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22 DE ABRIL DE 1988 189

da Assunção Esteves procuraram colocá-lo. O que não é possível é deixar de olhar também sob este ângulo problemático que estou a suscitar e que nos leva a observar a proposta de alteração apresentada pelo PSD com cautelas bastantes, embora sem qualquer espécie de vezo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vera Jardim.

O Sr. Vera Jardim (PS): - Sr. Deputado José Manuel Mendes, só tenho uma dúvida em relação à sua intervenção.

De facto, no artigo 1.° da Constituição vem a definição da República Portuguesa como sendo baseada na dignidade da pessoa humana e, salvo lapso meu, o PCP não apresentou qualquer proposta de alteração nessa matéria. Daí que pergunte a V. Exa. se não lhe parece que as suas observações se aplicam também ao artigo 1.°

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Não, Sr. Deputado Vera Jardim, porque, em primeiro lugar, o que está, está, e mudar o que se encontra estatuído é diferente de introduzir alterações; em segundo lugar, o PS também não apresentou alterações, o que justifica que está no bom caminho, ou seja, que entende claramente que o que a Constituição estabelece no artigo 1.° é alguma coisa que, nos termos em que vem formulado, é distinto daquilo que se propõe. Sr. Deputado, o que se está a propor para o artigo 25.° é a queda do "cidadão" com todo o valor semântico e até - diria - historicístico a favor da integração do valor "pessoa", que é altamente relevante e estimável, desde que muralhado e entendido na conceptualização que foi formulada pelo Sr. Deputado Rui Machete e pela Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves, mas que é passível de toda a equivocidade, que, aliás, não deixo de aflorar no debate, sendo certo que se trataria sempre de alterar o que está previsto, uma vez que se entende que o que vigora não está bem ou é possível melhorar.

Salvo melhor opinião, a substituição do termo "cidadãos" por "pessoas" não aclara o texto constitucional nem o enriquece; do meu ponto de vista, torna-o mais polémico e mais permissível a toda uma larga carga semântica - interpretativa, como há pouco dizia o Sr. Deputado Sottomyaor Cárdia -, que, aliás, não é despicienda. É, antes, um apelo à consideração geral do problema no sentido de não se fecharem portas, mesmo por banda do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, desejo colocar uma questão ao Sr. Deputado José Manuel Mendes. E oxalá ele queira cooperar comigo!

O Sr. Presidente: - Não há um dever jurídico de cooperação, Sr. Deputado, pelo menos enquanto não estiver consignado na Constituição. Há, contudo, um dever cívico.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Existe, de facto, uma presunção.

A questão que coloco é a seguinte: o artigo 4.°, relativamente à definição da cidadania, não consigna um entendimento material desse conceito, referindo o preceito, pois, que "são cidadãos portugueses todos aqueles que como tal sejam considerados pela lei ou por convenção internacional". E fá-lo fugindo justamente à dificuldade material do conceito de cidadania. Assim sendo, a dúvida que se me coloca é a seguinte: perante um indivíduo que não tenha adquirido a cidadania portuguesa e esteja eventualmente numa situação até de ausência de cidadania, como é o caso dos apátridas, não admite o Sr. Deputado que é mais ambígua uma interpretação certamente forçada, mas que sempre propicia mais o entendimento de que um apátrida, não estando vinculado a uma cidadania em concreto, estaria, por isso, mais debilitado na protecção à sua integridade moral e física do que se essa protecção fosse dirigida à pessoa qua tale, em vez de ser ao cidadão? Por exemplo, não entende que para os exilados de facto há uma protecção constitucional mais garantida através do conceito de "pessoa" do que do de "cidadão"?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.

A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Sr. Deputado José Manuel Mendes, o facto é que o termo "pessoa" é mais amplo do que o de "cidadão". E aí talvez tenha havido uma desatenção por parte de V. Exa.

Se é oportuno formular uma questão, colocá-la-ia de imediato: esta confusão entre "pessoa" e "cidadão" que eventualmente terá resultado da sua exposição tem alguma coisa a ver com a teoria do homem novo de que fala a última fase do comunismo?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sra. Deputada, isso é uma graça, mas garanto-lhe que não reajo a ela como o Sr. Deputado Mário Maciel o fez em relação à do Sr. Deputado José Magalhães. De facto, o que V. Exa. disse não tem qualquer relevância teórica, pelo que penso não valer a pena fazermos uma discussão em torno dela.

Ora é óbvio que o termo "pessoa" é mais amplo do que "cidadão". Aliás, qualquer menino que ande na 1.ª classe da escola primária sabe isso, pelo que não vamos discutir tal assunto - e creio, aliás, que não é essa a matéria que importa esclarecer.

Já quanto à questão colocada pelo Sr. Deputado Jorge Lacão, devo dizer que, apesar de tudo, ela aponta num outro sentido. Valerá a pena dizer que aquilo que o Sr. Deputado Jorge Lacão quer resolver não é resolvido nem resolúvel a partir da integração do conceito de pessoa onde está o de cidadão no n.° 1 do artigo 25.° De resto, há na Constituição formulações que não estão, elas próprias, esteadas num rigor jurídico-normativo tal que não permitam interpretações de tipo polissemizante, como é o caso daquilo que V. Exa. há pouco aflorou relativamente ao artigo 4.° e de vários outros conceitos.