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21 DE OUTUBRO DE 1988 1513

pectiva. Sabe-se que os juizes sociais têm diversas componentes nos tribunais de trabalho e, portanto, não se pode ver esta proposta em termos afunilados, não pode ser encarada como uma sectária perspectivação das funções dos tribunais de trabalho. E uma perspectiva plural a que rege esta proposta, e a sua modéstia, dada a margem remissiva para a lei ordinária, é talvez até excessiva face à gravidade da situação que vivemos, hoje em dia. Apontaria, pois, para uma reformulação, em sede de redacção, como o Sr. Deputado Rui Machete certamente gostará de dizer. "Em sede de redacção", creio que valeria a pena apostar numa reformulação enriquecedora desta proposta que sinaliza uma preocupação funda do PCP neste processo de revisão constitucional.

O Sr. Presidente: - Nós somos muito sensíveis às preocupações profundas do PCP, em sede de revisão constitucional.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Registo, comovido.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pais de Sousa.

O Sr. Pais de Sousa (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD propõe, em sede de artigo 217.°, a alteração do n.° 1 através do aditamento do inciso "com excepção dos de terrorismo" (portanto, com excepção dos crimes graves de terrorismo), e propõe a eliminação do n.° 2.

Quanto ao n.° 1 impõem-se algumas reflexões a respeito do .instituto do júri. É sabida a longa tradição existente, entre nós, desde a Carta Constitucional de 1826 até à entrada em vigor da Constituição de 1933 e, depois, mais tarde, com o Decreto-Lei n.° 605/75, de 3 de Novembro, e com a constitucionalização do instituto que é feita com a entrada em vigor da Constituição de 1976. Por outro lado, é sabido também o alcance limitado do instituto na nossa ordem jurídica: não é obrigatório; funciona numa solução que se poderá dizer mista (de composição) entre juizes e jurados; funciona tão-só em matéria criminal (os chamados crimes graves); intervém no julgamento da matéria de facto, mas já não em sede de elaboração de sentença; finalmente, intervém tão-só a requerimento da acusação e da defesa. Mas há que assinalar também que é a lei que define o âmbito do conceito de crimes graves que consta deste n.° l, nesse sentido abrindo a porta à intervenção do legislador ordinário. Por outro lado, queríamos assinalar ainda que a importância do instituto não tem correspondido, em termos práticos, à sua própria tradição. Estas reflexões parecem-nos pertinentes porque é bem patente um risco de politização que veio, de alguma forma, introduzir-se no funcionamento da justiça; há até o chamado efeito perverso do adiamento das audiências com base na falta dos próprios jurados. Tudo isto deve ser ponderado. Todavia, a proposta de lei n.° 9/V, que acabou por instituir o novo regime jurídico do júri em processo penal, entrando em vigor aquando da entrada do próprio Código de Processo Penal, de alguma forma veio mitigar esses efeitos perversos, e fixou um sistema de sorteio diverso daquele que funcionava até aqui que era, como se sabe, o da escolha dos jurados disponíveis. A importância do diploma é também bem patente no facto de ter fixado o chamado estatuto do jurado, definindo, com algum rigor, o mencionado processo de selecção que aponta para uma maior isenção e imparcialidade que são valores que devem ser, a todo o momento, acautelados. Face a estas reflexões pareceu-nos que, para assegurar uma maior isenção e imparcialidade, para afastar aquele mencionado risco de politização, se impunha, pela sua natureza, que funcionasse como excepção aos crimes graves, portanto os chamados crimes de terrorismo.

Quanto à supressão do n.° 2, há que assinalar também que não era obrigatória já face ao texto constitucional, a criação dos juizes populares. Enfim, prescreve o n.° 2 que "a lei poderá criar juizes populares e estabelecer outras formas de participação popular na administração da justiça". As formas de participação popular na administração da justiça aqui previstas têm a ver com conceitos de juizes não togados, de juizes eleitos, que é uma noção baça, parece ter a ver com os sistemas de justiça popular que nos são, de alguma forma, estranhos. Há até, também, uma certa falta de tradição jurídica; talvez seja até mais claro dizer uma ausência total de tradição jurídica entre nós. E há também o mencionado risco de subjectivismo e de politização que poderia ser introduzido no nosso sistema de justiça. Na prática, sabe-se que este conceito, de alguma forma facultativo, não funcionou entre nós. Finalmente, quereríamos acrescentar a estas reflexões que nos parece que o conceito de juiz popular, as formas adjacentes de participação popular na administração da justiça colidem com o princípio de segurança do direito: o exercício da função jurisdicional deve caber ao Estado. Daí que o PSD proponha a eliminação deste n.° 2.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Tenho de reconhecer que a experiência do júri não foi exaltante. Isso é um dado de experiência e talvez valha a pena, neste momento, nós fazermos uma reflexão sobre se essa experiência deve ser estimulada ou deve ser corrigida, pelo menos nos seus principais defeitos. Nessa medida, nós encararíamos com alguma abertura, embora desejássemos submeter este assunto a uma segunda reflexão, a excepção dos crimes de terrorismo. A experiência também neste domínio, que já tivemos, não foi a melhor e penso que poderá justificar-se esta limitação. Ninguém propõe, aliás, a extinção do júri, o que é sintomático, mas eu diria que a experiência do júri talvez até tivesse justificado que alguém, não necessariamente nós, se tivesse lembrado de encarar o regresso à situação anterior à sua existência.

Também o n.° 2, que refere os juizes populares, é uma disposição que tem data. A existência de juizes populares, sobretudo com esta qualificação, é talvez um dos aspectos da chamada carga ideológica da Constituição que vale a pena rever. Nós não fizemos nenhuma proposta nesse sentido, mas estaríamos dispostos a reflectir sobre isso. Será que no mundo em que nos inserimos, num Estado de direito, uma referência a juizes populares estará de acordo com os valores que estão na base da nossa concepção do direito e da justiça?

Já a ideia de juizes sociais merece a nossa simpatia. Nós entendemos que, ou como previsão vinculativa, ou, no mínimo, como faculdade remetida para a lei, a existência de juizes sociais nos tribunais de trabalho, por exemplo, poderá justificar-se.