Depois, fez-me um processo de intenções, fez-me notar que tinha havido uma reunião no dia 5 de Julho, em que eu poderia ter colocado esta matéria à discussão e eu não o fiz, nem sequer estava preparada, nem fazia parte da ordem de trabalhos, e fez-me notar que iria ser marcada uma nova reunião do Conselho de Coordenação Operacional - como foi, no dia 16 de Julho - para discutir esta matéria.
Senti-me completamente desautorizada por isto - aliás, já tinha posto a hipótese da minha demissão em meados do mês de Junho, a propósito de um incidente semelhante, e como não podia passar a vida a andar a pedir a demissão guardei para a reunião do dia 16 a minha posição a esse respeito.
Nessa reunião do dia 16 pedi mais uma vez ao Sr. Director Nacional que me libertasse do meu compromisso, tendo feito notar que a Polícia Judiciária poderia vir a pagar um preço muito elevado por aquela necessidade que ele parecia demonstrar de se demarcar da minha pessoa, uma vez que tanto me tinha defendido, parecia obrigado a demarcar-se de mim constantemente.
O Sr. Director Nacional não deu relevância a este meu pedido, passou à frente, nem sequer considerou e tivemos uma reunião em que se discutiu tudo e mais alguma coisa - questões supérfluas -, mas, no fundo, aquilo que eu pude concluir é que havia da parte do Sr. Director Nacional uma má interpretação acerca do papel e função das direcções centrais.
De facto, havia a ideia da parte do Sr. Director Nacional que as direcções centrais punham em causa as competências das direcções regionais e dos serviços regionais de uma forma que eu não compreendia o que é que ele queria dizer com isso, porque as centrais são a resposta temática de combate ao crime organizado e as direcções centrais não põem em causa a coordenação entre a Polícia Judiciária, até porque tem de haver coordenação com a especialização em relação ao crime organizado internacional.
De maneira que eu não percebi; ou melhor, percebi que havia ali uma má vontade em relação às direcções centrais e aos mecanismos de centralização funcional da informação, por parte das direcções centrais, que é a única maneira de combater com impacto o crime organizado internacional.
Nesse dia 16 sei que foi dia 16, porque no dia 15 tive uma reunião do grupo GRECO (um grupo de Estados contra a corrupção) e portanto não pôde ser a reunião no dia 15 - a reunião prolongou-se até às 14,30 horas, mais ou menos, até tarde e quando eu ia almoçar com os meus colegas, sou chamada através de um colega para ir ao quarto andar falar com o pelo Sr. Director Nacional, sendo que estavam também presentes, o Sr. Dr. José Branco e Dr. João Vieira.
O Sr. Director Nacional deu-me a entender já não me lembro das palavras exactas - que teria acabado de receber telefonema da Sr.ª Ministra da Justiça e era essa a razão de ele me chamar. Esse telefonema da Sr.ª Ministra da Justiça também estaria ligado a um pedido de esclarecimento do Dr. Paulo Portas e era também essa a razão pela qual ele me estava a chamar, sendo que esses esclarecimentos tinham que ver com uma coisa que eu não percebi, até porque estava cansada, era tarde e não tinha almoçado, mas que levaram o Sr. Director Nacional a perguntar-me quem era o homem que andava em Monsanto.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - "Andava em Monsanto", acompanhava o processo, já se está a ver.
A Sr.ª Dr.ª Maria José Morgado: - Sim. Mas a expressão foi essa.
Eu não percebia nada, pedia mais explicações. Senti-me algo confusa e depois de mais explicações foi-me dito que haveria alguém da DCICCEF que andava em Monsanto e acompanhava o Ministério Público e não sei quê, isso não podia ser, dava problemas… E foram-me dadas instruções verbais não escritas, verbais! - e o Dr. José Branco e o Dr. João Vieira estavam presentes - para ninguém da DCICCEF ir a Monsanto. Ninguém!
Eram instruções verbais que tinham a ver porventura com o apoio logístico que se estava a dar ao Ministério Público, que tinham a ver com a ida do Pedro Albuquerque, que era segurança do secretariado da direcção e também meu segurança e o homem que me acompanhava sempre - aliás, até o mudaram de serviço a seguir à minha saída da Polícia Judiciária. É um homem de uma dedicação notável e de uma intuição policial fora de série que apoiou a investigação do caso Moderna.
Como é tradicional, e nós estamos em condições de o fazer, a Polícia Judiciária costuma coadjuvar os magistrados do Ministério Público nos megaprocessos. Aconteceu isso no caso FP 25, como o Dr. Adelino Salvado sabe; aconteceu no processo das FP 27, o qual correu paralelamente ao das FP 25, em que fui titular da acção penal e fui coadjuvada por uma equipa da DCCB, que não me largava; aconteceu no processo do Vale e Azevedo, em que o Ministério Público foi coadjuvado pela Polícia Judiciária. Enfim, aconteceu em muitos outros processos classificáveis de megaprocessos.
É uma tradição na Polícia Judiciária dar apoio logístico ao Ministério Público, além de que também tem a ver com o feed-back do julgamento, com a recolha da informação, com a análise dos resultados e não tem a ver - não foi essa a dimensão da recomendação, chamemos-lhe assim, ou da instrução verbal do Sr. Director Nacional - com: "Não quero a presença de testemunhas do processo Moderna em julgamento".
Sou magistrada com muitos anos de experiência, não sou principiante, não era um erro desses que eu estava a cometer. Não havia nenhuma testemunha do caso Moderna presente em Monsanto e, muito menos, na sala de audiências de julgamento. Tinha havido era algum apoio, embora fosse fraco - com pena minha, porque gostaria de dar um apoio maior ao Ministério Público, tinha muito orgulho em poder dá-lo - e até disse ao Ministério Público: "Lamento imenso, estamos com falta de meios, mas vou pedir ao meu segurança que o leve durante a primeira semana de julgamento e que lhe dê esse apoio". Foi uma iniciativa minha, com muito orgulho, com muito gosto.
Vi que, meses depois, essa iniciativa suscitou preocupações, pedidos de esclarecimento e uma instrução, que não era para confusões, da parte do Sr. Director Nacional, que disse: "Não quero ninguém em Monsanto". Era estar em Monsanto a acompanhar o Ministério Público, a coadjuvar, não era na sala de audiência, não tinha a ver com cautelas em relação à produção de prova - e chamo a atenção para o facto de o Ministério Público poder pedir a coadjuvação da Polícia. Por exemplo, no processo da UGT eu própria determinei a coadjuvação do magistrado de julgamento para a notificação das testemunhas. É algo que é prática na Polícia.
O Sr. Alberto Martins (PS): - Está na lei orgânica.