O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

190 II SÉRIE - NÚMERO 8-RC

O que me parece indiscutível, em primeiro lugar, é que esses conceitos são integrados pela própria história do vocábulo e pela própria história constitucional. Em segundo lugar, desde o princípio que o que tenho colocado em debate e à consideração dos Srs. Deputados não é o problema de saber se cidadão ou pessoa são elementos entre si em conflito e, portanto, antinómicos e se há vantagem ou não em abstracto, fora do quadro da revisão constitucional, em adoptar um modelo ou outro, mas sim a questão de que a Constituição, tal como está, por toda a doutrina e todos os intérpretes tem sido efectivamente lida à luz daquilo que eu e o Sr. Deputado Jorge Lacão dissemos. De facto, o que está em causa é a integridade física e moral de cada pessoa no sentido em que temos estado a falar e não uma outra coisa.

Portanto, será que o que o PSD deseja é apenas uma clarificação e um aperfeiçoamento? Creio que, a ser assim, não fecharemos a porta a isso. Levantamos, porém, a possibilidade de se entender também este outro conjunto de questões...

O Sr. Presidente: - Posso interrompê-lo. Sr. Deputado?

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Faça favor, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o que pretendíamos era apenas evitar a necessidade de uma interpretação extensiva.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Creio que esse é um objectivo em si mesmo positivo.

Penso, contudo, que ele não cobre o risco de interpretações piores do que as que são extensivas ou, pelo menos, tão más como elas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ramos.

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Em primeiro lugar, quero dizer ao Sr. Deputado Sottomayor Cárdia que a técnica constitucional, nomeadamente em termos de normativo constitucional, não é nem deve ser a das definições puras e simples. De facto, o normativo constitucional, a encerrar em si definições, deve fazê-lo para o intérprete constituinte e nunca para a Constituição como tal. Portanto, seria um erro estarmos nesta sede a expressar qualquer conceito de pessoa humana e muito menos a tentar ligá-lo a qualquer definição ela própria já contida noutros âmbitos, nomeadamente no Código Civil, até porque este não define pessoas, mas antes refere quando é que as pessoas adquirem ou não personalidade. Trata-se, pois, de uma questão diferente.

Quanto ao Sr. Deputado Vera Jardim, devo dizer que ele colocou, e bem, o dedo no cerne da questão, ou seja, procedeu à distinção entre cidadão e pessoa. De facto, o artigo 1.° da Constituição consagra um princípio e não uma norma: o da dignidade humana, que vem a ser concatenado nos artigos 24.° e seguintes. Estes preceitos, ao concatenarem e expressarem em diversos "enfoques" o princípio da dignidade humana, fazem-no sempre - note-se - em relação ao universo global contido já no artigo 1.° referente à pessoa humana. Gostaria, aliás, de realçar este ponto. O n.° 1 do artigo 26.° é bem explícito quando refere: "A todos são reconhecidos os direitos [...]", enunciando depois quais são esses direitos. Já o n.° 1 do artigo 27.° estatui que "todos têm direito à liberdade e à segurança", referindo, por sua vez, o n.° 4 que "toda a pessoa privada da liberdade deve ser informada imediatamente das razões da sua prisão ou detenção".

Na verdade, em todos estes artigos, referentes aos direitos, liberdades e garantias pessoais, é sempre feita a concatenação do princípio da dignidade humana, no sentido de que são as garantias das pessoas que são expressas sem qualquer distinção possível entre umas e outras pessoas. Daí que, a meu ver, o artigo 25.°, só fazer esta distinguo entre cidadãos e não cidadãos, seja perigoso e, mais do que isso, contraditório com o princípio constitucional da dignidade humana e também com os outros artigos do normativo constitucional. Aliás, todos eles contêm de algum modo o princípio enunciado no artigo 1.° e prescrevem a pessoa humana sem qualquer distinção entre umas e outras pessoas.

Portanto, a minha opinião é a de que deve ser suprimida a expressão "cidadãos" e substituída pelo termo "pessoas", com todas as virtualidades já atrás enunciadas.

Além disso, também os argumentos de historicidade ou mesmo de qualquer ideologia não são os mais importantes quanto a esta temática, dado que há que preservar e consagrar até às últimas consequências o princípio constitucional que todos, ou quase todos, os constitucionalistas são unânimes em considerar como o de maior importância na Constituição Portuguesa: o princípio da dignidade humana. E ainda bem que a interpretação constitucional não tem sido feita assim, já que este artigo 25.°, ao falar em "cidadãos", poderia, de alguma forma - mas não o fez -, colocá-lo em perigo.

Julgo, pois, que esta correcção deve ser realizada, e rapidamente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, desejo colocar uma questão ao Sr. Deputado que acabou de intervir.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tenho um outro objectivo, que é o de tentarmos passar adiante na discussão dos preceitos constitucionais.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Temos, pelos vistos, objectivos absolutamente opostos, Sr. Presidente. Porém, vamos de seguida passar adiante.

O Sr. Presidente: - Julgo que não, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - A questão que coloco ao Sr. Deputado José Luís Ramos é a seguinte: V. Exa. entende que é hoje possível, tal qual está redigida a Constituição, ler o n.° 1 do artigo 25.° sem o n.° 2, isto é, sem que claramente se interpretem os dois números? Por outras palavras: quando a Constituição refere que "ninguém pode ser submetido a tor-