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15 DE JUNHO DE 1988 509

dos direitos fundamentais dos trabalhadores justamente em função dos objectivos que estão em causa. E é isso que percebi que V. Exa. quis acentuar. Na verdade, afigura-se-me que é um pouco contraditória com a consagração dos direitos dos trabalhadores como fundamentais essa funcionalização. No entanto, compreendo que noutras perspectivas isso possa ser entendido como muito útil.

Uma outra ideia que me aflorou ao espírito é esta: se os direitos são colectivos, penso que os sujeitos que os podem exercer são todos aqueles que estão abrangidos pelo colectivo, mas para isso não e necessária uma acção popular. Não estamos, de facto, fora dos critérios normais do exercício que os seus titulares fazem da tutela judicial. O direito de acção popular coloca-se rigorosamente quando os normais critérios de legitimidade para a efectivação da tutela por via judicial não chegam, pelo que e necessário, extravasando disso, dar-lhes uma legitimidade própria. Porem, se eles estiverem abrangidos pelo conjunto dos titulares do direito colectivo, esse problema não se coloca, nem há nenhuma especificidade, nem lambem nenhuma acção popular. É, pois, uma dúvida que coloco.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, em relação ao primeiro aspecto que referiu, ou seja, a interpretação funcionalizante...

O Sr. Presidente: - Ou funcionalista, se V. Exa. quiser!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto, a interpretação funcionalística só pode entender-se num certo sentido pejorativo, na medida exacta em que se entende que a funcionalização é uma depreciação, uma perda de conteúdo, uma limitação fone e uma canga susceptível de conduzir ao próprio esvaziamento do direito, à sua negação, ao sacrifício do indivíduo em função de finalidades, inclusivamente de carácter transpessoal ou ideológico-polílico.

O Sr. Presidente: - Isso é um uso extremamente instrumental. Por exemplo, V. Exa. lê essa problemática em qualquer livro que trate de problemas de direitos fundamentais; quer seja do Sr. Dr. Vieira de Andrade ou de outro autor. É, pois, uma instrumentalização do direito fundamental.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sei isso, Sr. Presidente. Aliás, e esse agradável diálogo interposto que estamos, de resto, travando, porque, como e evidente, e a partir de concepções de carácter idealista sobre direitos fundamentais que normalmente esse tipo de posições e aduzido com um receio, por vezes bastante postiço, de que através da preocupação de salvaguarda de determinadas condições, designadamente de carácter económico, social e material, se pretenda lançar sobre os indivíduos uma canga ião enorme que lhes sacrifique e desvitalize os seus próprios direitos: "Serás feliz, quer queiras, quer não!" "Serás feliz cumprindo uma determinada cartilha ou orientação, ainda que isso viole a lua própria consciência e te reduza a coisa nenhuma!" Eis aquilo que se receia!

O Sr. Presidente: - V. Exa. - expressa isso muito bem!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, não posso deixar de exprimir isso nestes exactos termos. Creio, aliás, que esses receios, partindo de certos sítios, são inteiramente postiços, porque vêm precisamente de fontes e de alfobres de carácter ideológico e político, que são eles próprios a maior fonte de sujeição e de milificação do indivíduo.

O Sr. Presidente: - V. Exa. terá razão desde que concordemos sobre a fonte, o que não sei se será o caso.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Encontraremos, com certeza, nesse ponto uma divergência dificilmente suprível.

Em todo o caso, parece-me que, mergulhando nessas raízes ou águas, se deduzirá demais neste caso concreto. E porque? Porque o sistema em que nos estamos a mover é o constitucional e apenas esse. E aí a laxa de "funcionalização" é a que decorre da Constituição, ou seja, o conceito constitucional não se erige, nem se define, em lermos de funcionalização, mas sim de conjugação de elementos, de garantias institucionais (c não apenas institucionais), de efectivação de direitos e de uma preocupação da sua inserção num sistema geral, cujas características não creio que possam ser apodadas de redutoras da pessoa e do trabalhador. Pelo contrário, são fortemente defensoras de um determinado estatuto e de uma certa protecção não apenas sectorial mas de carácter global e envolvente do trabalhador e do seu papel na própria sociedade.

Essa dimensão laboral da Constituição ou de defesa do trabalhador, enquanto revestido desse estatuto (ao lado do trabalhador enquanto cidadão e pessoa), e uma característica básica da lei fundamental neste ponto, que não será, evidentemente, alterada por um qualquer aditamento como o que propomos. Seria antes muito alterado e bastante esvaziado se o conjunto de propostas de alteração da autoria do PSD em matéria de constituição económica fosse avante nos termos em que ele próprio os enuncia. Isso, sim, esvaziaria várias das peças e das parles que na Constituição impedem essa funcionalização perversa, que é deixar o indivíduo submetido à canga da livre actuação dos monopólios.

Insisto: não há nenhuma funcionalização, mas sim um novo meio a utilizar pelos trabalhadores, que poderão sempre deduzir objecção: "Ninguém poderá ser defendido contra a sua vontade" - eis um princípio que se deve dar por adquirido.

O Sr. Presidente: - É importante colocá-lo no vosso texto! No entanto, isso não resulta da pré-compreensão subscrita pelo PCP.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas se a questão e essa, devemos então colocá-la. Não lemos, aliás, a mínima objecção a isso.

Entretanto, temos a questão dos direitos colectivos. Dir-se-á: "Se os direitos dos trabalhadores são de natureza colectiva, então que o colectivo se defenda." E, portanto, o problema suscitado pelo PCP seria um falso problema assente num equívoco. Se isso pudesse ser sustentado, daríamos a mão à palmatória. No entanto, sucede que, em relação a determinados direitos colectivos, pode acontecer que não baste ou que não seja até aconselhável ser o próprio colectivo, enquanto colectivo directamente atingido, a reagir. Por que e que a questão das condições de salubridade da Fábrica de Braço de Praia tem de ser obrigatoriamente um assunto susceptível de originar só acções pelos próprios membros do colectivo atingido? Por que e que as organizações que velam pela defesa dos direitos dos trabalhadores hão-de ser impotentes para intervir nessa esfera e nessa área? Por que e que não há-de haver a possibilidade de gerar outras formas de interesse, de empenhamento social, e até jurídico, de outros cidadãos que não os colectivos directamente atingidos?