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464 II SÉRIE - NÚMERO 16-RC

Há, nesse preceituado, uma ideia daquilo a que os alemães chamaram de Streitbahre Democratic, ou seja, a democracia protegida. Por sua vez, também transportámos essa ideia para o artigo 46.º da nossa Constituição por via do mesmo mecanismo psicossociológico que leva a uma rejeição clara das organizações que perfilham a ideologia fascista. E fizemo-lo no sentido de preservar esse bem fundamental que e a ordem constitucional liberal-democrática.

Ora, tendo em conta a dimensão objectiva daquilo que se pretende defender; tendo em conta que a própria noção de "organizações que perfilhem ideologia fascista", tal como afirmou o Sr. Deputado Sottomayor Cárdia, tem contornos de difícil detecção e um alcance mais ou menos indefinido e que a intenção legislativa que deve presidir ao n.9 4 do artigo 46.°, consubstanciada na salvaguarda da defesa da ordem constitucional democrática, vai no sentido da criação de uma espécie de democracia conservada e protegida contra todas as ameaças, seja qual for o teor delas, parece-me que a formulação contida na segunda parte desse número deve ser substituída com algum êxito pela expressão "organizações que atentem contra o regime democrático".

O, Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vera jardim.

O Sr. Vera Jardim (PS): - Srs. Deputada Maria da Assunção Esteves, tenho estado em vários pontos de acordo com V. Exa. - Contudo, neste aspecto estou em posição diametralmente oposta. Direi ale que esta é das formulações mais infelizes do projecto de lei da autoria do CDS.

Ora, pegando precisamente no exemplo que a Sra. Deputada deu da tal "democracia defendida", direi, em primeiro lugar, que a Constituição de Bona tem realmente raízes históricas, que aliás não podemos desconhecer, que não se filiam apenas no facto do regime nazi-fascista que a antecedeu, mas lambem na existência de uma fronteira com outro regime completamente diferente, que é o da República Democrática Alemã. E os resultados do artigo 9.º da Constituição de Bona estão à vista, ou seja, lendo-se no início visionado uma defesa constitucional do regime de Bona contra o nazi-fascismo, ele foi rapidamente enviezado para ir terminar na proibição de profissão consignada na Berufsverbot. Esta lei provocou os protestos dos democratas na Alemanha Ocidental e as movimentações de quase todos os partidos democráticos contra a aplicação abusiva de uma legislação que foi feita com base no referido artigo 9.ç da Constituição de Bona. Não e, portanto, um exemplo muito feliz, quer porque a Constituição de Bona tem, repito, um enquadramento histórico-constitucional completamente diferente, quer ainda porque a prática demonstrou que o uso de conceitos indeterminados desse tipo se volta rapidamente para alvos diferentes daqueles que, no início, foram concebidos. E cesse o grande perigo de formulações tais como a que consta da proposta de substituição do n.º 4 do artigo 46.° da autoria do CDS.

Em segundo lugar, direi que a democracia tem de se defender a si própria com os necessários mecanismos e de revestir essas virtualidades. E não e por estar consignado na Constituição que são proibidas organizações deste ou daquele tipo que ela se defende melhor. Por conseguinte, penso que a sua defesa e, sobretudo, o exemplo da Constituição de Bona vem ajudar-nos a aponuir os perigos deste tipo de formulação na base de conceitos indeterminados.

Quanto às organizações fascistas, devo dizer que a nossa bancada tem sido muito aberta em demonstrar algumas dúvidas que tivemos nessa matéria. É certo que o conceito de fascismo, como disse o Sr. Deputado Sottomayor

Cárdia, não é obviamente unívoco. Em todo o caso, é, apesar de tudo, um conceito com um grau de determinação muito maior do que aqueles que são usados pelo CDS.

Alem disso, poder-se-á defender, como aliás vimos apoiando, que não se deve excluir deste normativo aqueles que perfilhem, com todo o direito legítimo, as ideologias fascistas, mas antes as organizações que sigam tal orientação.

Em terceiro lugar, perguntar-se-á qual o sentido que se vai tirar na interpretação futura do que se passar com as organizações de tipo fascista, se acaso essa formulação se mantiver. Dir-se-á que a Constituição ainda terá daqui a 40 anos, como dizia com alguma razão o Sr. Deputado Sottomayor Cárdia, todo este tipo de formulações antifascistas.

Quero, pois, terminar a minha intervenção com algumas dúvidas. De facto, elas mantem-se desde que o PS discutiu, entre si, o artigo 46.º No entanto, devo dizer que sou manifestamente contra a formulação do CDS, pelo que tenderia a manter, apesar de tudo, o texto inicial do n.º 4 do artigo 46.º, ou seja, não lhe retirando a formulação "organizações que perfilhem a ideologia fascista".

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pais de sousa.

O Sr. Pais de Sousa (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O n.° 4 do artigo 46.°, ora em apreciação, limita o direito de associação. Contudo, é uma norma que aponta para além dcsic direito, pois não pode verdadeiramente considerar-se referente ao exercício dos direitos, liberdades e garantias. Ela visa, de forma directa, a defesa da Constituição e do Estado democrático. Neste ponto, surge inevitavelmente um problema, qual seja o da contradição entre a afirmação inequívoca do pluralismo feita, desde logo, no artigo 2.° da lei fundamental e a estatuição do n.º 4 do artigo 46.9 ora em apreciação.

Poder-se-á obviamente argumentar com a ideia de direito que informa indubitavelmente a Constituição material. Isso é, aliás, irrebatível.

Passando agora à apreciação da proposta de substituição do CDS, teremos de nos questionar acerca de saber o que são organizações que perfilhem a ideologia fascista. Dir-se-á que serão aquelas que pelo seu programa e praxis colocam em causa os princípios e o travejamento jurídico fundamental da Constituição. Devemos então levar em conta que esta problemática motivou, por exemplo, na RFA a ilegalização histórica do Partido Comunista. É este o grande senão da proposta de substituição apresentada pelo CDS, que leva à formulação inevitável desta questão: por aqui balizar-se-ia a ilegalização do PCP? Fica a questão só em tese.

Finalmente, parece-nos que a proposta de alteração, formulada pelo Sr. Deputado Sottomayor Cárdia, e correcta e suficientemente abrangente, levando-se em conta o conceito de Constituição em sentido material.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Pais de Sousa, em relação às suas primeiras considerações sobre esta matéria, verifiquei que V. Exa. - topou um facto que me parece óbvio e foi assinalado por toda a gente. De facto, o n.° 4 do artigo 46.º comporta uma excepção á regra geral de pluralismo, uma vez que este é democrático e, portanto, antifascista. Assim, gostaria de lhe preguntar qual é a conclusão ou o desenvolvimento que faz deste raciocínio.