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14 DE JUNHO DE 1988 455

O Sr. Presidente: - Em relação aos n.ºs 6 e 7, penso que os deveríamos discutir a propósito dos problemas do ensino e não nesta sede. Concorda com isto, Sr. Deputado Sottomayor Cárdia.

O Sr. Sottomayor Cárdia (PS): - Receio não concordar, Sr. Presidente. Não receio o facto de estar em divergência com V. Exa. Receio o lacto de as razões que assistem à minha proposta terem conexão ou serem relativas à matéria...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esses números tem conexão com essa matéria. Talvez as pudéssemos discutir mais adiante.

O Sr. Sottomayor Cárdia (PS): - Certo, Sr. Presidente.

No entanto, gostaria de explicar a razão de ser da minha proposta.

Temos desde 1940 a Concordata assinada entre o Estado Português e a Santa Sc. Essa Concordata diz no seu artigo 21.º o seguinte:

O ensino ministrado pelo Estado nas escolas públicas será orientado pelos princípios da doutrina e moral cristã tradicionais do País. Consequentemente, ministrar-se-á o ensino da religião e moral católicas nas escolas públicas elementares, complementares e médias aos alunos cujos pais ou quem as suas vezes fizer não tiverem feito pedido de isenção.

Qual e aqui o problema? Penso que há o risco de a Concordata ser declarada inconstitucional.

Vozes.

Com certeza, estou preocupado com a eventualidade de a Concordata ser declarada inconstitucional porque tal pode ter uma consequência danosa para o Estado Português nas suas relações bilaterais com a Santa Sé. E pode mesmo criar no País uma situação confusa.

O Sr. Presidente: - Acompanho-o nessa sua preocupação, Sr. Deputado.

O Sr. Sottomayor Cárdia (PS): - Qual é a oportunidade de evitar que tal lesão do interesse nacional se possa um dia verificar, através de uma interpretação fundamentada da compatibilidade da Concordata e da Constituição? A oportunidade e esta, porque é agora que estamos a rever a Constituição. É agora que podemos tomar as devidas precauções para que os efeitos de uma tal declaração de inconstitucional idade não tenham as consequências negativas que de outro modo teriam.

Por este motivo, dirigi ao Govêrno um requerimento - aliás na sequência de idêntico requerimento formulado em 14 de Janeiro de 1971 pelo deputado Francisco Sá Carneiro -, formulando uma pergunia que é a seguinte: "Estão em curso negociações com a Santa Sé para a revisão da Concordata em vigor? Não estando, tenciona o Govêrno entabelar negociações nesse sentido? Ou aguarda que a Santa Sé o faça?" Tal foi a minha pergunta, exactamente igual à formulada em 1971 pelo deputado Francisco Sá Carneiro. Nos considerandos da pergunta, recordo que estamos em período de revisão constitucional que, ponderadamente, devemos aproveitar para proceder à correcção de, pelo menos, algumas imperfeições da lei fundamental. E evidencio a possibilidade de nexo entre a matéria referida e os trabalhos de revisão constitucional.

Na verdade, é aqui que podemos acolher, na ordem constitucional portuguesa actualizada, o que há de positivo e é substancial no que foi objecto de acordo entre a Santa Sé e a República Portuguesa no ano de 1940. Aliás, esse acordo foi precedido de uma revisão da Constituição de 1933, ocorrida, salvo erro, em 1935, porque, nos precisos termos originários da Constituição de 1933, não teria sido constitucional a Concordata de 1940. Em 1935 a Constituição foi revista, precisamente para que a Concordata pudesse ser feita. A Constituição de 1976 não é mais favorável à Concordata do que o texto originário da Constituição de 1933.

Como resolver o problema? Afigura-se-me que se resolve o problema, por um lado, tomando a República Portuguesa a iniciativa de dialogar com a Santa Se sobre esta matéria. A resposta que recebi do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros ao requerimento é a seguinte: "O Governo, nestas matérias, não antecipa quaisquer intenções." Quer isto dizer que o Govêrno está, portanto, numa atitude de expectativa. Se bem entendo, o Govêrno reconhece que o problema existe -o Govêrno não diz que o problema não existe -, mas não quer tomar a iniciativa de tocar nesta matéria ou, se tem essa intenção e até, porventura, a estará já neste momento concretizando, o que ignoro totalmente, não quer antecipar as intenções. A questão existe. Dificilmente se pode negar.

A minha proposta para o n.° 7 vai no sentido de acolher o essencial do que hoje se contém na Concordata em relação ao ensino da moral e da religião nas escolas públicas. Afigura-se-me, todavia, que esta disponibilidade do legislador constituinte para acolher uma parte do que se encontra na Concordata deve ser completada por um princípio de idêntica natureza, embora um pouco mais frágil, relativamente às confissões religiosas e às associações especialmente interessadas na apreciação do fenómeno religioso ou outra designação que venha a ser adoptada.

Em suma, parece-me que não se pode deixar de colocar a questão da revisão da Concordata, suscitada em 1971 pelo deputado Sá Carneiro, e parece-me que, se resolvermos passar sobre esta matéria sem a considerar, corremos o risco de, daqui a um, dois, cinco, quinze, vinte, trinta anos, ter um problema com a Santa Sé e também com o povo português. Por consequência, é agora o momento de acautelar. É tão-somente esse o alcance do que proponho. Ou seja, proponho que haja um privilégio para a Igreja católica, no contexto de uma visão mais aberta aos valores não religiosos na sociedade portuguesa.

Afigura-se-me, aliás, que o n.º 7 só é justificável se for aprovado o n.º 6. Se fosse questão de aprovar o n.° 7 sem o n.º 6, eu acharia mal: não deve consagrar-se o privilégio, sem ter consagrado a liberdade. Objectar-se-á que, aprovado que fosse o n.º 6, o n.º 7 não seria necessário. Mas cautelarmente o n.° 7 tem o valor que tem.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ramos.

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Sr. Deputado Sottomayor Cárdia, gostava de lhe colocar três questões muito concretas.

A primeira para saber se não acha que o n.° 7 se contém totalmente no n.º 6 e como tal qual a razão de ser do n.° 6.