De facto, isso estava previsto mas não faço ideia sequer se o Dr. Adelino Salvado sabe isso ou não, porque, como digo, ele mostrou sempre pessimismo a respeito desse processo. Disse-me que achava que este processo não ia dar nada! É claro que estes são processos terríveis, são do mais difícil que há, suscitam oposições de toda a parte e se não há apoio de um director nacional nesta matéria é o desanimo!
Não sou muito dada a desanimos, mas, de facto, que ele me disse, a mim, que achava que o processo não ia dar nada... Pronto, é uma opinião! Até pode ser que não dê nada! Só a evolução da investigação o demonstrará. Porque, quando me pediram para pedir a demissão, ninguém me deu aquilo que o Sr. Director Nacional pediu aqui, na 1.ª Comissão, na Assembleia da República, que foi tempo. Eu não tive tempo!
Estava num princípio de trabalho, estava a ensaiar novos métodos, que nunca se tinham ensaiados neste país, porque aquilo que se está a fazer no crime económico só se fazia no tráfico de droga e no banditismo, nunca se fez no crime económico. Nunca houve operações com recolha de prova, com buscas e com detenções. Nunca! E nós fizemos mais de 100 detenções na DCICCEF, todas, todas consideradas legais e confirmadas pelos juizes de instrução criminal.
As buscas foram todas confirmadas pelo juiz de instrução criminal, não houve um fragmento de qualquer diligência que tenha sido considerado irregular, tão pouco, para já não falar de ilegal!
E, mais: conseguiu-se, em menos de um ano, julgamentos de fraudes gravíssimas como o caso Vale e Azevedo, que era um símbolo de impunidade neste País, como o caso de fraude ao IVA em carrossel, que é dos processos mais difíceis que estiveram em tribunal neste país e que houve condenação em Junho. Isto consegui-se em menos de um ano!
Alguma coisa isto deve querer dizer, apesar de tudo! É claro que não fiz metade daquilo que me propunha fazer, aquilo que foi feito foi muito pouco, mas houve de facto uma viragem, houve uma mudança e houve uma percepção disso por parte da opinião pública. Houve prestígio para a Polícia Judiciária!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Neto.
O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Dr.ª Maria José Morgado, permita-me que, em primeiro lugar, a cumprimente e agradeça a sua colaboração nesta Comissão de Inquérito, com vista ao esclarecimento, como disse, e bem, da verdade e só da verdade, no caso a verdade material e não a verdade formal, e muito menos a dita verdade parlamentar.
Deixe-me dizer-lhe desde já, numa primeira abordagem desta questão, que nós também partilhamos da observação feita a dado passo da sua exposição, de que a questão central que deveria aqui ser discutida era de facto a questão do combate eficaz ao crime económico-financeiro e ao crime organizado. Essa é que é a questão central! As linhas estratégicas desse combate é que deveriam estar aqui a ser discutidas e não, como manifestamente ocorre, aqui e acolá, questões marginais, espúrias, e muitas delas eivadas de mera conjectura e de mera especulação e, como tal, indemonstráveis.
Aliás, en passant, deixe-me dizer-lhe que por duas vezes fez referência ao facto público e notório, represtinando uma observação que já tinha feito na 1.ª Comissão, aquando da sua passagem aí, há um mês atrás, mas ao contrário daquilo que afirma, que o facto público e notório não precisa de ser provado - na verdade, está ali um colega meu que aprecia muito estas citações, há um brocardo latino que diz notoria non est probatione, ou seja, os factos notórios não precisam de prova -, este facto concreto, que V. Ex.ª apoda, a meu ver irroneamente, de facto público e notório, não o é, porque tem de ser provado.
Quando V. Ex.ª diz que a Sr.ª Ministra da Justiça não a via com bons olhos, ou que a Sr.ª Ministra da Justiça e o Sr. Dr. Paulo Portas tinham medo de V. Ex.ª, far-me-á a justiça de admitir que esta matéria não está provada por natureza, necessita de prova, manifestamente não é um facto público e notório.
Esta é apenas uma observação marginal, mas que obviamente tem relevo no contexto da sua intervenção, que, aliás, apreciei, deixe-me dizer-lhe, até porque boa parte dela está manifestamente eivada, citando Vitorino Nemésio "de uma abundância de alma". Ou seja, aquilo que V. Ex.ª expressa aqui, estou em crer, é exactamente aquilo que V. Ex.ª sente e pensa relativamente àquele que é o caminho, a via a trilhar pela Polícia Judiciária com vista à eficácia do combate ao crime económico-financeiro e ao crime organizado. Não tenho sobre isso a menor dúvida e não tenho qualquer pejo em afirmá-lo com toda a seriedade e frontalidade!
Mas vamos às questões concretas que lhe queria colocar e, desde logo à primeira, aquela que se antolha evidente e incontornável, que é, de facto, o fio condutor das razões que enformam a sua demissão da direcção da DCICCEF.
Manda a verdade dizer que, numa primeira fase, quiçá um pouco pressionada pelas contingências ocasionais desse mesmo dia, V. Ex.ª começa por enviar, da Junta de Turismo da Ericeira, um fax ao Sr. Director da Polícia Judiciária apresentado a sua demissão.
Aliás, é curioso constatar - e esta análise, ou psicanálise, não é de todo em todo irrelevante - que até no próprio texto da carta se nota alguma pressão da parte de V. Ex.ª na elaboração do referido texto, posto que corrige por duas vezes o próprio termo da demissão, começando por dizer "venho (e depois corta o "venho") apresentar a de (e depois corta o "de) demissão", o que significa ou indicia - e para quem anda no mundo direito estas questões têm relevo, e eu prezo-me de andar há muito neste mundo e ter a preocupação de perceber muitas vezes o que é que subliminarmente decorre do conteúdo das mensagens - uma situação de alguma pressão da parte de V. Ex.ª na elaboração dessa carta de demissão.
O que é facto é que ela é absolutamente clara e inequívoca relativamente ao seu conteúdo, que é, pura e simplesmente, a demissão das funções de directora da DCICCEF, e a jusante, dois dias depois, aí com certeza com alguma detença - citando agora Saramago -, com alguma ponderação e reflexão, V. Ex.ª reitera o teor desse mesmo fax, mas agora com particular percuciência relativamente às razões fundamentadoras da sua demissão. E quais são elas? Desde logo - repare-se neste detalhe - única e exclusivamente razões de estratégia operacional respeitantes à organização desta Direcção Central. Há aqui um cuidado particular de V. Ex.ª de eliminar qualquer tipo de especulação ou de conjectura, como hoje aqui se procura joeirar, à vol d'oiseau, dizendo que é única e exclusivamente por questões de natureza, de estratégia operacional respeitantes à organização desta Direcção Central.