ciganos que não são pobres, nós não sabemos nada”.

Reforça esta ideia de que só conhecemos os ciganos pobres dizendo “Quando foi feito o relatório de 2009,

lembro-me que identificámos, para efeitos desta população que era objeto de discriminação e desigualdade,

aqueles que tinham rendimento social de inserção, que tinham problemas de escolaridade e que tinham

problemas com a justiça, e estavam nos 23 000, 24 000, 25 000. Nós sabemos que, de acordo com uma

estimativa estatística que é feita, mais ou menos estável, andará pelos 50 000 ou 60 000. Portanto, onde está a

outra metade? É também bom precisarmos isto. Não é toda uma comunidade que é objeto desta discriminação

e de racismo. É uma comunidade específica, que é pobre, que tem características étnicas e culturais, mas é

pobre, não tem capacidade de autodefesa nem de inclusão”.