25 DE MAIO DE 1988 363
Portanto, confere-lhes o direito a dissolverem-na e a isso não pode obstar o Estado. O CDS pretende conferir ao Estado um papel dirimente e determinante. Aqui quer mais Estado, quer um Estado impediente, enfim, para azar dos liberais de gema e infortúnio daqueles que preconizam menos Estado.
Mas o Estado, face à Constituição, que neste caso é desestalista e ferozmente defensora das liberdades pessoais, não pode negar a esses cidadãos o direito a divorciarem-se, devendo, naturalmente, ser em devida forma assegurados os direitos dos filhos.
Portanto, Sr. Presidente, não podemos manifestar a nossa adesão nem às formulações nem menos ainda àquilo que nos parecem ser tanto as concepções aparentes como as concepções reais do CDS quanto a esta matéria.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Vamo-nos pronunciar sobre a proposta que nos é apresentada - apenas sobre essa - e não acerca de intenções que estarão por detrás da proposta que não conhecemos.
A proposta apresentada pelo CDS refere que "a lei regula os requisitos e os efeitos do casamento e da sua dissolução, por morte ou divórcio, independentemente da forma de celebração e tendo em conta, designadamente, os interesses dos filhos menores". O que é que esta proposta nos diz? Diz que a lei que regula o divórcio lerá em conta os interesses dos filhos menores. A proposta em si mesma é óbvia. Creio que qualquer lei reguladora do divórcio deve ter em consideração como um topos, além dos direitos e interesses dos cônjuges, os interesses dos respectivos filhos. E isso já se verifica actualmente.
De resto, não me parece que se possa acompanhar o Sr. Deputado José Magalhães na parte em que interpreta a proposta do CDS como necessária e absolutamente anti-divorcista. Pode perfeitamente entender-se que os interesses de filhos que assistam quotidianamente ao espectáculo degradante de uma relação em ruptura apontam para o divórcio. Toda a compreensão que tenho das realidades vai nesse sentido, ou seja, de que os interesses dos filhos não apontam univocamente num sentido. Qualquer teórico do direito da família dirá que há casos em que seria um processo péssimo de socialização e preparação das crianças o de obrigá-las a conviver com o espectáculo de uma relação familiar deteriorada.
Neste âmbito, e em concreto, não acompanharei o Sr. Deputado José Magalhães na parte em que interpreta a proposta em discussão como sendo de sentido unívoco e em absoluto antidivorcista. Entendo que a proposta do CDS é uma proposta em si mesma correcta, mas que não acrescenta nada. Obviamente que as normas que regulam o divórcio tem de ler em conta, no seu círculo hermenêutico, todos os topoi necessários - e o dos filhos é um deles. Mas penso que, com ou sem isto, a lei não poderá deixar de regular uma matéria tão importante como a do divórcio sem atender também, inter alia e com peso a seu tempo adequado, aos interesses dos filhos.
Não nos oporíamos, pois, à introdução de uma proposta como esta, mas temos a consciência de que não ganharíamos nada com isso, porque já assim acontece nos nossos dias.
O Sr. Presidente: - Presumo que o Sr. Deputado Nogueira de Brito pretenderá dar uma explicação adicional ao que foi referido. Sr. Deputado, se me é permitido
formular um pedido, solicitar-lhe-ia que integrasse na sua explicação o n.° 3 do artigo 36.°, que de algum modo já dá uma achega no sentido da proposta apresentada pelo CDS.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, integraria na minha explicação mais alguns números do artigo 36.° para responder aos fantasmas que o Sr. Deputado José Magalhães veio aqui acenar.
O Sr. Presidente: - Sim, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Evidentemente que temos acerca do carácter institucional do casamento a opinião que apresentámos e devo dizer que não pretendi esconder coisa nenhuma quando apresentei a justificação que apresentei. Além disso, congratulo-me com a adesão ao contudualismo e ao comutativismo que o Sr. Deputado José Magalhães acaba de fazer entusiasticamente.
Mas o que pretendo dizer é o seguinte: com a introdução da alteração que apresentámos, e com a explicação que dei, não estamos de forma nenhuma a atentar contra o reconhecimento, pela lei portuguesa, de formas outras de criação de relações familiares que não o casamento.
Não mexemos, por exemplo, no n.º 6 do artigo 36.° e se, porventura, quiséssemos fazê-lo eliminaríamos o n.° 4. Não lhe parece, Sr. Deputado José Magalhães, que essa seria a forma mais directa de atingir o objectivo de monopolizar o casamento como gerador desse tipo de relações? De facto, elas não são relações de família no sentido institucional que esta encerra, mas sim relações dignas de serem protegidas e respeitadas pela lei portuguesa, e não pomos isso de forma nenhuma em causa.
Agora, o que o Sr. Deputado não se pode esquecer é que aqui se está a tratar da família e do casamento como fonte da relação familiar, ou seja, é do que trata o artigo 36.°, embora depois se verifiquem as incursões do respectivo n.° 4. No entanto, o texto trata, e a epígrafe correspondente é essa, da família, do casamento e da filiação.
Ora, assim sendo, não é descabido que o CDS tenha a preocupação de sublinhar, pela referência que faz no n.° 2, aos interesses dos filhos, o carácter institucional do casamento, porque entende que a redacção actual reduz o casamento a uma pura forma contratual.
Por outro lado, o Sr. Deputado Costa Andrade - e o Sr. Deputado José Magalhães fez aqui vários acenos gestuais de concordância - diz que defende de certo modo a tese de reduzir a Constituição àquilo que ele considera essencialmente útil e necessário. Ele tem uma tese utilitária em relação aos dizeres da Constituição. Já há pouco lhe procurei demonstrar que explicitar o conceito jurídico, por exemplo, da estrutura acusatória do processo penal leria utilidade. Suponho que um juiz veria com mais relutância a possibilidade de acumular as duas funções de juiz de instrução e de juiz da causa se na Constituição estivesse rigorosamente escrita, como consta de uma proposta apresentada, a explicitação do conceito jurídico. Suponho que aí, quando lhe repugna isso, domina o teórico que V. Exa. reconhecidamente é nestas matérias.
Assim, nessa perspectiva, seria útil - e não inútil como o Sr. Deputado pretende fazer crer - que esse interesse dos filhos menores, a ter em conta num dos aspectos do casamento-instituição, que é o da sua dissolução, viesse expresso na Constituição. Não me parece que nessa óptica isso fosse inútil, mas sim útil.
Evidentemente que recolhi já a impressão de que todos os Srs. Deputados concordam em que esse é um aspecto a ter em consideração na regulamentação do divórcio e