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506 II SÉRIE - NÚMERO 17-RC

caso dos direitos fundamentais dos trabalhadores. É que justamente aí, e ainda de uma forma mais nítida, acumulam-se os inconvenientes da chamada acção pública na colectivização dos direitos, isto e, quando Vamos garantir certos direitos -como seria o caso relativamente a algumas matérias de direito da família, para citar um caso de direito privado em que o Ministério Público pode intervir -, do mesmo passo sublinha-se a indisponibilidade desses direitos no sentido de que a própria tutela não cabe em exclusivo às pessoas que deles são titulares. Isto tem, naturalmente, as suas vantagens, mas tem lambem grossos inconvenientes, porque um dos princípios básicos e o da autonomia da vontade no sentido de saber se quer ou não tutelar as suas próprias situações e de não permitir interferências alheias.

Ora, compreende-se o propósito generoso que encerra o facto de se pretender utilizar nesta matéria uma acção popular para a defesa dos direitos fundamentais dos trabalhadores, mas, a meu ver, essa é uma medida tecnicamente errada e, por outro lado, ela pode implicar altos inconvenientes. De modo que não se compreende bem qual é a concepção que o PCP tem da acção popular quando a alarga a estes casos.

Além disso, lambem a mim se me afigura que e preferível verificar, nos respectivos sectores, se se justifica ou não aperfeiçoar o normativo constitucional já existente, indicando com precisão a existência de uma acção popular, do que estar a consignar uma norma genérica do tipo desta, que, no fundo, não acrescenta verdadeiramente nada ao n.º 2 do artigo 52.º, a não ser na parte em que se refere aos direitos fundamentais.

Já agora mutatis mutandis, o mesmo que referi em relação aos direitos fundamentais se aplicaria ao conceito de propriedade social. Aliás, não se sabe bem o que é que rigorosamente se pretende dizer com este conceito.

Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, gostaria apenas de lazer duas rápidas observações.

Uma delas é no sentido de corroborar este seu último comentário. De facto, creio que constitui prova de um insufragável conservadorismo constitucional propugnar-se pela manutenção da técnica legislativa da Constituição na fórmula actual, isto é, no sentido de que no artigo 52.º nos limitássemos a consagrar uma norma genérica de reconhecimento de acção popular, e que onde fosse caso disso se colocasse um ênfase específico em alguns casos concretos, norma a norma. Aliás, actualmente já se verifica isso quando se consagra um caso de acção popular na Constituição em sede de direitos, liberdades e garantias económicos, sociais e culturais propriamente ditas.

Esta técnica parece-me vantajosa na medida em que se torna claro que, para haver acção popular, criada pela lei ordinária, não é necessário existir nenhuma norma constitucional habilitadora em concreto. Portanto, todas as enumerações em concreto que se possam fazer na Constituição são enumerações meramente exemplificativas, e nesse sentido não se joga neste debate o futuro de nenhuma acção popular, tanto na vertente positiva como negativa. Assim, reconduzamos desde já esta troca de impressões às suas devidas proporções, tornando deste modo menos decisivo o próprio sentido do posicionamento acerca de cada uma das propostas aqui apresentadas no que respeita a esta matéria.

A segunda observação, igualmente rápida, que gostaria de fazer e para exprimir que o verdadeiro desafio perante o qual estamos aqui colmados e um desafio que se coloca menos em sede de revisão constitucional e mais na ausência de legislação ordinária que consubstancie este princípio da eficácia da acção popular no nosso ordenamento jurídico. Na realidade, hoje em dia o sistema está praticamente reduzido, por força das circunstâncias, aos normativos desactualizados do Código Administrativo e no âmbito da competência dos órgãos da administração local. Todas as questões aqui sublinhadas estão para além deste âmbito, na medida em que o que se trata aqui, para além da figura - já referida pelo Sr. Presidente - bastante inconsequente da representação de interesses difusos através da figura do assistente na acção promovida pelo Ministério Público, a qual se tem mostrado insuficiente e tímida, é de permitir um alargamento da legitimidade processual a esses interesses e grupos, prescindindo da clássica limitação do interesse directo, pessoal e legítimo na promoção, por exemplo, de acções relativas, a decisões ou omissões da Administração.

De facto, reconheço que se trata de uma temática difícil de concretizar na legislação ordinária. Daí que não possamos ignorar as consequências dessas dificuldades quando se trata, em sede de revisão constitucional, da fazer um elenco, ainda que exemplificativo, dos sectores onde o legislador constitucional coloca especial relevo na consagração da acção popular.

Dito isto de outra maneira, para mim o problema em questão está na proposta do PCP quando refere a acção popular para defesa dos direitos fundamentais dos trabalhadores. É aí que me parece que verter na lei ordinária os contornos do que é a legitimidade processual num caso destes, ao admitir-se a acção popular para a defesa dos direitos dos trabalhadores, implica grandes dificuldades. Dificuldades que me levariam a não colocar no mesmo pé de igualdade a defesa dos direitos dos trabalhadores através da acção popular e os demais casos exemplificativos dessa mesma acção popular.

Não se trata de um preconceito ideológico, não e um posicionamento político no sentido de dizer que os direitos dos trabalhadores são menos relevantes do que os direitos dos consumidores ou do que o direito de acção popular para protecção do ambiente. Trata-se de uma questão de natureza técnico-jurídica e da dificuldade de definição da legitimidade processual nestas circunstâncias. O caso da acção popular de dolosa dos direitos dos trabalhadores, por muito imaginativos que sejamos, parece-me levantar mais dificuldades do que os demais casos de acção popular referidos na Constituição, relativamente aos quais parece, apesar de tudo, ser mais fácil chegar à conformação dos contornos de um sistema adequado de legitimidade processual.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, tenho grandes dúvidas acerca desta matéria e inclino-me para a solução que foi agora defendida pela generalidade dos interventores, nomeadamente pelo meu colega António Vitorino. Mas há um problema sistemático de ordem conceituai a considerar e que diz respeito à questão do habeas corpus, que é, digamos, um direito de acção popular concretizado. Claro que ele corresponde a um interesse público mas não difuso e, portanto, alguns dos óbices de natureza técnico-jurídica que foram levantados, relativamente a este caso concreto de acção popular, estão resolvidos à saciedade há muito tempo. Ele consiste num interesse muito específico, e, de facto, existe o mecanismo de acção popular.