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14 DE OUTUBRO DE 1988 1333

O Sr. José Magalhães (PCP): - E a constituição económica?!

O Sr. António Vitorino (PS): - Já iremos à constituição económica.

Ô que queria dizer ao Sr. Deputado José Magalhães, em resumo, é que esse reenvio, para alívio da Constituição, só teria como consequência a derrogação do limite temporal ao Poder da revisão constitucional. Aí sim, as matérias que transitassem da Constituição para as leis paraconstitucionais estariam, em tudo o mais, protegidas nos mesmos termos em que hoje o estão, menos no tempo. Em vez de só poderem ser alteradas de cinco em cinco anos, por maioria de dois terços, e em qualquer momento por decisão de uma maioria de quatro quintos, passariam a ser alteráveis a todo o momento por maioria de dois terços. Esta é a única alteração significativa que resulta neste domínio da nossa proposta.

Quanto à questão da organização económica, aqui temos, naturalmente, uma divergência substancial. Não vale a pena escondê-la, porque já esteve patente na discussão que tivemos os dois sobre os artigos 80.° e 89.° da Constituição. O PS entende que a democracia portuguesa está suficientemente consolidada do ponto de vista político-institucional para considerar que, no essencial das regras de organização democrática, existem consensos alargados e que a alternância no exercício do Poder, pelo menos a credível, não se traduz em derrogação de regras fundamentais do Estado de direito democrático. Onde identificámos alguns riscos de tentação de. subversão dessas normas fundamentais, incluímo-las nas matérias objecto de leis paraconstitucionais. Refiro-me, naturalmente, à questão da Lei Eleitoral.

Relativamente à questão da constituição económica, entendemos que num moderno Estado de direito democrático a alternância no exercício do Poder exprime-se sobretudo pela existência de diferentes programas económicos e sociais, que fazem o separar de águas entre as forças conservadoras, liberais e neoliberais e as forças de esquerda, progressistas, socialistas e mesmo comunistas. Há aí um separador de águas, e é aí que se afirma a livre alternância democrática e a vontade popular, expressa através do sufrágio popular universal. É por isso que nenhum quadrante ideológico é tutor da constituição económica e que tudo o que nesta dificulte o livre exercício da alternância democrática nos parece reprovável. Já o dissemos em 1982 e reeditámo-lo agora, e naturalmente que matérias como a reforma agrária, o planeamento e as nacionalizações são matérias do livre exercício da alternância democrática e por isso lhes dispensamos o tratamento que consta do nosso projecto. E por isso também alterámos o artigo 290.°, alínea f), da Constituição quanto à apropriação colectiva dos principais meios de produção, à eliminação dos latifúndios e monopólios.

O que está verdadeiramente em causa neste debate é que o Sr. Deputado José Magalhães entende que deverá continuar a haver uma certa tutela institucional da esquerda sobre a constituição económica que fosse limitadora dessa livre alternância, porque a alternância pode ser subvertera dos valores da Constituição. Ora, nós entendemos que a força normativa da Constituição, tal como a mantemos no nosso projecto, é suficiente para garantir a efectivação dos direitos económicos, sociais e culturais e dos direitos, liberdades e garantias que são as verdadeiras conquistas irreversíveis que a Constituição consagra, e não a delimitação de sectores económicos, ou a dimensão da propriedade pública nacionalizada.

E é por isso que me confrange que destacados dirigentes do PCP afirmem publicamente que o PS fez cedências ao PSD na Comissão em matéria de direito à greve. Confrange-me porque é uma mentira, porque é falso, porque é um argumento utilizado para exercer pressão psicológica sobre quem está aqui nesta mesa e, como tal, é tão descarado que é por nós imediatamente relativizado. Sabemos o que defendemos sobre o direito à greve, sabemos como fomos nós que nesta Comissão denunciámos o sentido da alteração proposto pelo PSD e como dissemos clara e inequivocamente que com o nosso acordo não havia nenhuma alteração do direito à greve.

Como também não aceitámos nenhuma concepção redutora dos direitos fundamentais dos trabalhadores, bem como não aceitámos nenhuma alteração do conteúdo fundamental dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.

Portanto, essas acusações são acusações que visam criar um ambiente psicológico, que visam ressuscitar bandeiras de luta e visam animar, manter o moral alto da base social de apoio de quem as profere, que bem precisa nesta fase histórica por que passa, mas que, naturalmente, não são argumentos que nos constranjam, que nos limitem na nossa capacidade de decisão noutras matérias ou, sequer, que nos criem problemas de consciência.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não sei bem a que é que o Sr. Deputado António Vitorino se refere. Em todo o caso, refere-se a algo sem base, na medida exacta em que defendemos aqui nesta Comissão não só o direito à greve, nas condições que resultam das actas, como manifestámos preocupações em relação ao que poderia ser o resultado de uma proposta do PSD que o PS rejeitou liminarmente na sua formulação, tendo em relação à sua versão final dito, sucintamente, aquilo que resumiria assim: "Mostrem-nos a reformulação; consideraremos oportunamente a nossa posição, em função do conteúdo concreto dessa reformulação."

O Sr. António Vitorino (PS): - Só que a reformulação...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Foi isto que o Sr. António Vitorino pessoalmente aqui disse. O que é que isso significa? Não sei, porque não estou dentro dos escaninhos políticos em que V. Exa. se move. Só o Sr. Deputado poderá dizer o que tal significa.

Em todo o caso, é inteiramente legítimo que o PCP exprima preocupação em relação ao futuro não só desse segmento da Constituição como, sobretudo, em relação à possibilidade do seu florescimento e aplicação num contexto de mudança radical do terreno vigente em matéria de organização económica. As duas coisas, Sr. Presidente e Sr. Deputado António Vitorino, não são incindíveis, isto é, não se pode dizer que, alterado o terreno da constituição económica em sentido estrito, se processe da mesma forma o exercício dos direitos colectivos ou individuais dos trabalhadores e que fio-