Portanto, do meu ponto de vista, a reflexão sobre a questão dos notários e dos actos notariais tem também que ver com este outro tipo de organização, que, nesta altura, se coloca à disposição e que, penso, valia a pena ser encarado em conjunto. Ou seja, julgo que valia a pena reflectir em conjunto sobre estas duas matérias, antes de se tomar uma solução definitiva.
Em terceiro lugar, Sr. Ministro, gostaria de lhe falar sobre a questão das cadeias. No PIDDAC, há dois números que são interessantes e, ao mesmo tempo e de certa maneira, chocantes. V. Ex.ª reserva para a construção de tribunais uma verba da ordem dos 6 milhões de contos e para a construção das cadeias uma verba da ordem dos 12 milhões de contos, isto é, vai gastar em cadeias o dobro do que vai gastar em tribunais.
O Sr. Ministro da Justiça: - Não é verdade!
O Orador: - Estou a fazer-lhe uma pergunta, Sr. Ministro. É que se o seu pensamento em relação a algumas das áreas da reforma da justiça está de acordo com aquilo que V. Ex.ª diz nessa entrevista, não sei se os números do Orçamento são justificados ou não. Isto porque V. Ex.ª diz, a dado passo da sua brilhante entrevista, que as pulseiras magnéticas, por exemplo, vão ser utilizadas não só para aquilo que o senhor e a lei que foi aprovada queriam mas também por todos aqueles que V. Ex.ª entender que possam utilizá-las, diminuindo, assim, a frequência das prisões.
E se, por outro lado, o Sr. Ministro também tem iniciativas, iniciativas que são propostas ao nível da discussão geral, de descriminalização do consumo de droga, V. Ex.ª também terá de contar certamente com a diminuição populacional nas prisões. Donde, a minha pergunta: afinal, vai gastar 6 milhões de contos em tribunais e 12 milhões de contos em cadeias? Justificar-se-á isto, ou não, em função daquilo que parecem ser pensamentos discordantes de V. Ex.ª em relação ao futuro próximo e à capacidade de interferir nesse futuro próximo?
Por último, Sr. Ministro, quero fazer-lhe uma pergunta numa área em que também julgo haver alguma confusão, para que eu possa estabelecer a bissectriz de duas posições governamentais. Trata-se da questão do endividamento.
V. Ex.ª apoia a iniciativa do Sr. Secretário de Estado para a Defesa do Consumidor, da intervenção do Estado quanto aos problemas de endividamento das famílias? Acha esta solução praticável? Ou entende que deve seguir-se outra via, próxima de algo que também refere na sua entrevista em relação aos conflitos de consumo? É que são duas soluções completamente diferentes uma da outra. Qual é que V. Ex.ª apoia verdadeiramente? Uma ou outra? Ou ambas? E, sendo ambas, o que é que isso significa em termos de encargos do Estado, ao nível do Orçamento, para realizar essas duas pretensões, no caso concreto, de um Secretário de Estado e de um Ministro?
Por último, Sr. Ministro, quero fazer-lhe uma pergunta, se me permite, de âmbito local, da minha pequena terra, que já fiz em requerimento escrito dirigido a V. Ex.ª - aliás, em lugar de uma, vou fazer-lhe três perguntas, porque acho pouco, para a dimensão de Ministro que V. Ex.ª é, colocar-lhe apenas a pergunta, já repetida, do tribunal de Coimbra. Assim, far-lhe-ei não só a pergunta sobre o tribunal de Coimbra mas também outras duas: uma, sobre as novas instalações da Polícia Judiciária e, outra, sobre a questão, já celebérrima, da Penitenciária de Coimbra.
Como vê, também aqui lhe deixo algumas perguntas, muito sérias, sobre problemas que, apesar de há muito existirem, ainda não estão resolvidos, mas que todos certamente gostaríamos que estivessem.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Menezes Rodrigues.
O Sr. António Menezes Rodrigues (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Justiça, Srs. Secretários de Estado, devo confessar que fiquei entusiasmadíssimo com essa atitude e essa cruzada, que apoio de uma forma indefectível, contra a burocracia perfeitamente dispensável. Devo dizer que, das centenas de escrituras que já fiz, uma das coisas que me deixou sempre sem apetite para repetir foi o facto de o notário vir, à partida, com a factura já feita, ou seja, já vinha a factura, antes de vir o "prato principal", o que significa "pagar a conta antes de comer" e revela uma determinada cultura. Cultura esta que se revê, quando, em 1994, por pressão de uma directiva comunitária, provavelmente fundada em soluções de unidroit, a nossa ordem jurídica teve de acolher a figura da injunção. Tive oportunidade de dialogar com a Secretária de Estado da altura sobre o assunto, dizendo-lhe do nosso entusiasmo quanto a este instrumento para solver uma quantidade de problemas, ao que ela me respondeu: "pois, mas…". E, mais tarde, vim a perceber a enorme resistência passiva a essa figura da injunção, uma simplificação positiva para a solução dos problemas.
Mas o Sr. Ministro tem a sorte de não ser posto aqui em causa por ter, de algum modo, soluções despesistas neste Orçamento - e é em sede de Orçamento que temos esta conversa. Aliás, ainda há pouco, um Sr. Deputado que aqui teve oportunidade de se pronunciar referiu que este universo da justiça é capaz de ser um bom negócio, porque tudo se mede, digamos, nas vantagens da cobrança aos utentes.
A esse propósito - e, agora, falando mais a sério -, gostava de saber - e esta é a minha pergunta -, o seguinte: tendo em atenção o longo curso do nosso processo, com uma arquitectura excessivamente barroca, que faz com que, quando o processo "vai à conta", a máquina de calcular nunca mais acabe, será também essa uma razão para que a vontade dos agentes do sistema judiciário os leve a promover os bottle-neck que existem no nosso processo judiciário?
O Sr. Ministro teve, por acaso, oportunidade - tê-lo-á pensado seguramente - de promover um cálculo por cada diminuição de um passo do processo perfeitamente dispensável face aos dias de hoje, onde tudo é muito mais célere e as coisas são muito mais prováveis? Isso implicaria quanto de diminuição de custo de recursos? De recursos do próprio sistema, que, no fundo, é o que faz o Ministério da Justiça - é administrar os meios da justiça.
A Sr.ª Presidente: - Dado que não há mais nenhum Sr. Deputado inscrito para pedir esclarecimentos, tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro da Justiça.
O Sr. Ministro da Justiça: - Sr.ª Presidente, se o Sr. Deputado Marques Júnior estiver de acordo e se a Sr.ª Presidente o permitir, pediria ao Sr. Secretário de Estado Adjunto que, a seguir, respondesse à questão sobre o tribunal judicial de Melgaço.
Começo, assim, por responder ao Sr. Deputado António Menezes Rodrigues, cujas palavras simpáticas agradeço,