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1516 II SÉRIE - NÚMERO 48- RC

Quanto ao júri, o nosso direito tem alguma tradição, que vem do tempo da República, com a criação dos tribunais de júris. Houve depois um largo período de interrupção. Ó que é certo é que após a sua recriação em Portugal a figura do júri tem sido um verdadeiro desastre. Quem anda nos tribunais sabe que o júri não tem funcionado, desde logo porque é pouco utilizado, é pouco requerido. Embora decida apenas sobre a matéria de facto, sobre o "culpado" ou "não culpado", o júri não é suficientemente remunerado. A base de recrutamento é, na minha opinião, demasiado ampla. É evidente que o texto constitucional não pode conter disposições sobre essa matéria, que terão de constar da lei ordinária, da própria lei do júri. Mas creio que seria perigoso, neste momento, suprimir por completo a figura do júri. Há, sim, que complementar o texto, dando uma indicação no sentido de uma melhor funcionalidade.

Por outro lado, os juizes sociais também não têm funcionado nem em termos de arrendamento rural nem em termos de tribunal de trabalho. E dou um exemplo real disso mesmo: um cliente meu, que foi nomeado juiz social, apareceu-me no escritório e pediu-me que lhe emprestasse uns códigos porque agora é juiz. Os parceiros da administração da justiça têm esta concepção dos juizes sociais! Parece-me que seria necessário encurtar a sua base de recrutamento e limitá-la, porventura, aos parceiros sociais, sejam eles consumidores, produtores, associações sindicais ou patronais. Penso que seria importante impor uma limitação na base de recrutamento, inclusivamente em nome da credibilidade que esse instituto poderá vir a ter na justiça portuguesa mas que neste momento não tem.

O Sr. Presidente: - Quando discutimos o problema dos juizes sociais dissemos que a nossa posição não era a de sermos contrários, em termos de teoria ou de filosofia geral, à existência de juizes sociais. Só que temos dúvidas que se justifique a sua inclusão, pelo menos em termos da formulação proposta pelo PCP, no sentido de parecer que é obrigatório em todos os tribunais de trabalho a inclusão de juizes sociais. A nossa ideia é, portanto, a seguinte: aceitamos que as experiências relativas aos juizes sociais ainda não estejam integralmente feitas. Portanto, aceitamos que possa haver justificação para se prosseguir até que essa experiência venha a ser positiva ou concludentemente negativa. Neste momento, a nossa perspectiva não é, efectivamente, optimista, mas também é verdade que o condicionalismo em que, por vezes, ela foi realizada não é o melhor. Portanto, não gostaríamos que houvesse algo na Constituição que impedisse a existência de juizes sociais. Por outro lado, também não nos parece curial que a Constituição imponha obrigatoriamente a existência de juizes sociais nos tribunais do trabalho e que, portanto, se entenda que há uma situação de incumprimento das normas constitucionais quando os mesmos não existam. Essa é a nossa ideia em matéria de juizes sociais. Aceitamos que haja uma margem para o legislador ordinário incluir ou não. De resto, as experiências ainda estão em curso. Gostaríamos de as ver reforçadas, desde que elas não fossem - como, por vezes, têm sido- instrumentalizadas ou utilizadas em termos organizatórios deficientes, que levam a que actualmente os resultados não sejam, em termos globais, brilhantes.

Quanto ao problema que foi levantado pelo Sr. Deputado Vera Jardim, a nossa ideia é a de que, efectivamente, pode ser muito útil e muito interessante associar os julgados, as pessoas que, de algum modo, são os destinatários dos actos jurisdicionais a participarem no próprio julgamento das questões que digam respeito à mesma série ou ao mesmo tipo de problemas. O Sr. Deputado Pais de Sousa falou aqui no arrendamento, que é um ponto importante. Poderá haver outros da parte, por exemplo, dos consumidores. Pensamos que é interessante não fechar a porta a esse tipo de experiências, que até agora não têm dado resultados...

O Sr. José Magalhães (PCP): - O PSD tinha na sede própria manifestado certa simpatia por uma norma desse tipo.

Espero que isso não signifique um recuo na valoração da cláusula que no projecto do PS acolhe essas experiências...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, a sua pergunta não tem sentido. Nós corrigiremos a nossa posição em função daquilo que foi explicado pelo Partido Socialista e que nos parece interessante. Não gostaríamos de fechar as porta a isso! Portanto, é efectivamente uma modificação de posição, resultante do debate. Aliás, é para isso que serve a discussão na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional.

Tem a palavra o Sr. Deputado Seiça Neves.

O Sr. Seiça Neves (ID): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Vera Jardim falou há pouco num aspecto que me parece extremamente importante e que é o que diz respeito à criação de tribunais de vizinhos.

O Sr. Presidente: - Tribunais de quê, Sr. Deputado?

O Sr. Seiça Neves (ID): - Tribunais de vizinhos, Sr. Presidente. Isto faz parte de uma estratégia, de um plano de descentralização da justiça, que poderia obviar a dezenas de questões. Quem está nos tribunais sabe-o melhor do que ninguém! As questões relativas a direitos reais, a águas, a ofensas corporais simples, etc.., poderiam ser remetidas para esse tipo de tribunais, que deveriam, efectivamente, ser criados. Só que toda a legislação emitida pelo Governo vai exactamente no sentido oposto. A lei orgânica é uma lei concentracionária, é uma lei que vai destruir as poucas coisas boas que ainda funcionam na justiça portuguesa...

O Sr. Presidente: - Cencentracionária, Sr. Deputado? V. Exa. está a pensar em termos de concentração?

O Sr. Seiça Neves (ID): - É uma questão semântica, Sr. Presidente. De resto, o PSD é perito nisso!...

O Sr. Presidente: - As questões semânticas em política têm grande importância, Sr. Deputado.

O Sr. Seiça Neves (ID): - Refiro, por exemplo, p caso do distrito de Aveiro: todos conhecemos as dificuldades de deslocação das testemunhas, o que constitui um dos grandes problemas com que se deparam os advogados. Com os novos tribunais de grande instância, uma testemunha que tenha de se apresentar num julgamento terá de percorrer, pelo menos, 80 quilómetros entre Anadia e Aveiro, contando com o regresso, o que tornará praticamente impossível que a prova se produza com clareza.