O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

3 DE OUTUBRO DE 1988 1255

sivo, mas são, regra geral, circunstâncias anómalas de alguma tensão. Mas nos termos normais, num regime semipresidencial, ou semiparlamentar como o nosso, é à Assembleia da República que cabe o papel de maior relevância. Para isso necessita não só - o que não tem neste momento - de estar dotada dos meios técnicos e de assessoria adequados, mas precisa também de conseguir ter, ou seria desejável que conseguisse ter um elevadíssimo nível no que respeita aos seus deputados, o que, dada a relativa restrição das elites portuguesas, não é uma matéria fácil de concretizar infelizmente. Evidentemente que todos os partidos estão empenhados em que os seus candidatos, e depois deputados, sejam deputados qualificados, mas a realidade obriga a dizer que esses esforços não são sempre inteiramente coroados de êxito.

Por outro lado, relativamente a ratio entre o colégio eleitoral e os representantes - e se cotejarmos com o direito comparado - verificamos que há uma possibilidade de flutuação suficiente que não obriga necessariamente ao número de 250. Também é verdade que não obriga a um número necessariamente inferior, e até poderia permitir ir mais além. Mas é sobretudo a consideração de razões de um eficaz funcionamento da Assembleia da República, da necessidade de acautelar e de aumentar o seu prestígio - o qual está, intimamente relacionado com a eficácia do seu trabalho e com a qualidade dos seus membros -, que levam a pensar que seria útil e prestigiante para a Assembleia da República, ao contrário de uma consideração puramente quantitativa que já temos visto ser explicitada por outras opiniões e sem prejuízo, naturalmente, do respeito pelas mesmas que seria algo, em termos de opinião pública, bem recebido que não prejudicaria o prestígio da Assembleia - pelo contrário, contribuiria para ele -, que permitiria uma maior eficiência dos trabalhos parlamentares; temos de pensar, designadamente, que essa eficiência resultará muito mais da utilização assisada do trabalho em comissões do que da multiplicação de sessões plenárias (embora estas sejam, naturalmente, indispensáveis). É todo um conjunto de razões que nos leva a propor a redução do número de deputados entre 40 a 60, considerando o número mínimo de 240 actualmente previstos.

Esta é uma explicação, portanto, muito sucinta. Naturalmente que, se for caso disso, teremos oportunidade de detalhar em termos de discussão as razões assim sumariamente expendidas.

Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, a exposição de V. Exa. suscita-me três ordens de questões diferentes.

A primeira é a seguinte: V. Exa. explicou esta proposta à luz de critérios de produtivismo parlamentar, de imagem da Assembleia da República, da qualidade do corpo de deputados, da relação numérica entre deputado/intervenção parlamentar, mas amputou desse raciocínio uma outra vertente da vocação da instituição parlamentar que é a da representação da vontade popular e da pluralidade de opiniões com representação parlamentar que deve ser garantida pelo próprio sistema eleitoral consagrado.

Sabemos que os sistemas de representação proporcional consagram círculos eleitorais que oscilam entre um quociente de um deputado por cada 25 000, 27 000, 30 000 ou 32 000 eleitores. E o sistema eleitoral português tem oscilado exactamente nesta ordem de valores: 25 000/27 500 eleitores, que é, salvo erro, o quociente em vigor neste momento em virtude da aplicação do método de Hondt à distribuição dos mandatos em disputa pelos círculos eleitorais. Creio que V. Exa. tem consciência de que ao reduzir o número global de deputados vai alterar este quociente. Portanto, o efeito imediato que dele vai resultar é que vamos passar a ter não um deputado por 27 500 eleitores mas, sim, um deputado por 32 000, ou 35 000 ou 37 000 cidadãos eleitores, o que pode contribuir para afastar os deputados da representação popular, na medida em que aumenta o número de eleitores representados por cada um dos deputados. Além de que tem inevitáveis efeitos amputatórios no pluralismo de opiniões e na representação proporcional. Esta é, pois, a primeira ordem de questões, que não deve ser escamoteada.

A segunda ordem de questões é a que respeita ao exemplo do direito comparado. De facto, ele não colhe. Vejamos alguns exemplos. O caso irlandês, onde um país com cerca de 4 milhões de habitantes tem menor número de deputados que Portugal, mas assim tem 226 nas duas Câmaras. A Suécia, com cerca de 8 milhões de habitantes, tem um Parlamento com 350 deputados. A Grécia, com 10 milhões de habitantes, criou um Parlamento com 300 deputados. A Bélgica e a Holanda, que têm população semelhante à portuguesa, são países onde existem duas Câmaras e que têm um número de deputados ou superior a Portugal (a Bélgica só na Câmara baixa tem 212 e 182 no Senado, a Holanda tem, respectivamente, 150 e 75) ou equivalente.

Portanto, o argumento do desfazamento entre a população e o número de deputados também não releva em termos de direito comparado e não me parece que colha no caso específico português.

O terceiro tipo de questões é respeitante ao facto de o Sr. Presidente ter apresentado esta proposta como de melhoria indirecta da qualidade dos deputados, cujas razões são, segundo penso, insondáveis.

Os deputados dividem-se frequentemente - e digo isto para utilizar uma linguagem meramente operacional e sem desprimor - entre deputados-procuradores e deputados-questores. Pergunto-lhe então se V. Exa. tem a certeza de que uma redução do número de deputados teria como consequência aumentar os primeiros em detrimento dos segundos. Ou não teria exactamente o efeito inverso? É que os partidos recolhem apoio popular graças à acção dos deputados-procuradores, escolhidos segundo critérios de representação local, e pelo facto de gozarem de prestígio nas regiões em que se inserem. Logo, por isso mesmo são importantes para a vida parlamentar, mas, regra geral, têm uma menor participação nos trabalhos da Câmara. No entanto, eles são um factor importante como indutores de votos nas listas partidárias, bem como desempenham um importante papel no Parlamento no sentido de trazerem até ele as realidades locais com que estão em mais directo contacto e onde estão mais perfeitamente enraizados.

Já os deputados-questores são, por contraste e em regra, os mais activos parlamentarmente na vida própria da Câmara e até podem ser mais conhecidos da opinião pública em geral. São, pois, aqueles que conhecem melhor o funcionamento da máquina parlamentar, que é, no fundo, complicada, mas não se revelam, na maioria dos casos, factores indutores de voto popu-