Ao nível das despesas de capital, operam-se depois todos os milagres para se poder conter, obviamente, o défice no mínimo valor possível. Isto é, há um mês, os senhores tinham previsto para este ano um crescimento das despesas de capital (do investimento) de 16,3%, mas acontece que, cumpridos 10 meses do ano - já só faltam dois, e eu quero perceber qual é o milagre que se vai passar nestes dois meses! -, as despesas de investimento, as despesas de capital, cresceram 1,9%. Isto é, estão a poupar cerca de 300 milhões de contos, pelo dados que temos da execução orçamental até Outubro - enfim, se têm algum "coelho para sacar da cartola",…
O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Uma lebre!
O Orador: - … gostaria que o demonstrassem nesta Câmara para podermos mudar de opinião. Mas, realmente, até agora, aquilo para que aponta a evolução do investimento público é um crescimento "raquítico", face ao que se verificou no ano passado, e uma poupança de 320 milhões de contos, face ao que estava orçamentado. Isto significa, em termos práticos, que no próximo ano os senhores propõem fazer aqui um milagre, que é a multiplicação do investimento público, porque já não vão crescer apenas 15,8% face à estimativa que apresentaram há um mês, mas, a cumprir-se este Orçamento, os senhores estão a propor-se crescer 30% face ao que vai ser a realidade provável deste ano.
Sr. Ministro, face aos dados que foram apresentados pelo Ministério das Finanças em tempo oportuno - e faço-lhe justiça a esta pontualidade -, gostaria de saber quem é que ganha com a manutenção destes números no Orçamento do Estado para 2002. Não creio que o Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado acreditem que tecnicamente é possível cumprir aquilo que estão a propor aprovar nesta Câmara! Quem é que ganha com a aprovação deste Orçamento que não tem a mínima das credibilidades? É o País? Repito, quem é que ganha? Gostaríamos de perceber quem é que vai ganhar com a aprovação deste Orçamento que contempla aumentos de despesas de pessoal que estão próximos do zero e aumentos das receitas em IRC que estão próximas de 15%, caso se mantenha o padrão de execução orçamental verificado até Outubro.
Gostaria também de saber o que é que os senhores têm preparado em termos de gestão orçamental para fazer face àquilo que para os senhores, provavelmente, ainda é uma incerteza, mas para nós, CDS-PP, é mais do que certo. Isto é, as receitas, do ponto de vista orçamental, no próximo ano, estão mais do que sobreavaliadas. Não vai ser possível atingir o nível de receita fiscal que está prevista, as despesas com pessoal vão crescer muito mais do que aquilo que está previsto e, portanto, face a este cenário, admito que para nós seja uma certeza, mas para o Governo ainda seja apenas uma incerteza, uma hipótese.
Gostaria, pois, de saber qual é o cenário de contingência que esta equipa ministerial tem previsto. Isto é, se as receitas não forem atingidas no próximo ano e as despesas, nomeadamente com pessoal, crescerem mais do que aquilo que os senhores prevêem, o que é que vão fazer? Vão voltar a cortar significativamente nas despesas com capital? Ou vão fazer apresentações regulares trimestrais de Orçamentos rectificativos de forma a arruinar de vez a credibilidade das finanças de Portugal? O que é que vão fazer? Penso que é fundamental trabalhar um cenário orçamental, mas estar preparado, face à incerteza que estamos a viver, para alguns cenários de contingência.
Ora, gostaríamos de perceber o que é que vai na mente do Governo em termos de contingência se as receitas não crescerem aquilo que está previsto e as despesas crescerem muito mais do que aquilo que os senhores orçamentaram.
Finalmente, gostaria de me debruçar sobre o tema das despesas com o pessoal de uma forma mais específica, tema que já foi abordado, nomeadamente pelo Deputado Francisco Louçã. Nós estamos muito preocupados, e temo-lo manifestado nesta discussão orçamental, com o nível que atingiram as despesas com o pessoal da Administração Pública em Portugal, e suponho que esta preocupação está generalizada ao nível desta Câmara, nomeadamente ao nível desta equipa das Finanças.
Portugal tem um gasto com pessoal na Administração Pública, sendo que, no ano passado, superou os 15% do PIB. Ora, a média europeia ronda os 10%. Poderíamos pensar que os países do sul teriam uma tendência excessiva para gastarem em pessoal, mas não, pois a Grécia gasta 11,7% do PIB em pessoal, a Itália gasta 10,5% e a Espanha gasta 10,3%. Portugal demarca-se claramente daquilo que é a média de gastos com pessoal na Administração Pública dos países do sul. Podíamos pensar que temos este gasto de 15% por ser um País pequeno. No entanto, há um país, que é a Dinamarca, que nos ultrapassa e também é um país pequeno, mas, quando comparado com outros países pequenos, verificamos que esta é uma situação específica de Portugal. Mais uma vez, a Grécia tem 11,7%, a Holanda tem 9,8% e a Irlanda - um exemplo que lhes custa sempre muito ouvir - não atinge sequer os 8%.
Penso que qualquer política de controlo da racionalização da despesa pública passa, necessariamente, por encarar de frente o problema da racionalização das despesas com pessoal na Administração Pública, porque, em média, estamos a gastar mais de 1000 milhões de contos por ano do que aquilo que ganham os nossos parceiros comunitários neste tipo de rubrica.
Aquilo que gostaríamos de saber - e já manifestámos a nossa incredibilidade face aos objectivos que estão estipulados para o Orçamento para 2002 (crescimento de 3%) face à própria execução orçamental verificada até Outubro - é como é que este aumento de 3%, que, na prática, pode até ser de 0%, se vai organizar em termos práticos no próximo ano. Isto é, para quanto é que vai ser reduzido o efeito wage drift que, nos últimos anos, tem andado sempre entre os 4% e os 7%? Qual é que vai ser o efeito, suponho que negativo, da reclassificação e das promoções de carreiras?
O efeito-preço já sabemos que vai ser, pelo menos, de 3%, porque, ao aumentarem o efeito do aumento dos salários em termos de preço, vai ser esse o valor, pois não acredito que, face àquilo que são as notícias e as declarações do Ministério das Finanças, os senhores se proponham aumentar nominalmente menos de 3% os funcionários públicos.
Aquilo que gostaria da saber é o seguinte: para atingir este "milagre das rosas", que é conseguir manter a despesa com pessoal com um crescimento entre 0% e 3% - 3%, se a execução orçamental, de repente, só crescesse 7% até ao final do ano em termos de despesas com pessoal, isto é, caso se corrigisse este padrão anormal até Outubro -, o que é que os senhores estão a pensar fazer em relação àquilo que se poderia chamar o efeito-volume? Isto é, ao nível do número de funcionários públicos, o que é que se vai passar? Quantas pessoas é que se vão reformar na Administração Pública no próximo ano e quantas é que vão ser substituídas? Qual é o número de funcionários públicos com que vamos iniciar este ano e qual o número de funcionários públicos